Ao longo de anos, Lagoa Henriques, professor da Faculdade de Belas Artes de Lisboa, escultor de vasta obra e um dos grandes mestres do desenho em Portugal, consignou, em cadernos tipo rol de merceeiro, algumas centenas de poemas, de qualidade irregular, que, por falta de editor, não chegou a publicar. Ignoro o destino que tiveram tais cadernos após a sua morte, mas apraz-me registar dois poemas (num registo mais picaresco, quase erótico), que o mestre gostava de dizer aos amigos mais próximos, com aquela sua característica tão peculiar de repetir as coisas até à exaustão. De tantas vezes os ouvir, acabei por decorá-los, e como presumo que não constem dos citados cadernos, decidi reproduzi-los aqui, antes que a memória me faleça.
Uma senhora casada
Que por vergonha não fode
À noite foi encontrada
Escondida (1) num vão de escada
A fazer um grande broche
A um matulão de bigode
Diz-se que é uma senhora abastada
Com propriedades, com eidos (2)
Mas coitada, não se sustem
Está constantemente aos peidos
Inda a semana passada
De saia curta e pantufas
Entrou na estação do metro
E largou logo duas bufas
Mas é uma senhora casada
(Continua como refrão)
(1) - Oculta (uma variante que o mestre gostava de utilizar em simultâneo)
(2) - Eidos: pequenas porções de terreno junto a uma casa
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Dona Perpétua Gonçalves
Qu'inda é prima do Lacerda
Indispôs-se com o criado
E mandou-o logo...à praça
Comprar sete (3) limões
Mas coitado, não tinha troco
E apalparam-lhe os colhões
(3) Podiam ser seis ou oito limões, mas não, eram sete, segundo uma precisão que o mestre sempre fazia
7 comentários:
Não vejo onde está o erotismo. Só vejo ordinarice,que por vir de grande escritor ou escultor não deixa de ser simples ordinarice.
Este comentário recorda-me, num seminário de mestrado/doutoramento na faculdade de Letras da Univ. de Lisboa, uma senhora professora de português do secundário que, no seu trabalho final sobre poesia portuguesa contemporânea, afirmou que os poetas portugueses contemporâneos eram todos uns grandes porcalhões. Chumbou, evidentemente.
Fui aluno do prof. Lagoa na ESBAL. Recordo as suas brilhantes lições e a sua maneira descontraída de tratar com os estudantes. Estes versos fazem -me lembrar outros que o mestre costumava dizer, mesmo nas aulas, criando um clima de grande à vontade com alunos e alunas.
Bem haja o autor do blog por esta evocação do mestre.
Um belíssimo desenho, como quase todos os que saíam da mão do mestre.
Quando será exposto o seu espólio?
Por acaso,concordo com o comentador das 11.30,ou seja tambem não vejo onde está o erotismo,e ia recomendar ao autor que se conservasse no nivel e na área habituais do seu blogue. Mas se os seus fieis seguidores se entusiasmam com o estilo e a "atmosfera" dos poemas,continue,pois é verdade que sempre nos puxou o pé para a chinela. Mais versos de grande erotismo,mais!
E se o comentador das 11:30 e o das 00:56 fossem uma e a mesma pessoa?
Grande Mestre, amigo bom.
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