sábado, 30 de abril de 2011

O MUNDO ÁRABE EM CRISE

Dera'a - Síria

Agrava-se a situação no mundo árabe. O povo aspira a uma vida melhor e deseja libertar-se dos regimes autoritários. Tem como modelo a Europa Ocidental, a América. Não tenho a certeza de que a América seja uma verdadeira democracia. Tenho aliás as maiores dúvidas. E quanto à Europa Ocidental, estamos conversados. Basta olhar para Portugal. De resto, a União Europeia vai-se desmoronando aos poucos. A França pretende suspender Schengen. A Alemanha recusa imigrantes. Os países nórdicos, ofuscados pelo sol da meia-noite, negam a sua solidariedade. A Grécia e a Irlanda estão a braços com a agiotagem internacional. A Islândia faliu. A Itália hesita em se partir de novo, regressando ao Piemonte e às Duas Sicílias.A Jugoslávia já implodiu. Enfim, não há muitas razões para invejar a Europa.

Mas voltando ao mundo árabe, registamos que a violência na Síria prossegue, atingindo patamares não esperados num país que começava a abrir-se ao mundo. Fala-se de interferências externas, o que é sempre possível. Também Qaddafi, que propõe negociações com a NATO mas afirma que jamais sairá da Líbia, insiste que é a Al-Qaeda que provocou a sublevação nacional. Qaddafi, cujas tropas entraram em território tunisino para perseguir os combatentes anti-regime, acabando por enfrentar as tropas de Tunis. Na própria Tunísia, em Gafsa e Qasserine, 800 detidos lançaram fogo às celas e evadiram-se das prisões.

Em Marrocos, o atentado brutal de Marrakech, no Café Argana, provocou já 15 mortos (entre os quais um português) e 20 feridos, e há grande apreensão no país. No Egipto, a Irmandade Muçulmana declara que disputará metade dos lugares do futuro parlamento com o seu novo partido Liberdade e Justiça.

Irmandade Muçulmana

No Iémen, Ali Saleh recusa assinar o compromisso de saída da presidência, num país onde os tumultos duram há muitas semanas. Um bombista suicida fez-se explodir em Mossul, no Iraque, provocando oito mortos e 19 feridos. Na Argélia as manifestações continuam, embora menos publicitadas. Existe grande intranquilidade na Jordânia e o Líbano aguarda, expectante, a evolução na Síria. Nos países do Golfo há uma acalmia provisória, embora o Bahrein se mantenha agitado.

No meio de todo este cafarnaúm, apenas uma boa notícia: a previsão da reconciliação do Hamas e do Fatah. A ver vamos se a prática confirma as boas intenções.

ERNESTO SÁBATO



Morreu hoje, com 99 anos, o escritor argentino Ernesto Sábato, também doutor em física (trabalhou em Paris no Institut Curie), e grande figura das letras mundiais. Recebeu em 1984 o Prémio Cervantes e em 2007 foi proposto pela Sociedad General de Autores y Editores de España para o prémio Nobel da Literatura.

Entre as suas obras mais importantes contam-se El escritor y sus fantasmas (1963), Apologías y rechazos (1979), El túnel (1948), Sobre héroes y tumbas (1961), e Abbadón el exterminador (1974). A sua última obra publicada foi España en los diarios de mi vejez, em 2004.

Ernesto Sábato completaria 100 anos dentro de poucas semanas.

O CÉU QUE NOS PROTEGE



João Gonçalves, no blogue "Portugal dos Pequeninos" escreve hoje um texto sob o título O CÉU QUE NOS PROTEGE, a propósito das próximas eleições legislativas. De facto, estando a troika a ultimar o "programa de governo" para a próxima legislatura, parece inútil a realização (dispendiosa) de tais eleições, uma vez que será esse o programa a aplicar independentemente dos resultados eleitorais.

A alternativa seria, como vários países sul-americanos já recomendaram a Portugal, e tendo em conta as desastrosas consequências que se verificam na Grécia e na Irlanda, a rejeição de tal "ajuda". Poderia haver assim eleições livres e a adopção de uma política nacional não dependente de empréstimos que mais não servirão do que para pagar os empréstimos anteriores e respectivos juros.

O que o país precisa, dentro das suas fracas possibilidades, é o investimento na agricultura, nas pescas, em alguma indústria, actividades que foram desmanteladas por força da nossa adesão à União Europeia, a favor da França, da Espanha, da Alemanha, etc. Os subsídios que na altura se receberam para a consumação desse crime nacional, de nada serviram a não ser para encher as algibeiras de algumas pessoas cujos nomes possivelmente se ignoram, ou talvez não.

Assim, imposta pelo FMI, BCE e FEEF uma ditadura financeira porventura mais rigorosa, atendendo à diferença de época,  do que a que Salazar introduziu quando chegou ao governo, a pergunta que persiste em todos os espíritos é: para que servem as eleições, qual o significado das actuais democracias representativas?

E também qual a responsabilidade da esmagadora maioria dos portugueses que vai ter de suportar sacrifícios para uma situação para a qual em nada contribuiu?

E não haverá verdadeiros responsáveis, para além do bom povo português?

Porque o título do post é sugestivo, permiti-me reproduzir a imagem do livro de Paul Bowles, The Sheltering Sky, na sua tradução portuguesa. Ao menos o romance decorre no norte de África, uma terra aprazível, mau grado algumas contrariedades sobrevindas nos últimos meses, e cuja origem ainda não é suficientemente clara.

LAGOA HENRIQUES (POEMAS ERÓTICOS II)

 


Publiquei há dias um post com um desenho e dois poemas de Mestre Lagoa Henriques, poemas que Lagoa gostava de dizer repetidas vezes, num registo erótico e satírico conhecido de todos os que com ele privavam.

Para que não fiquem no olvido, recordo agora mais dois poemas.

O primeiro, improvisado quando fazia parte do júri de umas provas de doutoramento e estava aborrecido com a forma como decorria a sessão:



As cadeiras estão sentadas
Nunca estiveram de pé
São infelizes coitadas
São José
... Carpinteiro


O segundo, quando se dirigia de carro com um casal amigo, salvo erro para Castelo de Paiva, e viu na estrada um letreiro que indicava a localidade de Nojões:



Conheça uma rapariga
Que foi casar a Nojões
Coitada, foi infeliz
O noivo tinha caralho
Mas faltavam-lhe os colhões

sexta-feira, 29 de abril de 2011

A GÉNESE DE UM LIVRO



Foi recentemente publicada a tradução portuguesa de Mein Kampf - Histoire d'un livre, de Antoine Vitkine, escritor e jornalista francês que se tem debruçado sobre as teorias da conspiração (Les Nouveaux Imposteurs), ao que parece para denunciá-las, muito embora existam  reservas sobre as verdadeiras intenções do autor.

Escreve Vitkine, e é verdade, que a prática política de Hitler estava já, toda, contida em Mein Kampf: a luta contra o judaísmo internacional, a luta contra o marxismo e a luta pela aquisição de um espaço vital. Ainda que, à época, as ideias do futuro Führer fossem diferentemente interpretadas consoante os leitores, o que então lhe valeu o apoio de um vasto público, de categorias potencialmente antagonistas. De facto, é diferente a leitura de Mein Kampf em 1925 ou depois do colapso da Alemanha, no fim da Segunda Guerra Mundial. Sem esquecer que, devido ao fracasso da República de Weimar, e face a uma dramática situação económica e social, o NSDAP, era um partido nacionalista mas também socialista (embora o socialismo fosse precocemente metido na gaveta), o que potenciava as maiores esperanças a uma classe trabalhadora sem trabalho, num país submetido às exigências financeiras dos Aliados, depois da catástrofe da Grande Guerra.

Refere igualmente o autor que o acolhimento que Mein Kampf recebeu de uma parte da população alemã, nomeadamente no que respeita ao anti-semitismo, se deveu ao facto da animosidade ancestral existente no mundo ocidental contra os judeus, um anti-semitismo clássico, enraizado na Europa, forjado ao longo dos séculos pelo cristianismo e pelos monarcas. Escreve Vitkine: «Mein Kampf n'est donc pas seulement le livre du IIIe Reich: c'est un bréviaire de la haine, issu de la face sombre de l'Occident.».

O autor fornece detalhados elementos quanto à génese de Mein Kampf, à sua recepção na Alemanha, antes, durante e depois de Hitler, à sua difusão na Europa, nos Estados Unidos, e por todo mundo, com especial ênfase no mundo árabe, por razões não difíceis de descortinar.
Salienta Vitkine que Hitler, curiosamente, se opôs à tradução do livro no estrangeiro, especialmente em França, devido às teses que nele sustentava. Enquanto na Alemanha do Führer  Mein Kampf se tonou na "bíblia" do III Reich, no estrangeiro só foram autorizadas traduções especiais, e de acordo com os países que a solicitaram. Contudo, o livro, mais tarde ou mais cedo,  acabou por ser traduzido em todas as línguas europeias, primeiro em edições truncadas e depois em edições integrais. Entretanto foram publicados vários excertos da obra, por vezes com comentários. 

A história das edições de Mein Kampf e dos respectivos direitos de autor é apaixonante mas não cabe nos limites deste post. Refira-se apenas que o actual detentor dos direitos é o ministério das Finanças do Estado da Baviera e que está proibida na Alemanha a venda de qualquer edição posterior a 1945. Aguarda-se a reacção das autoridades germânicas quando, em 2015, segundo a legislação em vigor, o livro cair no domínio público. Também a Baviera, através das embaixadas alemãs, se opõe à venda do livro no estrangeiro (têm sido publicadas milhares de edições desde o fim da Guerra),  mas as suas diligências nem sempre são coroadas de êxito; o livro foi retirado de venda na Rússia (1992), em Portugal (1998), na República Checa (2000), na Polónia (2005). A Suécia recusou-se e na Itália o livro circula livremente. Mesmo nos países que ordenaram a sua retirada ele continua a ser periodicamente editado e vendido. Na Índia, encontra-se por toda a parte, bem como nos Estados Unidos e em Inglaterra. De resto, é possível descarregá-lo na "net" na maior parte dos idiomas ou encomendá-lo via Amazon, onde constitui um dos títulos mais procurados. A sua presença é também bem visível na Ásia, na América Latina e em África.

Porém, é no mundo árabe, e em geral no mundo muçulmano, que Mein Kampf tem tido mais edições. Desde 1930, e por motivos óbvios, já que o nazismo e o nacionalismo árabe tinham inimigos comuns: a Inglaterra, a França, os judeus, a quem os ingleses haviam prometido um lar nacional na Palestina, e mais tarde, por arrastamento, os Estados Unidos da América.  Mesmo hoje, se os Protocolos dos Sábios de Sião são o maior best-seller dos países árabes,  Mein Kampf continua a ter as suas tiragens significativas de Argel ao Cairo, de Tunis a Teerão, de Trípoli a Damasco, de Beirute a Islamabad, de Bagdad a Djacarta.

O seu sucesso foi tão grande na Palestina que na sua edição de 13 de Março de 1939, o Times, de Londres, revelava que os maiores compradores fora da Alemanha eram os árabes vivendo naquele território.

Mas é na Turquia que a bíblia do nazismo, por razões que também se prendem com o nacionalismo turco, atingiu a maior difusão. O livro, Kavgam em turco, está à venda em todas as cidades turcas, das livrarias mais respeitáveis às bancadas de rua. Para lá das razões árabes, o crescente sentimento anti-americano que se vive no país justifica o interesse pela obra. De resto, como escreve o autor, a execração da América foi tão longe que em 2005 muitas lojas de Ankara começaram a afixar nas suas montras "Interdito aos americanos", dísticos que só foram retirados após um protesto formal da embaixada dos Estados Unidos. O que não impediu a imprensa turca de denunciar as origens judaicas do então embaixador americano Eric Edelman.

Adenda: Sem pretender estabelecer paralelismos, o sucesso editorial de Mein Kampf, especialmente a partir de 1930, em plena crise financeira mundial, numa Alemanha sem esperança, com uma inflação galopante e receosa dos bolcheviques, recorda-me o entusiasmo com que foi recebido entre nós, em 1974, o livro Portugal e o Futuro, de António de Spínola, num país a braços com uma interminável guerra colonial, bloqueado internacionalmente e sem perspectivas de futuro. Livros muito diferentes mas surgidos em épocas de grande inquietação. Devemos por isso recordar que os acontecimentos se repetem na História, como escreveu Hegel. Primeiro como tragédia e depois como farsa, como acrescentou Marx. Todavia, em períodos de grande angústia, a exemplo do se vive hoje no mundo, a repetição, ao contrário do pensamento do autor de O Capital, nem sempre é necessariamente uma farsa, às vezes a tragédia repete-se.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

A LAVAGEM AO CÉREBRO


Ao longo dos últimos meses, especialmente das últimas semanas, e mormente dos últimos dias, têm os portugueses sido submetidos a uma impiedosa lavagem ao cérebro por parte da comunicação social.

A evocação diária da crise financeira, a referência sistemática à dívida soberana, a discriminação minuciosa das taxas de juro (sempre mais elevadas) para os empréstimos que fomos obtendo, a alusão à inevitabilidade do recurso à ajuda externa, a notícia da chegada, enfim, do FMI, do BCE e da CE, tudo isto somado, foi preparando os portugueses para a necessidade de pesados sacrifícios. Portugueses que na sua maioria vêm sendo penalizados desde há muito tempo por pecados que não cometeram.

Há nesta história, que periodicamente se repete, algo que está mal contado, e nem a sagacidade dos nossos jornalistas consegue ocultar o que se esconde por detrás.

Se o país se encontrava em razoável estado de saúde há alguns anos e está, agora, à beira da bancarrota, não é apenas devido à crise internacional (crise aliás de contornos mal definidos) mas a outros desmandos cujos responsáveis concretos se ignoram, ou quase.

O que espanta é que não se peçam responsabilidades aos culpados que sejam conhecidos e não se averigúe da responsabilidade de outros, mais ou menos camuflados, quiçá agora a viver em terras estrangeiras.

Aconselharia o bom jornalismo a denunciar quem conduziu o país à situação actual, não se quedando pela intriga político-partidária que nada resolve. Ou será que os jornalistas não sabem, ou não querem, ou não podem?

Uma vez que não existe censura, pelo menos em termos oficiais, ainda que outras existam disfarçadas, a explanação da crise, em termos claros e inequívocos, deveria ser uma indeclinável obrigação moral. Mas parece que não é.

Numa sociedade em que a classe média vem sendo progressivamente destruída (e não me refiro só a Portugal), e em que imprensa, rádio e televisão procuram ganhar, dia após dia, mais cidadãos para a adesão aos programas delineados em conciliábulos aonde nunca estão presentes os verdadeiros interessados nas crises que se promovem, há certamente um plano que importa cumprir.

Consta, e parece que é verdade, que as medidas de austeridade impostas já à Grécia e à Irlanda nada contribuíram para a resolução da situação naqueles países, antes agravaram seriamente o tecido económico e social. O mesmo acontecerá certamente no caso português. E provavelmente nos países que terão de recorrer a estas beneméritas ajudas: Espanha, Bélgica, Itália, porventura a França.

Será que o defeito reside nos povos em questão, ou será antes do sistema que lhes é imposto ?

É que, não sendo os povos responsáveis, e não se podendo também mudar de povos, mais vale que se mude de sistema !

EXPLOSÃO EM MARRAKECH



Uma violenta explosão, hoje, no Café Argana, na praça Djemaa El-Fna, em Marrakech, provocou pelo menos 18 mortos e 20 feridos, entre os quais muitos estrangeiros.

Segundo informações oficiais, a trágica ocorrência ter-se-á devido à acção de um bombista suicida.

O café-restaurante Argana, onde já estive várias vezes, tem um agradável terraço com vista sobre a praça, a mais célebre de Marrakech, e é frequentado não só por numerosos turistas mas igualmente por muitos marroquinos.

A RECONCILIAÇÃO PALESTINIANA


Elementos da organização política Fatah (representada por Azzam Al-Ahmad) e da sua rival Hamas (representada por Mussa Abu Marzuk) chegaram ontem no Cairo a um acordo de reconciliação. Desde 2007, após as eleições legislativas que deram a vitória ao Hamas em 2006, e na sequência de incidentes subsequentes, este movimento assumira o controlo da Faixa de Gaza, separando-se da Autoridade Palestiniana, que ficou a governar apenas a Cisjordânia.

Fontes na capital egípcia anunciaram que o acordo poderá ser formalmente assinado no Cairo dentro de uma semana pelo presidente da Autoridade Palestiniana Mahmud Abbas e pelo líder do Hamas (sediado em Damasco) Khaled Meshaal.

Este acordo, já severamente criticado pelo primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, terá sido facilitado pela resignação do presidente egípcio Hosni Mubarak e pela situação actualmente vivida na Síria, governada por Bashar Al-Assad. Netanyahu declarou que a Autoridade Palestiniana tem de escolher entre Israel e a paz com o Hamas (que não reconhece Israel).

O acordo prevê a constituição de um governo provisório e a realização de eleições presidenciais e legislativas dentro de um ano e ainda a reestruturação da Organização de Libertação da Palestina, a fim de que o Hamas a ela possa aderir.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

SOBRE JORNALISTAS


As revelações feitas à revista Sábado por Almerindo Marques, sobre os jornalistas Mário Crespo e José Rodrigues dos Santos, e mencionadas no blogue "Da Literatura", provocaram-me o espanto, se algo ainda me pode espantar.

Partindo do princípio que as afirmações de Almerindo Marques são verdadeiras - e nada me leva a pensar o contrário - então não é de admirar que o país tenha chegado ao estado em que se encontra.

VITORINO MAGALHÃES GODINHO

 

Morreu ontem, com 92 anos, o historiador Vitorino Magalhães Godinho, que foi ministro da Educação e Cultura, no pós 25 de Abril e também director da Biblioteca Nacional. Doutorado pela Sorbonne e professor jubilado da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, deixa Magalhães Godinho uma vasta obra, nomeadamente quanto ao estudo dos Descobrimentos Portugueses e suas relações económicas, na esteira da escola dos "Annales".

segunda-feira, 25 de abril de 2011

O DISCURSO DOS QUATRO


Hoje de manhã, no Palácio de Belém, o presidente da República, Cavaco Silva, e os past-presidentes Ramalho Eanes, Mário Soares e Jorge Sampaio, discursaram sobre o 25 de Abril, passados que são 37 anos sobre a Revolução dos Cravos.

Nestes quatro discursos, afirmaram-se algumas verdades estimáveis, omitiram-se algumas verdades inconvenientes, disseram-se algumas mentiras piedosas e proferiram-se as banalidades que sempre ornamentam as alocuções em manifestações deste género.

Sampaio e Eanes citaram Fernando Pessoa, em contextos diferentes. Pessoa, porque genial, é utilíssimo, pois serve para justificar uma opinião e, se necessário, a contrária.

No final, e após a imposição de condecorações, parece que foi inaugurada uma exposição no Pátio dos Bichos. Este pátio, cuja designação provém de lá terem estado em tempos, em celas próprias, bichos provenientes de África, que provocavam o encanto dos frequentadores do palácio, foi transformado, com o decorrer dos anos, para permitir que o local fosse frequentado por outros bichos (e bichas) mais consentâneos com a a modernidade.

Como ouvi a transmissão em directo os discursos pela rádio (Antena 1) quero exarar o meu protesto pelos comentários da jornalista de serviço (ignoro quem fosse) que entendeu, no fim de cada discurso, proceder a um resumo do mesmo para quem tinha acabado de ouvir o original, assim impedindo de escutar o princípio do discurso do orador seguinte. É o que se chama um exemplo de mau jornalismo.

ISABEL DA NÓBREGA (II)


Isabel da Nóbrega, escritora, jornalista, mulher de cultura, sobre quem escrevi neste blogue a propósito da reedição do seu livro Os Anjos e os Homens, será agraciada, hoje, 25 de Abril de 2011, pelo presidente da República, no Palácio Nacional de Belém, com o grande-oficialato da Ordem da Liberdade, numa cerimónia em que também receberão veneras Barbosa de Melo, Francisco Pinto Balsemão, Artur Santos Silva, Maria Velho da Costa, Pedro Osório, Luís Filipe Costa e ainda, honorariamente, o Banco Alimentar Contra a Fome.

Sendo amigo de Isabel da Nóbrega há perto de meio século, e fazendo ambos parte de um círculo cultural que, infelizmente, pela sucessiva morte dos seus membros (somos já quase todos muito antigos) se tende a extinguir, foi-me dado observar, ao longo de décadas, as suas qualidades de carácter, de amizade, de solidariedade, para lá, evidentemente, do seu elevadíssimo nível intelectual.

Por isso, aqui expresso a minha congratulação por este acto do Chefe do Estado que, embora vindo tarde, ainda vem a tempo. E felicito igualmente a Isabel que, não necessitando de condecorações para ser quem é, merece este reconhecimento público pelos serviços prestados ao país.

domingo, 24 de abril de 2011

REGIMENTO DE LANCEIROS


Para o João Gonçalves, em alusão ao seu post e como recordação de tempos passados.

O PAPA E EU


Perdoe-se-me a pretensão do título deste post (apenas parafraseio o título de um livro de António Ferro (D'Annunzio e Eu), mas não posso deixar de salientar que na sua mensagem pascal, hoje proferida, o papa Bento XVI, antes da bênção Urbi et Orbi, apelou ao acolhimento na Europa dos refugiados do norte de África como eu já fizera aqui e aqui. Também o Pontífice pediu o fim da guerra na Líbia e a solução do conflito por meios diplomáticos bem como a resolução através do diálogo dos problemas que afectam gravemente o Médio Oriente.

Esta alusão explícita do papa ao problema dos refugiados, que Sarkozy (esse homúnculo que jamais deveria ter entrado no Eliseu e que é a vergonha da França) pretende impedir que entrem em terras gaulesas, em clara violação dos acordos de Schengen, é uma bofetada de luva branca pontifícia na cara do presidente francês.

sábado, 23 de abril de 2011

A SAÍDA DE SALEH



Segundo notícias de hoje, e depois de semanas de protestos e confrontos, o presidente do Iémen, Ali Abdullah Saleh, devido à mediação dos países do Conselho de Cooperação do Golfo, aceitou resignar num prazo de 30 dias. Após a sua saída, realizar-se-ão eleições presidenciais dentro de 60 dias.

Aguardam-se os próximos episódios.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

A SITUAÇÃO NA SÍRIA


Hoje, sexta-feira, dia de oração no mundo muçulmano, e ainda para mais sexta-feira santa para os cristãos, em número significativo no país, voltaram a registar-se grandes manifestações nas principais cidades sírias, incluindo na própria capital, Damasco, até agora mais ou menos tranquila devido à estrita vigilância das forças de segurança. Outras cidades a assinalar: Homs, Hama, Dera'a, Lataqia, Moadamia e Duma e Zamalka, nos subúrbios de Damasco.

Apesar de ter sido levantado o estado de emergência, e porque o número de manifestantes atingiu várias centenas de milhar, a polícia interveio, bem como os shabiha, bandos armados ao serviço do regime. Dos confrontos resultaram perto de 100 mortos, a acrescentar aos cerca de 200 das últimas semanas. Os manifestantes exigem a saída do presidente Bachar Al-Assad, que herdou o poder de seu pai, o estabelecimento de um regime democrático e a realização de eleições livres.

O presidente Assad tem oscilado entre a concessão de algumas liberdades (um pouco tardiamente)  e o estabelecimento de reformas económicas e a repressão vigorosa dos protestos, que atribui à influência de elementos estranhos ao país. Mas esta política não tem conseguido apaziguar os ânimos, quiçá inflamados pelas revoluções tunisina e egípcia, cujo desfecho está ainda longe de ser conhecido, apesar da destituição dos presidentes Ben Ali e Hosni Mubarak.

Não parece que Bachar Al-Assad esteja disposto a demitir-se, a menos que deixe de ter o apoio do exército. O impasse que se verifica na Líbia, a manutenção do presidente Saleh no Iémen e a precária estabilização nos outros países árabes constituem motivos para Assad insistir em permanecer.

Acresce que a implantação de um regime "democrático" na Síria, país de várias etnias e religiões (cerca de 20) contribuiria provavelmente para agravar as tensões já existentes e resultaria na ficção democrática libanesa, em que, constitucionalmente, o presidente da república é sempre um cristão, o presidente do parlamento um muçulmano xiita e o primeiro-ministro um muçulmano sunita. E há dois exércitos, o oficial e o do partido de Deus, o Hizbullah.

As convulsões que se verificam no mundo árabe, com todas as consequências previsíveis e imprevisíveis, deveria preocupar seriamente os dirigentes europeus, senão os mundiais, mas isso não acontece já que os mesmos, entregues a pequenos assuntos de intendência, debruçados quase exclusivamente sobre questões domésticas, descuraram e continuam a descurar a evolução da situação.

Deve registar-se que nos dois países em as revoluções "triunfaram", e que eram os mais procurados pelos turistas em todo o mundo árabe, porque a actividade turística caiu a pique desde o início dos confrontos, a situação económica está a tornar-se desesperada, uma vez que uma parte substancial das populações vivia, directa ou indirectamente, do turismo. Os milhares de imigrantes clandestinos que diariamente chegam à costa italiana constituem a melhor prova. 

Entretanto, o presidente francês Nicolas Sarkozy, que endoideceu, ao mesmo tempo que proclamou a sua intenção de se deslocar a Benghazi, porventura em visita de Estado, está a ponderar a suspensão dos acordos de Schengen para evitar a entrada de tunisinos legais (já que munidos da conveniente documentação fornecida pelo governo italiano) em França.

Continuo a defender a distribuição equitativa dos imigrantes árabes por todos os 27 países da União, ou pelo menos pelos 22 que assinaram os acordos de Schegen. Com condições, certamente, mas sem exclusões. Foi com a contribuição de árabes e turcos que a Europa refez as suas economias devastadas pela Segunda Guerra Mundial. Numa Europa novamente em crise, agora por razões muito diversas, e apesar da onda de xenofobia ignorante que atravessa vários países europeus, especialmente os nórdicos, importa criar as condições de uma integração decente, já que o multiculturalismo se tem revelado incapaz de corresponder às exigências das nações de acolhimento.

Para finalizar, direi que receio sinceramente que os actuais contestatários dos regimes árabes vigentes (cujas razões são evidentemente justas) se venham a arrepender de todo este reboliço, na medida em que as suas condições de vida (muitos no limiar da pobreza, outros porque aspiram a um standard de vida europeu, que em breve desaparecerá) se poderão ainda agravar.

WILD SIDE


Por inspiração do blogue Fado Alexandrino.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

A FILHA DO REGIMENTO



Juan Diego Flórez em La Fille du régiment, de Donizetti (Wiener Staatsoper - 2007)


Acabei de ler Hotel de Dream (2007), de Edmund White, na tradução francesa. White, um dos mais francófilos escritores norte-americanos, pode ler-se perfeitamente em francês. Aliás, devem-se-lhe notáveis biografias de autores franceses: de Jean Genet (ainda hoje a biografia de referência), de Marcel Proust, de Rimbaud. 

Este livro de White, sobre o romancista, poeta e jornalista americano Stephen Crane, que morreu tuberculoso aos 28 anos em 1900, que foi amigo de Henry James e de Joseph Conrad e que é hoje praticamente ignorado, pelo menos na Europa, contém uma história, supostamente escrita por Crane (quiçá realmente) e que é, afinal, o objecto do livro..



Essa história, que anda à volta de um jovem prostituto nova-iorquino por cuja vida Crane se interessou, regista aspectos verdadeiramente curiosos em torno do círculo frequentado pelo rapaz, Elliot, permitindo a White deter-se em excitantes pormenores tão do seu agrado.

Não resisto à tentação de transcrever algumas linhas da fala de uma das personagens masculinas, que me proporcionou a oportunidade de apresentar no início deste post a célebre ária de Donizetti:


«Comme j'aime les soldats! J'en ai rencontré un à l'entrée du camp et je lui ai déclaré que j'admirais ses muscles, son cou hâlé, sa large poitrine et sa voix profonde. J'ai ajouté que j'étais prête à défaillir - de fait j'avais trébuché - en présence d'une virilité au caractère si affirmé. Il rougi comme un gosse et d'une voix étranglée m'a demandé mon nom. "Jennie June", ai-je répondu jovialement. Il m'a demandé alors avec un début de sourire si j'étais un garçon dans des vêtements de fille. Je me suis bouché les oreilles et j'ai agité furieusement la tête de droite à gauche: "Pas tant de ces horribles questions!" Puis j'ai ajouté en gazouillant en langage enfantin: "Je ne suis ni chair ni poisson. Suis un p'tit bébé bavoteux, un tout p'tit bébé geignard". Il a ri gaiement et a dit: "Peut-être que le bébé aimerait un biberon. Quelque chose à sucer? Il a si faim, le bébé." J'ai été enchanté de voir comme il perdait peu de temps - car j'ai toujours soutenu que l'intelligence consiste à remettre très vite sa montre à l'heure, et qui pouvait battre de vitesse le caporal Courtney?»
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«Je suis vite devenue la fille du régiment (...), je n'avais qu'à me pointer à l'entrée des casernes, les yeux fardés, dans mon chemisier quasi transparent et mes pantalons bouffants qui révélaient l'ampleur de mes hanches.»

Acrescentarei que a citação acima não passa de uma mera curiosidade, e que este livro de White, aliás como toda a sua obra, é uma profunda reflexão sobre os sentimentos (e os pressentimentos) do homem, sobre as inquietações do espírito, sobre o significado da vida. O livro, não sendo uma biografia de Crane, toma como pretexto os últimos tempos da vida do escritor, já muito doente, para o pôr a ditar à mulher a história de Elliot, o romance que afinal gostaria de ter escrito mas que a morte o impedirá de concluir. Porém, nem tudo é criação literária neste texto de White, já que Crane, segundo testemunhos da época, conheceu realmente o rapaz Elliot. O resto é efabulação, ou talvez não.

terça-feira, 19 de abril de 2011

A EUROPA E A DEMOCRACIA


As autoridades francesas impediram ontem a entrada em França de comboios vindos de Itália (Ventimiglia) que transportavam imigrantes tunisinos que entraram clandestinamente em Itália e aos quais o governo de Berlusconi concedeu autorização de residência temporária, o que lhes permite viajar pelo espaço Schengen.

A Itália atribuiu essas autorizações de residência a cerca de 20.000 tunisinos que alcançaram as costas daquele país após a revolução que depôs o presidente Ben Ali. Têm chegado igualmente a Itália outros clandestinos vindos da Líbia e do Egipto, devido às alterações políticas verificadas naqueles países.

Entretanto, a comissária europeia para os Assuntos Internos, a sueca Cecilia Malmström, afirmou hoje que compreendia a decisão das autoridades de Paris de suspender a livre circulação de pessoas "por razões de ordem pública" e que o tráfego seria reposto normalmente, segundo informação do idiota do ministro francês do Interior, Claude Guéant.

Desde Janeiro, chegaram a Itália mais de 200.000 clandestinos, número que poderá atingir nos próximos meses, segundo António Guterres, Alto-Comissário para os Refugiados, os dois milhões. É também sabido que Nicolas Sarkozy e Angela Merkel, duas figuras de duvidosa moral pública, já declararam que se opõem à entrada de refugiados árabes nos seus países (nomeadamente por razões eleitorais), demonstrando assim o seu conceito de apego à Democracia. Aplaudem-se as revoluções "democráticas" no  mundo árabe mas depois fecham-se as portas aos que carecem em absoluto de entrar no Velho Continente.

O ministro dos Negócios Estrangeiros italiano, Franco Frattini acusou a França de falta de solidariedade, e o embaixador italiano em Paris apresentou um "veemente protesto". Neste ponto, Frattini coincide com o seu compatriota, o professor e romancista Umberto Eco, várias vezes citado neste blogue, que afirmou em tempos que os norte-africanos acabarão por entrar na Europa, a bem ou a mal.

Também, a Bélgica passou a controlar, sem aviso prévio, os passageiros que chegam ao seu território, por via aérea,  provenientes de Itália.

A comissária Malmström, ao manifestar o seu apoio a Paris, pôs em causa a sua própria reputação, pois a livre circulação de pessoas, para mais devidamente documentadas, constitui um dos pilares da União Europeia. É claro que sabemos todos que a União Europeia é uma farsa, que a sua desagregação já começou, e que ficará a breve trecho desintegrada. Mas, enquanto lá não chegamos, haveria que manter as aparências, o que estes energúmenos nem sequer conseguem.

A solução para a avalanche súbita de norte-africanos era a sua distribuição equitativa por todos os países da União, ou, em alternativa, ter a União impedido pela força a revolta dos países árabes e ter continuado a apoiar, como sempre o fez no passado, os regimes autocráticos e ditatoriais que governaram, e ainda governam, esses países.

Curiosamente não se ouviu a voz de Durão Barroso, presidente da Comissão, nem do senhor Van Rumpoy, presidente da União, pessoas cuja idoneidade deixa muito a desejar.

Estou mais do que nunca convencido que seria importante para os europeus que esta União se dissolvesse, enquanto ainda é possível fazê-lo, num clima de razoável concórdia, e que não se esperasse por uma confrontação de consequências imprevisíveis.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

ESTÃO OS ECONOMISTAS ATERRADOS?




«Les décideurs européens ont-ils appris quelque chose de la crise provoquée par les dérives de l'industrie financière ? On peut en douter. Pour résorber les déficits provoqués par le sauvetage des banques et la récession, la Commission européenne et les gouvernements appliquent avec une vigueur renouvelée des programmes d'ajustement qui ont dans le passé démontré leur capacité à accroître l'instabilité économique et les inégalités sociales. Ces politiques de soumission au pouvoir de la finance mettent en danger l'avenir du projet européen. Atterrés par ce constat, nous avons pris l'initiative d'écrire ce manifeste. Il dénonce dix fausses évidences, mal fondées scientifiquement, qui servent à justifier les politiques actuellement menées en Europe. Il soumet au débat vingt-deux propositions pour une autre stratégie. Initialement adressé à la communauté des économistes, et plus de sept cents d'entre eux, issus comme nous d'horizons théoriques très divers, l'ont signé, ce manifeste est surtout destiné à nos concitoyens. Le décalage est aujourd'hui patent entre les affirmations péremptoires des " experts " et la fragilité de leurs diagnostics. Nous souhaitons aider les citoyens à mettre des mots et des concepts sur leurs doutes, et les conforter dans l'idée que d'autres choix peuvent être mis en débat.»

(Apresentação do editor)

domingo, 17 de abril de 2011

ASSAD LEVANTA O ESTADO DE EMERGÊNCIA



O presidente sírio Bachar Al-Assad, numa declaração ao país, ladeado pelos membros do seu novo governo, anunciou ontem o levantamento na próxima semana do estado de emergência (que vigora há 48 anos), bem como a introdução de profundas reformas que permitam um desenvolvimento de acordo com as rápidas mudanças que se verificam em todo o mundo.

Assad defendeu um diálogo com as forças sociais e salientou que as reformas só poderão realizar-se em clima de estabilidade. Salientou que o maior problema da Síria é o desemprego e que é necessário reduzir o fosso existente entre os cidadãos e as entidades oficiais.

Considerou igualmente que o governo do novo primeiro-ministro Adel Safar procurará corresponder aos anseios manifestados pela população durante as manifestações das últimas semanas que, segundo o presidente, terão sido influenciadas por forças estrangeiras.

Aguardam-se os próximos dias para verificar se o discurso de Assad acalmará os protestos, duramente reprimidos pela "Mukhabarat" (polícia secreta) e que, segundo dados das organizações de direitos humanos, terão provocado mais de 200 mortos. O presidente lamentou os mortos, quer dos manifestantes, quer das forças de segurança.

A Síria é um país altamente civilizado, como referiu também Assad e é verdade. Realmente, o território hoje correspondente à Síria foi palco, durante séculos,  das mais brilhantes civilizações, tendo o próprio alfabeto sido inventado pelos antepassados dos sírios, em Ugarit (Ras Shamra, em árabe), no norte do país, um sítio onde hoje prosseguem escavações que segundo o professor Yves Calvet, que as dirige e com quem tive a honra de falar no local há alguns anos, deverão durar ainda várias décadas até pôr a descoberto uma cidade que foi sede (1.500 A.C.) de uma civilização brilhante.

GRANDE MANIFESTAÇÃO EM BELGRADO



Mais de 50.000 pessoas manifestaram-se ontem em Belgrado, frente ao Parlamento, pedindo ao presidente Boris Tadic a realização de eleições legislativas antecipadas, face à situação em que se encontra o país. O líder da oposição conservadora, Tomislav Nikolic, anunciou que ia entrar em greve da fome, pedindo a todos os seus apoiantes que se solidarizassem coma sua iniciativa, ao que muitos responderam afirmativamente.

A Sérvia, apesar de alguns progressos verificados nos últimos anos, ainda não recuperou do ataque que lhe foi movido pelas forças da NATO, e cuja principal instigadora foi a então secretária de Estado norte-americana Madeleine Albright, a "grande prostituta" de que fale o Apocalipse de São João.

O BASTONÁRIO E AS ELEIÇÕES



António Marinho e Pinto, bastonário da Ordem dos Advogados, propõe que os portugueses façam aquilo que ele chama de "greve à democracia", isto é, que não votem no próximo acto eleitoral. Segundo o bastonário, o futuro do país será decidido pelo FMI e afins, pelo que nada interessa o resultado das eleições do próximo dia 5 de Junho.

Marinho e Pinto salienta a mediocridade, oportunismo e incompetência de todos os políticos portugueses, que considera responsáveis pela situação a que o país chegou. Em sua opinião, uma abstenção generalizada às eleições permitiria a refundação da República.

Evoca ainda declarações de Manuela Ferreira Leite, que aquando das legislativas de 2009, sugerira "a suspensão da democracia por seis meses". Já José Saramago, no seu livro Ensaio sobre a Lucidez (2004), discorrera também sobre umas eleições em que os votos brancos constituíam 70% do total dos votantes.

Não sei se a proposta de Marinho e Pinto é a solução para uma reforma do sistema político, mas não tenho dúvidas que a situação actual, a eternizar-se, levará o país não só à falência económica e financeira mas à falência tout court.

sábado, 16 de abril de 2011

PORQUE NÃO TE CALAS?


O vice-governador do Banco Central Europeu (BCE), o português Vítor Constâncio, afirmou que “é muito provável” que Portugal seja o último país a beneficiar da ajuda financeira das autoridades europeias e do FMI.

 Segunda noticia do PÚBLICO:

A informação é avançada pela agência financeira Bloomberg, que indica que Constâncio falava durante uma entrevista concedida em Nova Iorque, tendo referido que “espera” que os mercados apreciem os esforços europeus para apoiar os países em dificuldades.

“Penso realmente que é muito provável [que Portugal seja o último país da zona euro a recorrer ao apoio internacional] e é isso que esperamos que os mercados apreciem, já que a Europa criou mecanismos para lidar com o problema [da dívida] e algumas situações mais vulneráveis estão a ser resolvidas”, afirmou o antigo governador do Banco de Portugal.

Constâncio afirmou que “tem grande esperança” que a situação do mercado estabilize, recusando-se a comentar as matérias relacionadas com um eventual apoio ao sector bancário.

O financiamento de vários bancos da zona euro, entre os quais as principais instituições financeiras portuguesas, tem estado dependente do BCE, mas, sobre o tema, o responsável afirmou apenas que, quando o BCE tiver alguma coisa a dizer, dirá e não antes.

O vice-governador do BCE disse também que as medidas extraordinárias que estão a ser tomadas para travar a crise da dívida europeia são “temporárias”.

Segundo Constâncio, ainda é cedo para dizer quando é que o BCE, com sede em Frankfurt, vai retirar as medidas extraordinárias que estão em curso, uma vez que esta decisão “depende da evolução da situação e das avaliações” que serão feitas.

Não há ninguém que dê um euro a este tipo para ele se calar?

sexta-feira, 15 de abril de 2011

NO MUNDO ÁRABE A CONFUSÃO CONTINUA


A situação no mundo árabe agrava-se progressivamente, com consequências imprevisíveis, não só para os próprios países onde a agitação prossegue como para a Europa e mesmo para os outros continentes.

Na Síria, onde grandes manifestações têm sido reprimidas, a multidão em protesto está agora a marchar sobre o centro de Damasco. registando-se incidentes por todo o país.

No Egipto, o julgamento de Mubarak e de seus filhos ameaça o desencadear de novas manifestações e contra-manifestações que conduzirão ou a uma violenta repressão ou à guerra civil.

Na Jordânia verificaram-se graves confrontos entre grupos salafistas e apoiantes do rei Abdullah II.

Na Argélia, que tem sido palco de sucessivos incidentes, o presidente Bouteflika prometeu alterar a Constituição, o que não terá qualquer significado.

No Iémen, centenas de milhares de pessoas exigem a renúncia imediata do presidente Ali Abdullah Saleh.

Na Líbia, prossegue uma guerra inconsequente entre as tropas ainda leais ao coronel Qaddafi e a população revoltada, que embora apoiada pela aviação da NATO (que não consegue evitar os danos colaterais) foi até agora incapaz de derrubar o regime, sem que se vejam igualmente resultados da mediação internacional.

No Bahrain, apesar do apoio saudita e da "protecção" norte americana, a maioria xiita continua a manifestar-se.

Em Marrocos, o rei Mohammed VI foi constrangido a libertar 92 presos políticos para tentar acalmar uma população cada vez em maior efervescência.

Na Tunísia, aparentemente mais calma, mas com o nível de vida a descer incessantemente e a população jovem a embarcar clandestinamente para Itália, surgem os saudosos de Ben Ali, que irão certamente provocar distúrbios, agora que o governo decidiu julgar o ex-presidente por homicídio e corrupção.

Na Arábia Saudita, a situação continua instável, com as tropas fiéis à monarquia em vigilância permanente.

O Iraque não merece comentários pois o clima é de guerra permanente desde a invasão anglo-americana e afins.

Na Palestina, o Hamas é desafiado pelos salafistas, um grupo religioso extremista responsável pela recente morte de um pacifista italiano, ao mesmo tempo que é acusado pela Autoridade Palestiniana de impedir a reconciliação  dos palestinianos.

Tanta confusão não é nem natural, nem espontânea. Forças ocultas, que ainda desconhecemos, estão a provocar, com o pretexto da democracia, o desmoronamento do mundo árabe. Forças que aliás se estendem à África sub-sahariana, e de que o problema da Costa do Marfim é o exemplo mais dramático e mais recente. A própria Europa, o Velho Continente, entregue a políticos medíocres e sem escrúpulos, ameaça ruir mais depressa do que o que muitos pensam.

Parece que há quem esteja interessado no desencadear da Terceira Guerra Mundial. Será verdade?

quinta-feira, 14 de abril de 2011

A VIDA PRIVADA EM PERIGO



 
 O QUE NOS ESPERA É MUITO PIOR DO QUE O BIG BROTHER


L'explosion des technologies numériques met "la vie privée en péril", s'alarme dans un livre publié jeudi 7 avril Alex Türk, président depuis sept ans de la Commission nationale de l'informatique et des libertés (Cnil), en proposant des mesures d'urgence.

"Si on n'y prend pas garde, d'ici 2020, ce sera irréversible, nous aurons perdu une part de nos libertés au profit des technologies et ça, je refuse, c'est inacceptable", a-t-il déclaré à l'AFP.

L'ouvrage dresse un catalogue des innovations technologiques, vidéosurveillance, biométrie, géolocalisation, réseaux sociaux sur internet. Il évoque "l'invasion des puces", comme autant de dangers potentiels pour les libertés et l'intimité.

Parce qu'il n'est pas question de mettre un coup d'arrêt à ce développement, il appelle chacun à "prendre ses responsabilités" et fait trois grandes propositions.

La première, explique-t-il à l'AFP, "est pédagogique: il faut expliquer, aux jeunes en particulier".

La deuxième, c'est "que la technologie peut résoudre les problèmes de la technologie: mais le problème, c'est qu'il faut financer les études qui permettraient de mettre en place des mécanismes garantissant la protection des données". "Là, ça n'avance pas".

La troisième, c'est "qu'on ne peut pas continuer comme ça, avec un système dans lequel les Européens en Europe n'ont pas le droit à la protection du droit européen". Aujourd'hui, constate Alex Türk, "le développement de Facebook et de Google se fait dans le cadre du droit américain et ce, en Europe".

"Il faut que les gouvernements se concertent, pour aboutir à une position très forte de l'Union européenne (...) et qu'ensuite on se tourne vers les Américains, les Asiatiques, pour mettre en place un mécanisme juridique protecteur des droits des citoyens sur le plan international", résume-t-il.

Selon lui, deux occasions se présentent: "les travaux qui démarrent sur la révision de la directive de 1995", jusqu'à présent référence européenne en la matière, et le "G8 du web" qui doit précéder le sommet du G8 prévu fin mai en France.

"Je sais bien que ça va être très long, mais en tant que président de la Cnil, je dois dire que d'après ce que je constate, l'exercice de nos libertés individuelles, la protection de notre intimité, de notre identité, sont réellement en danger".

AS AGÊNCIAS DE RATING (II)



Que o país se debate com uma grave crise financeira, é inquestionável; que os meios de comunicação social, desde há semanas, não falem doutra coisa, numa persistente e sistemática lavagem ao cérebro dos portugueses, a comando sabe-se lá de quem, também é indubitável.

A incúria (para não dizer outra coisa) dos últimos governos, especialmente do último, conduziu-nos a uma situação crítica, que não só nos preocupa como nos envergonha. Nunca o esbanjamento dos dinheiros públicos fora tão longe, e nem mesmo a chamada crise internacional pode constituir pretexto para o alijar de culpas.

Já a I República terminara na falência do Estado e foi exactamente por causa disso que os governantes pós-28 de Maio foram buscar a Coimbra o Doutor Salazar. Precisamente para pôr ordem na casa. E pôs, só que ficou sentado na cadeira do poder, até que ela (segundo dizem) se partiu.

Contudo, o momento actual reveste-se de características diversas da situação ocorrida no final dos anos vinte do século passado. As circunstâncias, cada vez mais difíceis,  em que  Estado português é obrigado a recorrer aos empréstimos internacionais, vieram provar que nos encontramos num jogo cujas regras estão viciadas. E é essa a magna questão.

Daniel Oliveira, no blogue "Arrastão" faz-se eco desse ardil e porque refiro aqui o link, dispenso-me de explicar os pormenores do "negócio". Acrescentarei apenas que o próprio (e insuspeito na matéria) Marcelo Rebelo de Sousa, no seu comentário televisivo do passado domingo, disse. preto no branco, que as agências de rating desciam Portugal nos seus níveis de classificação porque, sendo propriedade dos organismos que emprestam dinheiro ao nosso país, estes obtinham assim juros mais elevados. Não se pode ser mais explícito.

Quanto à petição, apresentada por um grupo de economistas e subscrita já por elevado número de cidadãos, dirigida ao procurador-geral da República, para que averigúe da existência de práticas fraudulentas em todo este imbróglio, duvido que se obtenham resultados concretos, mas não deixa por isso a mesma de constituir uma manifestação da indignação dos portugueses, que são quem, no final, sofre as consequências de tão ignóbil processo.

LAGOA HENRIQUES (POEMAS ERÓTICOS)



Ao longo de anos, Lagoa Henriques, professor da Faculdade de Belas Artes de Lisboa, escultor de vasta obra e um dos grandes mestres do desenho em Portugal, consignou, em cadernos tipo rol de merceeiro, algumas centenas de poemas, de qualidade irregular, que, por falta de editor, não chegou a publicar. Ignoro o destino que tiveram tais cadernos após a sua morte, mas apraz-me registar dois poemas (num registo mais picaresco, quase erótico), que o mestre gostava de dizer aos amigos mais próximos, com aquela sua característica tão peculiar de repetir as coisas até à exaustão. De tantas vezes os ouvir, acabei por decorá-los, e como presumo que não constem dos citados cadernos, decidi reproduzi-los aqui, antes que a memória me faleça.



Uma senhora casada
Que por vergonha não fode
À noite foi encontrada
Escondida (1) num vão de escada
A fazer um grande broche
A um matulão de bigode

Diz-se que é uma senhora abastada
Com propriedades, com eidos (2)
Mas coitada, não se sustem
Está constantemente aos peidos

Inda a semana passada
De saia curta e pantufas
Entrou na estação do metro
E largou logo duas bufas

Mas é uma senhora casada
(Continua como refrão)

(1) - Oculta (uma variante que o mestre gostava de utilizar em simultâneo)
(2) - Eidos: pequenas porções de terreno junto a uma casa

.......................................................................


Dona Perpétua Gonçalves
Qu'inda é prima do Lacerda
Indispôs-se com o criado
E mandou-o logo...à praça
Comprar sete (3) limões
Mas coitado, não tinha troco
E apalparam-lhe os colhões

(3) Podiam ser seis ou oito limões, mas não, eram sete, segundo uma precisão que o mestre sempre fazia

quarta-feira, 13 de abril de 2011

VAI CONTINUAR A INSTABILIDADE NO EGIPTO

Hosni Mubarak

O procurador-geral do Egipto ordenou a detenção, por 15 dias do ex-presidente Hosni Mubarak, enquanto se procede a averiguações relativamente a acusações sobre corrupção e abuso do poder. O antigo raïs, que sofreu entretanto um ataque cardíaco, encontra-se hospitalizado num hospital de Sharm Es-Sheikh.

Os seus dois filhos, Alaa e Gamal, foram também presos, devendo comparecer perante um tribunal do Cairo a 19 deste mês.

Alaa e Gamal Mubarak

As autoridades egípcias esperam assim apaziguar os ânimos dos egípcios, novamente exaltados. Milhares de cairotas voltaram a reunir-se nos últimos dias na praça At-Tahrir, exigindo o julgamento do antigo presidente e seus familiares, e mesmo a renúncia do presidente da Junta Militar, o marechal Mohamed Hussein Tantawi, a quem acusam de complacência relativamente ao antigo regime.

Ou muito me engano, ou os egípcios vão sofrer grandes desilusões nos próximos tempos.

terça-feira, 12 de abril de 2011

ATENTADO EM MINSK



Um atentado bombista ontem à tarde (18 horas locais, 16 horas de Lisboa) na estação de metropolitano de Oktyabrskaya, uma das principais de Minsk, a capital da Bielorrússia, provocou várias dezenas de mortos e feridos.


O presidente Aleksandr Lukashenko, que convocou uma reunião de emergência do Gabinete, afirmou que a explosão fora concebida no estrangeiro e ordenou uma imediata investigação a esta tragédia, ocorrida numa hora de grande movimento, quando os comboios chegam àquela estação repletos de passageiros.



Ao mesmo tempo que determinava um reforço da segurança nacional, Lukashenko aceitou a oferta de ajuda do presidente russo Dmitri Medvedev.

O atentado de ontem é um acontecimento raro num país fortemente policiado e registou-se numa estação situada a poucos metros da sede da presidência da República. Receia-se que este acto criminoso constitua pretexto para uma maior repressão policial por parte de Lukashenko, que se mantém no poder desde 1994.

Há também o temor de que um atentado desta natureza, a exemplo de outros já verificados em capitais europeias, possa constituir um precedente para uma série de atentados terroristas em cadeia, numa altura em que a Europa é confrontada com medidas de redução drástica do nível de vida das populações.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

UMA ÓPERA PARA O TEMPO PRESENTE



(Cena Final do IV Acto)

 Plácido Domingo, Gabriela Benacková e Piero Cappuccilli em Andrea Chénier, de Umberto Giordano - Wiener Staatsoper - Direcção de Nello Santi (1981)

domingo, 10 de abril de 2011

POR QUANTO TEMPO É QUE OS CIDADÃOS VÃO TOLERAR ISSO?




O sociólogo Boaventura de Sousa Santos, professor catedrático da Universidade de Coimbra e prestigiado investigador internacional, concedeu hoje uma entrevista ao programa "Gente que Conta" da TSF, que vem publicada no Diário de Notícias. Na impossibilidade de transcrever o texto integral, já que o mesmo não está disponível online mas só na versão em papel, indicam-se algumas considerações do intelectual português, com grande audiência no estrangeiro mas menos escutado em Portugal, dado que muita gente dos meios académicos o considera pretensioso. Também Jorge de Sena foi olhado de soslaio por aqueles que, por inveja ou mesquinhez, o apoucaram ou ignoraram, numa manifestação ostensiva da prodigiosa mediocridade nacional.

Assim, limitamo-nos a transcrever a nota publicada no site da TSF - Rádio Notícias:


««O sociólogo Boaventura de Sousa Santos acusa Cavaco Silva de pecar por omissão e alerta que em Portugal as pessoas podem revoltar-se como aconteceu noutros países europeus. Em entrevista ao programa Gente que Conta deste domingo, o pensador de Coimbra disse que «é uma pena» que Portugal tenha este Presidente da República neste momento.
Boaventura de Sousa Santos recordou que «tivemos presidentes extraordinários e de grande capacidade de criar entendimentos, de chamar os diferentes partidos à razão».
«Era algo anunciado desde o discurso da tomada de posse, de que ele estava de alguma maneira envolvido em tudo isto e não teria uma solução» do tipo daquelas que pensamos necessárias, ou seja, «não passar por uma crise política», considerou, falando numa «magistratura por omissão».
Boaventura de Sousa Santos olha para a actual situação do pais e da Europa com particular inquietação, avisando que em Portugal as pessoas podem revoltar-se tal como aconteceu noutros países europeus.
«Não estamos a aceitar as regras que nos empobrecem, estamos a assistir ao desenvolvimento do subdesenvolvimento de Portugal, da Grécia, da Espanha e da Irlanda», disse, questionando: «Por quanto tempo é que os cidadãos vão tolerar isso?».
Para o sociólogo, «a corda está a ser muito esticada» e ainda será pior quando, por exemplo, os subsídios de férias e de Natal forem cortados.»»

UMA REFLEXÃO PARA PORTUGAL




É sempre conveniente reflectir sobre aquilo que, em crianças, chamávamos "desenhos animados".

sábado, 9 de abril de 2011

A AGITAÇÃO NO MUNDO ÁRABE (II)

Continua a agitação no mundo árabe.




Na Síria, as manifestações que ocorreram ontem, depois das orações, em Dara'a,  saldaram-se por 27 mortos em confrontos com a polícia, que registou, segundo o ministério do Interior, 19 baixas. Há numerosos feridos e inúmeras detenções realizadas pelas forças de segurança..

Verificaram-se igualmente protestos contra o regime em Lattakia, Tartus, Edlib e  Baniyas, e ainda em Harasta, um subúrbio de Damasco (onde foram mortas três pessoas) e em Homs (onde há a registar dois mortos). Também muitos curdos se manifestaram no leste do país, apesar das promessas de Bachar Al-Assad de lhes facilitar a concessão de cidadania.



No Egipto, milhares de pessoas voltaram a reunir-se na praça At-Tahrir, exigindo o julgamento do ex-presidente Hosni Mubarak e dos seus próximos colaboradores. Pela primeira vez, os manifestantes pediram também a resignação do chefe da Junta Militar, o poderoso marechal Tantawi, a quem acusam de ineficiência no processo de democratização do país. A poderosa Irmandade Muçulmana, que esteve relativamente afastada da contestação que levou à deposição de Mubarak, solidarizou-se com a manifestação de ontem.

Na Jordânia, em Amann, na sequência das manifestações que têm diariamente lugar, um homem imolou-se pelo fogo em frente do gabinete do primeiro-ministro.

Na Líbia, continuam os confrontos entre a facção do exército que ainda se mantém fiel ao coronel Qaddafi e os seus opositores, apoiados (e, por vezes, bombardeados por engano)  pela aviação da NATO, na sequência da resolução do Conselho de Segurança que autorizou uma zona de exclusão aérea para evitar uma catástrofe humanitária. Com avanços e recuos de ambos os lados, e cada vez mais dúvidas dos países que apoiaram, ou se abstiveram, na tomada de decisão, a situação é pouco clara, tendo o próprio Qaddafi enviado uma missiva ao presidente Obama cujo conteúdo se desconhece.

No Iémen, onde os confrontos se verificam diariamente, registaram.se esta semana pelo menos 21 mortos e centenas de feridos nas cidades de Taiz e Hudaida. Em Sana'a e Aden, milhares de pessoas continuam a pedir a saída do presidente Ali Abdullah Saleh, há 32 anos no poder.

Nos outros países prossegue a contestação aos regimes vigentes.

Aberta a Caixa de Pandora, não se sabe como irá terminar o processo de "democratização" do mundo árabe. Iniciado com a sublevação espontânea dos tunisinos, o actual movimento de contestação "globalizada" em todos os países árabes, decorre de uma reacção natural à crise económica e social endémica desses países, mas também à instrumentalização por parte de agentes internos e externos que ainda são difíceis de identificar claramente.

Como já dissemos, uma crise generalizada nos países árabes, quase todos marginais ao Mediterrâneo, poderá desencadear uma situação gravíssima no Mare Nostrum, cuja avaliação das consequências é, por ora, imprevisível. Torna-se, assim, conveniente que os países do sul da Europa (e mesmo a Europa toda) estejam precavidos para a tempestade que se perfila no horizonte.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

TUDO INOCENTES ?



Discordo muitas vezes de Vasco Pulido Valente. E acontece que, algumas vezes, também concordo com ele. É o caso do texto que escreveu hoje para o PÚBLICO, e que transcrevo do blogue "Portugal dos Pequeninos".  

TUDO INOCENTES ?

«Sócrates começou por jurar que não governaria Portugal com o FMI: porque “a agenda” do FMI implicaria uma “factura” pesada durante anos. Depois perguntou histericamente aos portugueses se queriam um governo com FMI ou sem FMI. E, uma vez posto em minoria na Assembleia, declarou que não tinha os poderes para negociar com o FMI, para anteontem com um prelúdio muito comovedor sobre “patriotismo”, a cargo de Francisco Assis, pedir ajuda ao sobredito FMI. Mas não nos deu a confiança de esclarecer que espécie de “ajuda”: se uma ajuda “intercalar” (que aparentemente não existe), se uma ajuda “mínima” (como quer Passos Coelho), ou se um “resgate” por inteiro, com as consequências do costume. O retrato do primeiro-ministro está todo neste deprimente espectáculo. Só que o mais deprimente destes meses de Março e Abril não foi, como devia ser, o eng. Sócrates – foi a irrupção de génios pela televisão e pela imprensa que já sabiam a história inteira e se preparam agora para explicar por que razão o FMI era preciso (e, para a maior parte, ele era preciso há muito tempo) e o que pouco a pouco nos trouxera a este trágico sarilho. Com o seu arzinho presunçoso e professoral, economistas, financeiros, banqueiros, filósofos e arraia-miúda vieram revelar ao indígena atónito que nada, ou quase nada, se fizera de lógico e sensato de 1990-95 para cá. Não vale a pena repetir a ladainha. Ninguém duvida que o nosso enormíssimo buraco não se cavou num dia. Infelizmente, esta constatação pede uma pergunta óbvia: em que se ocupavam os sábios que hoje com tanto gosto nos predicam, enquanto os partidos (o PS e o PSD) arruinavam o país? A ortodoxia em moda apela a que não se procurem “culpados”. Mas, se, de facto, não se procurarem “culpados”, para quem fica a culpa do tristíssimo fracasso do Portugal democrático? Para a má vontade de um Deus perverso? Para o destino? Ou para a insuficiência atávica do indígena? Era bom apurar isto, porque, se alguma destas três possibilidades (principalmente a última) ofende a delicadeza nacional, a única saída que nos resta é aceitar a ecuménica loucura dos portugueses. Quem se deixa chegar onde chegámos, levado por três dúzias de políticos, sempre reeleitos e até, às vezes, respeitados, não merece outro nome. E, pior ainda, quem desiste da verdade acaba inevitavelmente por desistir de si próprio.»


Com certeza que a a situação a que chegámos tem responsáveis. Nem poderia ser de outra forma. Os biliões de euros que em três décadas entraram em Portugal tiveram necessariamente algum destino. E há, por isso, responsáveis por esse destino. Não se concebe que tanto dinheiro se tenha pura e simplesmente evaporado no etéreo. Diz VPV que está na moda não se procurarem "culpados". Digo eu que é imperioso pôr de parte essa moda e ir ao fundo da questão. Porque haverá maiores e menores culpados, porventura toda uma cadeia onde a culpa se tenta diluir. Os próprios portugueses são culpados de terem votado anos a fio em partidos e criaturas que não mereciam qualquer credibilidade. Assim, não sendo possível julgar a totalidade (ou quase) do povo português, investigue-se e apure-se, pelo menos, quem foram os principais responsáveis. E na ausência de uma Justiça portuguesa digna desse nome, que esses indivíduos sejam presentes ao Tribunal Penal Internacional (caso este mereça ainda um módico de confiança, o que não se dá por adquirido), julgados e condenados às penas convenientes que devem ser aplicadas a quem, por acção ou (raramente) por omissão, contribuiu para a falência de Portugal.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

É A HORA !



Nem Rei nem lei, nem paz nem guerra, 
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer -
Brilho sem luz e sem arder,
Como o que o fogo-fatuo encerra.

Ninguem sabe que coisa quere,
Ninguem conhece que alma tem,
Nem o que é mal nem o que é bem.
(Que ancia distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...

É a Hora !

Valete, Fratres.

Fernando Pessoa, in Mensagem, Terceira Parte, III, Quinto