quarta-feira, 30 de maio de 2012

OS SERVIÇOS SECRETOS



Nos últimos dias, em que tanto se tem falado de serviços secretos, e de relatórios sobre vidas privadas, resolvi reler um interessante trabalho do escritor e jornalista francês Gérard de Villiers, publicado em 1972 sob o título Brigade mondaine - Dossiers secrets. Neste livro, recolhe o escritor as histórias (algumas tocam o inverosímil), que lhe foram contadas pelo oficial de polícia Maurice Vincent, que foi chefe da equipa de estupefacientes da Polícia Judiciária francesa. 

Pertencendo durante vários anos à Brigade mondaine, criada em 1910 com o nome Brigade des Moeurs, depois rebaptizada, Maurice Vincent, também professor da École Supérieure de Police, efectuou as suas revelações após ter passado à situação de reforma.

Neste curioso livro, relatam-se vários episódios (que são um contributo para a história dos costumes em Paris na primeira metade do século passado) relativos aos "vícios" (as aspas são minhas) mais usuais da capital francesa: prostituição feminina e masculina, proxenetismo, pornografia, partousards du Bois, sadomasoquismo, voyeurs, exibicionistas, zoófilos, homossexualidade (trop voyante ou agressive), droga, aborto, adultério na alta sociedade, chantagem, etc.

Os protagonistas destes affaires não são identificados pelos nomes autênticos, o que preserva a sua intimidade.

Refira-se, a propósito, que Gérard de Villiers publicou posteriormente outros livros sobre matéria conexa, e é autor da série de espionagem SAS, com mais de 150 milhões de exemplares vendidos e tradução em diversas línguas. Antecipou nos seus livros os assassinatos do presidente Anwar El-Sadat, do Egipto, e da primeira-ministra indiana Indira Gandhi.

Os costumes de hoje em Paris, ou ailleurs, já não se apresentam de forma idêntica à que é relatada no livro (globalização oblige), mas a essência permanece sem grandes alterações. Poderosa é a natureza humana.

Um livro que merece ser lido.

terça-feira, 29 de maio de 2012

AS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS NO EGIPTO

Mohammed Morsi


Realizada nos passados dias 23 e 24 deste mês a primeira volta das eleições presidenciais egípcias, os resultados deste escrutínio são, segundo as últimas informações divulgadas pelo "Guardian" e a Al Jazira, os seguintes:

- Mohammed Morsi - 5.764.952 - 24,3 %

- Ahmed Shafiq - 5.505.327 - 23,3 %

- Hamdin Sabahi - 4.820.273 - 20, 4 %

- Abdel Moneim Abul Fotuh - 4.065.239 - 17,2 %

- Amr Mussa - 2.588.850 - 10,9 %

- Os restantes candidatos obtiveram um número de votos residual.

A segunda volta terá lugar nos dias 16 e 17 de Junho, em que estarão em confronto o candidato da Irmandade Muçulmana, Mohammed Morsi,e o candidato ex-primeiro-ministro de Mubarak, o marechal Ahmed Shafiq.

Segundo o presidente da Comissão Eleitoral, Faruq Sultan, a participação na primeira volta cifrou-se em 46 % dos eleitores.

Os resultados do escrutínio, admitindo que não se verificaram irregularidades na votação (especula-se sobre a existência de centenas de milhar de votos fraudulentos), são, no mínimo, curiosos.

O candidato da Irmandade Muçulmana, que é uma segunda escolha, já que o primitivo candidato foi recusado pela Comissão Eleitoral, por não reunir as condições previstas na lei, obteve surpreendentemente mais um milhão e meio de votos que Abdel Fotuh, ex-membro da Irmandade e que se prefigurava como o favorito dos islamistas moderados. Por outro lado, o marechal Ahmed Shafiq, que foi o último primeiro-ministro de Hosni Mubarak, quase se lhe igualou em número de votos. Quanto a Hamdin Sabahi, a esperança dos liberais e que representaria uma solução de compromisso, não conseguiu passar à segunda volta. Também surpreendente é a fraca votação em Amr Mussa, que foi, em tempos, ministro dos Negócios Estrangeiros de Mubarak e depois, durante anos, secretário-geral da Liga Árabe.

Estão, pois, os egípcios, perante um cruel dilema: ou votam em Morsi, e terão um membro da Irmandade na presidência da República (note-se que os Irmãos já dominam a Assembleia Nacional) o que poderá conduzir a um governo islâmico com tendência a evoluir para uma ditadura religiosa; ou votam em Shafiq, com tudo o que isso significa de retorno ao anterior regime e terão um governo com tendência a evoluir para uma ditadura tipo Mubarak. Quanto à distribuição dos votos dos candidatos que não passaram à segunda volta, as intenções terão não só a ver com as indicações de voto destes aos eleitores, como à própria disposição dos eleitores. Se os votos de Fotuh passassem em bloco para Morsi, este obteria cerca de dez milhões, o que ultrapassaria Shafiq, que não poderá contar certamente com a globalidade dos votantes em Sabahi nem mesmo com todos os votos recebidos por Mussa. Teríamos, assim, Morsi como presidente, à segunda volta, um cenário possível.

Acontece, todavia, que muitos egípcios, sobretudo nas principais cidades, estão francamente desiludidos com o caminho da Revolução. A situação económica é crítica, o turismo, uma das principais fontes de recita, caiu a pique, a segurança pública tornou-se uma prioridade perante a onda de crimes que avassala o país. Depois, todos os não-muçulmanos (coptas à cabeça) receiam, com razão, a instalação de um poder islâmico. Estamos a falar de cerca de 15% da população.

Os egípcios (especialmente a juventude das cidades) que dinamizou a Revolução, pretendia um governo mais ou menos laico. Mas, nas eleições legislativas, os Irmãos e os salafistas tiveram 70 % dos votos. Os revolucionários manifestaram uma ingénua ignorância quanto ao Egipto profundo. É agora uma ironia do destino terem de escolher entre um islamista e um ex-ministro do anterior regime.

Para lá, contudo, dos resultados eleitorais, existe ainda uma condicionante: as Forças Armadas, que detêm uma parcela significativa do poder económico do país. Não tendo o Egipto, ainda, uma nova Constituição, sempre as Forças Armadas poderão regular os poderes do novo presidente. E, em caso extremo, estou certo de que não hesitarão em intervir, para garantir aquilo que consideram as linhas vermelhas que não poderão ser ultrapassadas: ligação ao Ocidente, acordos com Israel, manutenção do poder económico da esfera militar.

É da história que, em matéria de revoluções, sabe-se como começam mas nunca se sabe como acabam.

Aguardemos, por isso, com expectativa, os resultados do próximo escrutínio e os acontecimentos ulteriores.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

GÜNTER GRASS E A EUROPA



O escritor alemão Günter Grass (Prémio Nobel da Literatura 1999) publicou no jornal Süddeutsche Zeitung um poema em que critica a Europa (leia-se, a Alemanha) pela sua política em relação à Grécia, lamentando a humilhação que está a ser infligida a este país. O poema de Grass surge após as infelizes declarações de Christine Lagarde, directora do Fundo Monetário Internacional, que afirmou serem mais dignas de compaixão as crianças da África subsahariana do que as crianças de Atenas. E é também um ataque à política de austeridade cega preconizada pela chancelerina Angela Merkel.

Este poema de Günter Grass é o segundo texto do Nobel, em menos de dois meses, a provocar profunda polémica, quer na Alemanha, quer a nível internacional. Recorde-se que anteriormente Grass tinha afirmado que é Israel e não o Irão quem, devido ao seu potencial nuclear, ameaça a paz mundial, o que lhe valeu ser considerado persona non grata pelo governo judaico.

Publicamos, abaixo, o poema integral, na tradução de Carlos Leite, que retirámos do blogue "aventar":

A Vergonha da Europa

À beira do caos porque fora da razão dos mercados,
Tu estás longe da terra que te serviu de berço.

O que buscou a Tua alma e encontrou
rejeita-lo Tu agora, vale menos do que sucata.

Nua como o devedor no pelourinho sofre aquela terra
a quem dizer que devias era para Ti tão natural como falar.

À pobreza condenada a terra da sofisticação
e do requinte que adornam os museus: espólio que está à Tua cura.

Os que com a força das armas arrasaram o país de ilhas
abençoado levavam com a farda Hölderlin na mochila.

País a custo tolerado cujos coronéis
toleraste outrora na Tua Aliança.

Terra sem direitos a quem o poder
do dogma aperta o cinto mais e mais.

Trajada de negro, Antígona desafia-te e no país inteiro
o povo cujo hóspede foste veste-se de luto.

Contudo os sósias de Creso foram em procissão entesourar
fora de portas tudo o que tem a luz do ouro.

Bebe duma vez, bebe! grita a claque dos comissários,
mas Sócrates devolve-Te, irado, a taça cheia até à borda.

Os deuses amaldiçoarão em coro quem és e o que tens
se a Tua vontade exige a venda do Olimpo.

Sem a terra cujo espírito Te concebeu, Europa,
murcharás estupidamente.

sábado, 26 de maio de 2012

A DESAGREGAÇÃO PROGRAMADA DA EUROPA



O cientista político francês Pierre Hilard publicou em 2005 uma obra de profunda acuidade, La décomposition des nations européennes, de que saíu, há meses, uma segunda edição aumentada.

Porque se trata de um trabalho de notável reflexão sobre a desagregação planificada dos países europeus que, com avanços e recuos, segue uma trajectória que os seus autores pretendem irreversível, e atendendo à situação que hoje se vive no Velho Continente, afigura-se conveniente tecer algumas considerações sobre tão importante obra.

No Balanço introdutório, Hillard considera que a ratificação do Tratado de Lisboa e a eleição de Herman van Rompuy para a presidência do Conselho Europeu, em 2009, marca uma viragem decisiva nas ambições mundialistas. Segundo o autor, a União Europeia não é mais do que a componente de um vasto programa visando a emergência de blocos continentais dotados, cada um, de uma moeda, uma cidadania, um parlamento único, etc., devendo o conjunto destes blocos tonar-se num governo mundial. Citam-se outros blocos em formação ou já constituídos: Comunidade Económica Euroasiática (Rússia, Bielorússia, Cazaquistão, etc.); União das Nações Sul-Americanas (todo o continente à excepção da Guiana Francesa); Sistema de Integração Centro-Americano (América Central); Organização da Unidade Africana (depois União Africana); Conselho de Cooperação do Golfo; uma união asiática (sob a égide de três actores principais: Japão, China e Coreia do Sul); uma união norte-americana (englobando os Estados Unidos, o Canadá e o México).

Procede Pierre Hillard a uma rápida digressão sobre o poderio financeiro e aristocrático anglo-saxónico, desde a instauração da Magna Carta. Refere as companhias London Staplers, London Mercers Company e British East India Company, como pontas de lança do imperialismo britânico. Detém-se em Cecil Rhodes (curiosa figura, que viveu sempre rodeado das suas jovens amizades masculinas), ardoroso defensor do Império Britânico, convencido da superioridade da "raça" anglo-saxónica cuja preeminência deveria ser assegurada pela união de todos os países anglo-saxónicos (ou, mais exactamente, pela instauração de um bloco reunindo o Império Britânico e os Estados Unidos), precursor da ligação ininterrupta do domínio britânico do Cairo ao Cabo (que inutilizou o português mapa cor-de-rosa) e cujo nome haveria de ser dado a uma colónia britânica, a Rodésia, depois dividida em Rodésia do Norte e Rodésia do Sul, hoje os países independentes Zâmbia e Zimbabwe. A sua acção foi continuada por Lord Alfred Milner, seu sucessor e filho espiritual, que foi chefe do gabinete de guerra do primeiro-ministro Lloyd George durante o conflito 1914/1918, e a quem se deve realmente a redacção da célebre Declaração Balfour (emanada do ministro britânico dos Estrangeiros Arthur James Balfour) e dirigida a Lord Walter Rothschild, líder da comunidade judaica britânica, a fim de ser transmitida à Federação Sionista Internacional, e que preconizava a instalação na Palestina de um Lar Nacional para o Povo Judeu.

Cita-se também Lionel Curtis, participante do Tratado de Versalhes  e autor da expressão Commonwealth of Nations e que teve um papel determinante na criação do think tank inglês, o Royal Institut of International Affairs (RIIA), conhecido como Chatam House (1920). E a Sociedade Fabiana (1884), impulsionada por Sydney Webb, George Bernard Shaw, Robert Owen, John Ruskin, etc., e cuja designação deriva do nome de Fabius Cunctator (contemporizador), general romano do tempo das guerras púnicas que praticava a política de guerrilha a fim de atingir os seus fins sem brusquidão mas implacavelmente. Os fabianos estiveram na origem da criação da London School of Economics, que formou no seu espírito gerações de políticos não só ingleses como de outras nacionalidades. Impregnado do ideal fabiano, o escritor Herbert George Wells desenvolveu os seus pontos de vista em numerosos livros, nomeadamente em The Open Conspiracy (1928), em que preconiza um estado mundial controlando tudo, e The New World Order (1940), em que retoma o tema da nova ordem mundial.

Outra instituição visando a criação do estado mundial é a Round Table (1910), devida a Lord Milner que, sendo grande admirador de Karl Marx, convenceu Lloyd George a apoiar firmemente a revolução bolchevique. Para dotar a Round Table de maior eficácia, foi decidido criar dois think tank em ambas as margens do Atlântico: do lado inglês, o já citado RIIA, do lado americano, o Council on Foreign Relations (CFR), em 1921, sob a égide de Edward Mandell House, conselheiro do presidente Wilson e personagem central entre o grupo Milner e os grandes de Wall Street (J.P. Morgan, Vanderlip, Rockfeller, Warburg, etc.). Warburg, que esteve à frente da Reserva Federal Americana (FED) desde a sua criação (1913), foi uma figura de primeiro plano na oligarquia anglo-saxónica.

Um outro instituto chamado a desempenhar um papel de primeiro plano na construção europeia é a Paneurope. Criada devido á acção do aristocrata austríaco Richard de Coudenhove-Kalergi (1894-1972), o seu objectivo era a unificação da Europa a fim de a integrar no quadro de uma organização política  mundial unificada. O seu primeiro congresso paneuropeu teve lugar em Viena, em 1926, sob a égide do presidente do Conselho francês Aristide Briand, que era o seu presidente de honra. Kalergi contribuiu largamente para a união parlamentar europeia, permitindo a criação, em 1949, do Conselho da Europa, e recebeu em 1950 o Prémio Carlos Magno, a mais alta distinção europeísta. Sucedeu-lhe à cabeça da Paneurope o arquiduque Otto de Habsburgo.

Nas manobras tendentes à concretização do governo mundial, importa referir a importância, óbvia, dos meios financeiros, muito bem explicada na obra que apreciamos. O apoio prestado pela aristocracia comercial e apátrida anglo-saxónica ao comunismo, ao nazismo e à tomada do poder por Franklin Delano Roosevelt encontra-se descrita na trilogia de Antony Sutton: Wall Street and the Bolshevik Revolution: The Remarkable True Story of the American Capitalists Who Financed the Russian Communists; Wall Street and the Rise of Hitler e Wall Street and FDR. Parecendo uma contradição, Sutton sustenta que o socialismo soviético, o nacional-socialismo e o New Deal são designações diferentes para a instalação de um socialismo monopolístico, ideal de organização que deveria ver o dia à escala planetária no quadro da nova ordem mundial. A guerra de 1939-1945 alterou os dados mas permitiu  a instauração de dois blocos aparentemente antagonistas mas obedecendo ao princípio hegeliano da tese e da antítese, sendo os dois mundos irrigados pelas mesmas fontes financeiras.

Após a Segunda Guerra Mundial, foi Winston Churchill quem relançou a ideia da unificação da Europa, no discurso de Zurique de 19 de Setembro de 1946: "É preciso construirmos uma espécie de Estados Unidos da Europa".

Uma outra etapa é a criação em Montreux (Suíça), em Agosto de 1947, sob a égide de Max Habicht do World Federalist Movement (WFM) e da Union of European Federalists (UEF). A Declaração da WFM propõe, entre outras coisas, a "limitação das soberanias nacionais", a "transferência para a Confederação dos poderes legislativo, executivo e judicial", a "criação de uma força armada supra-nacional" e "uma justa perspectiva federalista que deve integrar os esforços feitos nos planos regional e funcional. A formação de uniões regionais (sublinhado do autor) - na medida em que não constituem um fim em si e não correm o risco de se cristalizar em blocos - pode e deve contribuir para o bom funcionamento da Confederação mundial". Paralelamente, a UEF defende o ideal de uma Europa unificada segundo o princípio federal e inspirada no modelo suíço. Tem "filiais" em vários países europeus e inspirou a "Constituição Giscard", que foi um prelúdio ao Tratado de Lisboa. O "grupo Milner" e os fabianos foram sempre favoráveis à unificação da Europa,desde que esta se fizesse sob direcção anglo-saxónica. Por isso, no decurso das duas guerras mundiais, as tentativas de unidade europeia sob direcção alemã, potência terrestre, não podiam ser aceites por Londres e por Washington, porque a talassocracia anglo-saxónica se encontrava excluída dos assuntos do velho continente.

O Congresso da Haia (7-10 maio 1948), sob a presidência de honra de Churchill, que reuniu cerca de 800 militantes pró-europeus, lançou os primeiros fundamentos de uma Europa unificada. A figura de proa deste Congresso foi o seu secretário-geral Joseph Retinger (1888-1960), que, como a maioria dos verdadeiros actores da história, permaneceu nos bastidores.


Não cabe aqui referir todos os aspectos, personalidades, organizações e acontecimentos mencionados por Pierre Hillard. Anotemos apenas  a Fundação Bertelsmann, o Clube de Bilderberg (cujo primeiro presidente foi o príncipe Bernardo da Holanda e é hoje dirigida pelo visconde Étienne Davignon), a Trilateral (criada em 1973 por David Rockfeller e Zbigniew Brzezinski), o Komitee für eine Demokratische UNO (KDUN), a própria Igreja Católica (declarações de João XXIII e Bento XVI). Tudo coroado pelo Tratado de Lisboa. Na prossecução dos objectivos descritos importa não esquecer a acção das principais figuras das realezas europeias.

Cita-se o curioso pormenor de Herman van Rompuy, que foi convidado por Davignon para presidente do Conselho Europeu, ter sido submetido previamente a uma prova oral, em 12 de Novembro de 2009, perante os representantes do Clube de Bilderberg, entre os quais o antigo secretário de Estado americano Henry Kissinger.

Transcrevemos a conclusão da Introdução de Hillard:

«Cette rapide description de l'histoire des tenants du mondialisme remontant du Moyen Âge jusqu'au début du XXIe siècle souligne que cette tendance est très ancienne. Elle repose sur une cupidité sans limites, le contrôle complet des richesses planétaires et le rejet d'une autorité spirituelle qui rappelait la primauté de l'au-delà sur la recherche effrené des biens terrestres. Cette évolution n'a fait que prendre de la vitesse au fur et à mesure que le "clergé" mondialiste, successeur de Nimrod, réussissait à imposer son mode de pensée au niveau temporel et spirituel en faveur du nouvel ordre mondial. Depuis la chute du mur de Berlin, les événements s'accélerent; la crise aussi. La décennie 2010 sera décisive por le genre humain car le mondialisme est un messianisme pressé. Que peut-on dire d'autre? Humainement, ils ont gagné la partie... fermez le ban.»

Recomenda-se a leitura do livro para se perceber bem como a primazia outorgada aos regionalismos em detrimento das unidades nacionais é vital para o desmembramento das nações europeias. Um programa prosseguido com avanços e recuos, mas cujo objectivo permanece inalterado. Nesta obra constata-se igualmente a progressiva preponderância da Alemanha sobre o resto do continente europeu, na tradição do Santo Império Romano-Germânico (o Primeiro Reich). Aniquilados o Segundo e o Terceiro, os alemães tentam agora impor o Quarto.Uma "composição" de interesses devidamente analisada por Hillard, a partir das unidades de regionalização transfronteiriças alemãs.

Serão os homens mais felizes se, destruídas as nações, forem dirigidos por um Governo Europeu? Ou, caso extremo, por um Governo Mundial? Parece altamente improvável! Num mundo que apenas sacrifica no altar da finança, será o "socialismo" teoricamente subjacente a alguns dos ideais unitários um socialismo real ou apenas um simulacro para satisfação das oligarquias reinantes? Cabe a cada um tirar as devidas conclusões.


sexta-feira, 25 de maio de 2012

MAIS UM INCÊNDIO



Esta manhã, o fogo destruiu mais um prédio no centro de Lisboa. O edifício nº 253 da Rua da Palma, agora consumido pelas chamas, era ocupado pela Pensão Residencial Noite Cristalina, no 1º e 2º pisos, existindo no rés-do-chão um supermercado nepalês e uma loja de carregamento de telemóveis.



É oportuno recordar que o imóvel foi sede da Federação Espírita (encerrada pelo Estado Novo), quando existia no piso térreo o célebre Cinema Rex, espaço que foi mais tarde ocupado, durante um curto período, pelo Teatro Laura Alves.



Depois do incêndio de hoje no prédio, que é propriedade particular mas cujos donos não compareceram no local, segundo informa o PÚBLICO, restarão no local mais uns escombros a acrescentar a todos os restos de imóveis destruídos pelo fogo nos últimos anos no centro da cidade, e em cujos locais se erguem depois novas construções.

As causas do sinistro são desconhecidas, e nunca serão provavelmente conhecidas, pelo menos dos cidadãos, como é de uso nestes casos.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

ATENTADO NO IÉMEN



Desde que os Estados Unidos e seus comparsas invadiram o Afeganistão, depois do suposto ataque da Al-Qaeda a Nova Iorque e Washington, que não houve mais descanso no Mundo Árabe. Até parece que os acontecimentos se sucedem segundo um cenário previamente preparado.

Ontem em Sana'a, capital do Iémen, um bombista disfarçado de soldado, fez-se explodir durante o ensaio de uma parada militar que deveria comemorar o 22º aniversário da reunificação do norte e do sul do país. O atentado saldou-se por uma centena de mortos e várias centenas de feridos, no mais sangrento incidente até hoje verificado na cidade.

Segundo a Al Jazira, o ataque foi reivindicado pela Al-Qaeda, autoria também reclamada pela Ansar Al-Sharia, uma filial daquela organização na Península Arábica. Na confusão reinante, é, de facto, difícil, saber quem faz o quê. A evolução dos acontecimentos, que hoje se processa mais rapidamente do que no passado, permitir-nos-á, num futuro próximo, determinar com alguma certeza quais os interessados na desestabilização que assola todo o Médio Oriente desde há uma década. Como nos permitiu saber quem foram os autores, em épocas transactas, dos conflitos que abalaram esta tão sacrificada região.

domingo, 20 de maio de 2012

ELEIÇÕES NA SÉRVIA


O candidato nacionalista Tomislav Nikolic, ganhou hoje, na segunda volta, contra todas as previsões, a eleição para a presidência da República, na Sérvia, vencendo, embora por escassa maioria, segundo os resultados estimados, o presidente cessante Boris Tadic, o seu concorrente que era considerado o favorito para o lugar.

Nacionalista e populista, Nikolic, que foi um aliado do antigo presidente Slobodan Milosevic, considera-se hoje pró-europeísta, mas não a qualquer preço.

A entrega ao Tribunal Penal Internacional dos antigos dirigentes dos sérvios da Bósnia, o político Radovan Karadzic e o militar Ratko Mladic, pelo presidente Tadic, foi mal visto por muitos sérvios, que os continuam a considerar como heróis nacionais. Também a melhoria das relações com o Kosovo, embora sem reconhecer a independência daquele território, constituiu motivo de desagrado dos sérvios para com Tadic, dado que continuam traumatizados com o bombardeamento do país pela NATO em 1999, segundo a política de desintegração da Europa promovida pela própria União Europeia (?!) e pelos Estados Unidos.

Os sérvios, obviamente, não gostaram daquela não-declarada "guerra humanitária".

sexta-feira, 18 de maio de 2012

VOLTA À PISTA



Christian Giudicelli, um dos escritores franceses contemporâneos que melhor conhece e descreve o quotidiano da vida e o seu inexorável percurso, acaba de publicar uma nova peça de teatro, Tour de piste, que será apresentada no teatro Les Corps Saints durante o Festival Off d'Avignon de 7 a 28 de Julho, e depois reposta em Paris, no teatro Les Déchargeurs, a partir de 30 de Setembro deste ano.

Esta peça em um acto, e para um só actor, é uma verdadeira volta à pista da vida do protagonista, e afinal de todos nós, que de uma forma ou de outra com ele nos identificamos. No mundo complexo, e confuso, em que vivemos, ou melhor dizendo, em que sobrevivemos, Giudicelli encontra a palavra justa para definir as relações humanas, os problemas de geração, as contradições de uma sociedade que se desmorona sobre si mesma antes de verdadeiramente se ter construído.

Destinada preferencialmente a um público francês, espera-se que, a exemplo de Karamel, possa também ser representada em Portugal, com as adaptações necessárias ou mesmo sem elas, já que o essencial não depende de pormenores relativos à realidade francesa. Volta à pista é, realmente, uma volta em torno da vida.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

É UMA INFELICIDADE SER GREGO ?



Os gregos vão ser novamente chamados às urnas, a fim de se tentar eleger um parlamento que proporcione um governo ao país, tarefa que se afigura cada vez mais irrealizável, sendo contudo certo que a Grécia não poderá permanecer indefinidamente sem um Executivo, com ou sem euro, dentro ou fora da União Europeia, in extremis com um governo militar, de que existem precedentes não muito distantes.

A propósito da crise grega, que é o sinal mais evidente da crise europeia, e mesmo mundial, que estamos a viver, é oportuno referir o livro ΗΔΥΣΤΥΧΙΑ ΤΟΥ ΝΑ ΕΙΣΑΙ  ΕΛΛΗΝΑΣ, publicado em 1975 por Nikos Dimou, que já conheceu 30 edições e foi agora editado em francês com o título Du malheur d'être Grec.

Trata-se de um conjunto de 193 aforismos satíricos sobre a identidade grega, as principais facetas dos indivíduos e da sociedade, num registo de grande ironia, cruel por vezes, certeiro em alguns aspectos, injusto em muitas apreciações, mas que, segundo o autor, é, afinal, uma "declaração de amor à Grécia".

Afirma Dimou que o livro não é de alguma forma o de um "anti-heleno", mas o de um homem profundamente preocupado com o seu país e que tenta ajudar os seus compatriotas a realizar o oráculo de Delfos: "Conhece-te a ti mesmo".

Escrito ainda no tempo da ditadura dos coronéis, que acabou em 1974, é hoje um best-seller na Grécia e até contém uma irónica referência a Portugal. O que não deixa de ser curioso, dado que decorreram mais de 30 anos.

Traduzo o aforismo 32: «No fundo, o grego ignora a realidade. Vive duas vezes acima dos sues meios financeiros. Promete três vezes mais do que pode cumprir. Afirma conhecer quatro vezes mais coisas do que realmente sabe. Ressente-se (e compadece-se) cinco vezes mais do que é capaz de se ressentir».

Nos tempos que correm, esta apreciação poderá ser julgada cruel, e é obviamente excessiva, mas evidencia uma realidade cujas consequências são agora dramáticas. E mostra também como é difícil para os gregos contemporâneos arcar com o peso dos seus antepassados clássicos, herança de que duvidava Jakob Philipp Fallmerayer (1790-1861), historiador alemão que sustentava que depois das invasões eslavas dos séculos VI e VII na Grécia, não tinha restado "uma só gota de puro sangue grego".

terça-feira, 15 de maio de 2012

A NAKBA



Em 14 de Maio de 1948, Ben Gurion, presidente da Agência Judaica para a Palestina, proclamou unilateralmente a independência do Estado de Israel. No dia seguinte, e aproveitando a guerra que os países árabes limítrofes haviam declarado a fim de salvaguardar os direitos do povo palestiniano, Israel iniciou (ou melhor, prosseguiu) a sua política de perseguição dos palestinianos e de expropriação das suas terras e bens.

Em flagrante oposição à Resolução 181 das Nações Unidas, de 29 de Novembro de 1947, que previa a partilha da Palestina entre um estado judaico (55% da área do país) e um estado árabe (44%) e uma zona internacional (Jerusalém),o governo sionista, apoiado pelo Ocidente, consegue derrotar as precárias forças árabes invasoras, e alarga o seu território para 78% da superfície total. A parte restante fica sob administração egípcia (1,5% - a faixa de Gaza) e administração jordana (20,5% - a Cisjordânia). Mais de 700.000 palestinianos foram constrangidos a refugiar-se nos países árabes vizinhos. Com o decorrer dos anos, e a política expansionista de Israel, que sempre ignorou as resoluções das Nações Unidas, a situação dos palestinianos tem-se agravado dramaticamente.

É a este dia 15 de Maio de 1948 que os palestinianos chamam Nakba que, em árabe, significa catástrofe. Completam-se hoje 64 anos sobre esta tragédia que se abateu sobre o povo palestiniano que, até hoje, e apesar de uma luta heróica, não logrou obter um estado independente, viável e soberano. É o conflito mais antigo da história contemporânea.

A evocação desta data constitui, por isso, um indeclinável dever ético a nível mundial.


segunda-feira, 14 de maio de 2012

DA SÍRIA AO LÍBANO



Segundo relata a Al Jazira, registaram-se a noite passada graves confrontações na cidade libanesa de Tripoli, entre partidários do presidente sírio Bashar Al-Assad e apoiantes da oposição ao regime alauíta de Damasco.

Os incidentes provocaram, até ao momento, quatro mortos e 24 feridos, presumindo-se que o número de vítimas seja mais elevado.

Os incidentes começaram no sábado á noite entre o exército e grupos de jovens islamistas, devido à prisão de um indivíduo suspeito de terrorismo. Cerca de 100 islamistas, arvorando bandeiras negras e gritando "Deus é Grande", bloquearam as estradas que, a norte e a sul, dão acesso à cidade.

Os confrontos agora verificados entre elementos pró e contra o regime sírio não são inéditos, e durante anos Damasco exerceu uma espécie de tutela sobre o Líbano. Parece, todavia, intensificarem-se agora com a guerra civil que progressivamente se vai instalando no país vizinho.

Há, pois, todos os motivos para recear que o conflito em curso na Síria alastre ao Líbano e mesmo à Jordânia, acabando por envolver Israel. Talvez uma oportunidade para os palestinianos terem uma palavra a dizer quanto ao seu destino, ainda que os dados para um conflito regional no Médio Oriente não estejam lançados.

Devemos, contudo, estar preparados para o pior.

sábado, 12 de maio de 2012

OS ÚLTIMOS DIAS DE ROLAND BARTHES



Na sequência do post anterior, debruçamo-nos hoje sobre o livro de Hervé Algalarrondo (escritor e jornalista, redactor em chefe adjunto do Nouvel Observateur), publicado em 2006, Les derniers jours de Roland B., que, para o efeito, relemos.

Também esta não é, propriamente, uma obra sobre os últimos dias do Mestre, embora contemple a fase final da sua vida, tal como o livro de Christian Gury que, reclamando-se  dos primeiros dias, abrange igualmente o percurso literário e pessoal de Barthes. Em Algalarrondo, encontramos especialmente um olhar atento sobre o quotidiano do escritor, o seu emprego do tempo, a sua atracção pelos rapazes (por todos conhecida, mas que se converteu numa permanente obsessão com o passar do tempo), a ideia até ao fim alimentada de escrever uma obra sobre Proust. Hervé Algalarrondo, que conheceu Barthes e recolheu junto dos seus amigos e conhecidos os elementos indispensáveis ao notável fresco que traça no seu livro, dá-nos uma imagem mais nítida e autêntica do que aquela que normalmente temos do famoso semiólogo. E ao eleger como um dos temas preferidos do livro a sexualidade do Mestre, faz-nos compreender muitas das suas atitudes, das suas contradições, da sua carreira intelectual, das suas "manias" e da "tristeza" da sua vida.

Na impossibilidade de resumir um livro tão rico, parece-nos interessante transcrever alguns parágrafos de Algalarrondo.

Assim, a págs. 39, escreve: «Comme c'est la règle depuis qu'il a franchi la cinquantaine, le maître s'est entiché d'un élève. Aux États-Unis, aujourd'hui, il serait pousuivi devant la justice pour abus d'autorité; dans un livre récent, Philip Roth explique qu'il attend la fin de l'année universitaire pour draguer ses étudiantes. Dans la France des années 1979, ces précautions n'avaient pas lieu d'être.». Passagem elucidativa da moralidade hipócrita dos americanos, como ainda recentemente se verificou com o caso Dominique Strauss-Kahn.  Aliás, os wasp's, na melhor (diríamos, na pior) tradição dos seus antepassados, pretendem enfiar Deus e a religião na vida privada tornada pública, enquanto se entregam a todos os "vícios" na verdadeira privacidade de uma vida íntima imperscrutável. A hipocrisia em todo o seu esplendor.

Ainda na mesma página: «Ses amis disaient, en s'esclaffant: "Avec Roland, l'amant a droit a un dîner chez Lasserre, le garçon convoité à un whisky au Harris Bar, l'hétéro à une bière au Bonaparte, et une femme à un café sur le zinc."».

Na página 70, sobre a sociedade de consumo, já nessa época: «Avec Éric, ils vont faire les courses. Au casino d'Anglet, près de Bayonne, le 22 juillet: "Nous avons tout à coup la certitude que les gens achètent  n'importe quoi, ce que je fais moi-même. Évidence devant un chariot que passe superbement devant nous comme une calèche qu'il n'y a aucune necessité à acheter la pizza sous cellophane qui s'y prélasse". Puis il va, plus il s'intéresse à  "la vie dans sa ténuité", comme il disait.».

A págs. 129: «En 1909, quand il se lance dans la Recherche, Proust a trente-huit ans. Lui va en avoir soixante-trois: "Ce qu'[il] me reste à vivre ne sera jamais la moitié de ce que [j'aurais] vécu." Il entame une lutte contre le temps: vivra-t-il assez longtemps pour mener cette reconversion à son terme?  "Il arrive un temps où les jours sont comptés: on se savait mortel, on se sent mortel."».

A págs. 149: «Jean-Paul Enthoven se souvient d'aphorismes qui faisaient la joie de son convive: "La psychanalyse est une maladie qui se prend pour un remède." Ou encore: "Le diable est bien optimiste s'il croit qu'il peut rendre les hommes plus mauvais qu'ils ne le sont." Jean-Paul Enthoven voit dans le maitre la "réincarnation de Gide, la bonté en plus: même goût des apparences licites, même folie sensuelle. Il s'esclaffait quand je lui rappelais ce mot de Gide à un adolescent arabe lors d'un séjour au Maghreb: tu as fait l'amour avec un grand écrivain français."».

A págs. 161: «Roland a encore un an à vivre. Selon Sollers, il "n'en pouvait plus. Tout l'ennuyait, le fatiguai de plus en plus, le dégoûtait. Les demandes des uns, les supplications des autres". Il ne vise pas sa propre revendication d'un livre à sa gloire, mais la "niaiserie dépendante des garçons exigeant sans cesse d'être assistés, maternés, pistonnés... Pour quelques instants agréables (et encore), quel prix à payer... Téléphones, lettres, démarches...". "On couchait avec Barthes pour avoir une préface", confirme un ancien directeur littéraire. "À ce jeu de la résignation, il était devenu une sorte de saint malgré lui", conclut Sollers.».

Na página 215, há uma referência aos contactos do Mestre com as diversas camadas sociais. «Roland gagne le Flore, muni des Pensées de Pascal et de son cigare. Un gigolo brun vient s'asseoir à sa table, un Marseillais, "très peuple", qui a "du mal à s'exprimer". Enfermé dans son cercle d'intellectuels, le maître n'avait de contact avec le peuple qu'a travers deux canaux: Urt ( aldeia do país basco francês onde Barthes e a mãe tinham a sua casa de campo) et les gigolos. Ce Marseillais "est dans la merde: je le sens cafardeux; il sort de l'armée, n'a pas de logement, va d'un copain à l'autre". Roland a envie de s'entendre dire qu'il n'est pas totalement repoussant, mais son interlocuteur a "le discours typique du gigolo: chaque fois que j'insiste pour lui faire dire qu'il est vraiment prêt à coucher avec moi, il répond: Je suis libre".».

O Mestre regista num diário (Agosto a Setembro de 1979), Soirées de Paris (mais tarde incluído num opúsculo Incidents, 1987) as suas venturas e desventuras amorosas. Este livro, que se encontra editado em português, inclui outros textos, todos sobre o seu relacionamento homossexual, incluindo a permanência em Marrocos. Destas Soirées, Algalarrondo refere (pág. 220): «Il suffit au maître de dîner avec une femme pour ne rien avoir à raconter. Sa notule du 7 septembre est la plus courte de ces Soirées de Paris. Il a pourtant retrouvé à La Palette, près de l'Odéon, une amie proche, Violette, la femme d'Edgar Morin. Violette l'a aidé à trouver une aide-soignante pour veiller mam, quand celle-ci ne pouvait plus rester seule. Mais, de ce dîner à La Palette, Roland ne retient que la présence d'un Noir, "seul, sobre, silencieux". Il prolonge la soirée au Flore, "ingrat". Un type, "quelque peu avorton", l'importune: "Très difficile de lire son journal tranquille", se plaint-il. Encore plus difficile de tenir un journal tranquille: à chaque ligne, le malheur transpire.». Um pequeno lapso do autor: o jantar com Violette foi a 8 e não a 7 de Setembro.

 Muito haveria a extrair de Les derniers jours de Roland B., cuja leitura se aconselha aos barthesianos e não só. As citações a que procedemos não são mais do que exemplos do riquíssimo conteúdo do livro.

Apenas uma nota final. Barthes é atropelado a 25 de Fevereiro de 1980, após um almoço com François Mitterrand, então primeiro-secretário do Partido Socialista. O repasto fora organizado por Jack Lang, que já nessa altura se ocupava do pelouro cultural dos socialistas. Não em casa deste, porque o seu apartamento era pequeno para o efeito (havia uma dúzia de convivas), mas no Marais, em casa de um dos seus amigos, Philippe Serre, cristão de esquerda, um dos oitenta parlamentares a ter recusado plenos poderes a Pétain. Presentes, o historiador Jacques Berque, o então director da Ópera de Paris, Rolf Liebermann, a actriz Danièle Delorme, provavelmente Lionel Jospin. Não é possível reconstituir a lista completa dos participantes. Barthes aceitou o convite contrariado, e foi contrariado ao almoço, já que o estilo de conversa destas ocasiões era das coisas que francamente detestava. Por isso, ninguém se lembra de ter ouvido a sua voz. Acabado o almoço, dirigiu-se a pé para o Collège de France, a fim de regular um pormenor técnico para uma projecção no seminário que ia encetar sobre "Proust et la photographie". Ao atravessar a Rue des Écoles, em frente à venerável instituição, o Mestre é atropelado por uma camioneta, como referimos no post anterior. Num primeiro momento, ninguém sabe de quem se trata, porque não são encontrados documentos, caso estranho já que Barthes nunca saía de casa sem o cartão de identidade e a agenda. Os polícias apenas  encontram o seu cartão do Collège, ao qual se dirigem, já que o acidente se registara frente ao mesmo. Parece que é o próprio Michel Foucault quem vem pessoalmente constatar que o acidentado é realmente Roland Barthes. Crê-se que, na confusão, alguém tenha roubado os seus papéis e o relógio, enquanto jazia por terra.

O que fora um desastre à partida sem consequências graves, acabou por transformar-se num acidente mortal. Muito se tem escrito sobre o caso e Philippe Sollers e Julia Kristeva referiram-se ao facto, respectivamente, em Femmes e Les Samouraïs.

Afinal, o melhor testemunho sobre o fim da vida de Roland Barthes é Roland Barthes, ele-mesmo.

sexta-feira, 11 de maio de 2012

OS PRIMEIROS DIAS DE ROLAND BARTHES


Christian Gury, (n. 29/12/1950, Bordeaux) advogado honorário na Cour d'Appel de Paris, é também um escritor com vasta obra publicada, onde figuram livros como L'Extravagant Maurice Rostand, un ami de Proust et de Cocteau, Le Cardinal Grente, des maisons closes à l'Académie française ou Lyautey-Charlus, a que nos referimos aqui.

Este jurista, especialmente fascinado por Proust, acaba agora de dar à estampa Les premiers jours de Roland Barthes, précédé de Barthes en Arcadie. Não é, obviamente, um relato dos primeiros dias do autor de Fragments d'un discours amoureux, nem tão pouco dos primeiros anos, antes sim uma deambulação pela vida adulta de Barthes (e pela obra), num estilo muito ao gosto do autor, ainda que existam referências à sua infância e juventude. Livro recheado de alusões, citações e trocadilhos, esta nova obra de Gury pretende fazer-nos entrar na vida íntima de Barthes, nas suas frequentações (com relevo para a associação Arcadie, fundada em 1954 pelo antigo seminarista André Baudry, sob o patrocínio de Roger Peyrefitte, e dissolvida em 1982), na dupla personalidade Roland/Barthes, na sua frustração por não possuir um doutoramento de estado, na sua leccionação no Collège de France, na adoração pela mãe (que condicionou toda a sua vida e assumiu aspectos verdadeiramente doentios), em episódios do seu próprio conhecimento pessoal do Mestre.

De caminho, Christian Gury, como estudioso das marginalidades sociais,  aproveita a oportunidade para divagar sobre o meio homófilo parisiense, na prossecução dos seus estudos relativos à domesticação dos corpos e às fontes das obras dos escritores, avançando hipóteses originais, como a sustentada no livro acima referido de que o marechal Lyautey, que foi ministro da Guerra e residente-geral de França em Marrocos, um dos mais distintos oficiais da época e um apaixonado do mundo árabe, teria inspirado a Proust a figura de Charlus, em À la recherche du temps perdu.

O livro agora em apreço complementa, de certo modo, e à rebours, uma obra publicada em 2006, Les derniers jours de Roland B., por Hervé Algalarrondo, a que nos referiremos em próximo post. Como é do conhecimento geral, o Mestre, profundamente abalado pela morte da mãe, em 25 de Outubro de 1977, e que, por causa dela, manteve um diário entre 26 de Outubro de 1977 e 21 de Junho de 1978 (Journal de deuil, publicado em 2009), foi atropelado por uma camioneta, em Paris na Rue des Écoles, em 25 de Fevereiro de 1980, em consequência do qual viria a falecer, em 26 de Março, no Hospital de La Salpêtrière. Sustenta um amigo meu que Barthes teria visto no passeio oposto um rapaz que lhe despertou interesse, tendo atravessado inadvertidamente a rua. Opinam outros que se tratou de uma tentativa de suicídio. Nada faria prever, todavia, que o Mestre viesse a morrer por causa desse atropelamento, mas o seu passado de tuberculoso e também aquilo que poderíamos considerar como "desistência da vida" (ainda por causa da inultrapassável "orfandade" decorrente da morte da mãe), abreviaram os seus dias.

Figura do maior relevo no panorama intelectual francês e mundial da segunda metade do século XX, Roland Barthes, a que nos referimos neste post, deve ser lido, interpretado e meditado, pois a sua obra permanece, em boa medida, indispensável para a compreensão dos primeiros anos deste século XXI em que nos encontramos. E o seu percurso, apesar de todas as contradições, reais ou aparentes, constitui também uma lição de vida, lição certamente não inferior às que prodigalizou no Collège de France.


quinta-feira, 10 de maio de 2012

A PRIMAVERA ÁRABE EM DAMASCO



Parece que a chamada Primavera Árabe, que tanto entusiasmou a chamada comunidade internacional e uma parte das populações envolvidas, está a resvalar para uma catástrofe de proporções incalculáveis.

As notícias que hoje nos chegam de Damasco, onde duas explosões verificadas na zona de Qazzaz, a sul da capital, provocadas por carros armadilhados, provocaram mais de 50 mortos e centenas de feridos, podendo mesmo o número atingir um milhar, demonstram à saciedade o equívoco de apoiar movimentos sem real base de sustentação, ou a intenção deliberada de provocar o caos no mundo árabe. No momento em que a missão das Nações Unidas, segundo o plano de Kofi Annan, avalia a situação no terreno e tenta encontrar uma plataforma de entendimento entre as partes em confronto, este recrudescimento da violência tende a generalizar a guerra civil que já se vive no país.

Enquanto o governo de Assad responsabiliza os revoltosos por este acto sanguinário, os membros do chamado Conselho Nacional de Transição atribuem o morticínio ao regime, com o pretexto de demonstrar que são grupos ligados à Al-Qaeda (uma criação norte-americana, não o esqueçamos) que espalham o terror. Ignoro qual das hipóteses é verdadeira, mas não me parece credível que o regime esteja empenhado em incrementar o pânico no país, ao passo que todos sabemos que grupos fundamentalistas sunitas, a soldo do Ocidente, da Arábia Saudita, da Turquia, e dos países do Golfo (que  contribuem com dinheiro, com armas e até com homens para desestabilizar a região), se encontram operacionais em toda a Síria.

 Não sei o que pensam os chamados "Amigos da Síria", grupo de estadistas potencialmente criminosos, que sem mandato dos seus povos para intervir em países terceiros, logo se propuseram, consciente ou inconscientemente, derrubar o regime de Assad para instalar um "regime democrático" que se constata não ser mais do que uma generalizada guerra civil.

Depois da sinistra decisão de invadir e destruir o Iraque, tomada por dois dos maiores criminosos contemporâneos, Bush e Blair, acolitados por alguns serventes menores, que o mundo árabe não tem sossego. Já tinha havido antes a guerra no Líbano, mas fora um episódio, certamente terrível, mas localizado e comandado directamente por Israel.

A chamada "revolução do jasmim" na Tunísia, que, à primeira vista pareceu espontânea, está a transformar o país num estado islâmico fundamentalista. A invasão da Líbia e o assassinato de Qaddafi (que não sendo um modelo de virtudes merecia um julgamento independente) mergulhou o território numa guerra civil de que os jornais agora pouco falam, com a Cirenaica praticamente autónoma do resto da país e os apoiantes da Al-Qaeda a governar em Tripoli (não sei se com o aval do sionista francês Bernard-Henri Levy). No Egipto, onde o número de mortos soma e segue, e os partidos islamistas obtiveram para o parlamento, por convicção ou equivocação, uma votação esmagadora, não se vislumbra, mesmo com a eleição de um presidente da República, um período de tranquilidade, ainda que as Forças Armadas continuem a controlar o poder. Isto é, o cenário mais provável é uma guerra civil no Egipto, inicialmente de baixa intensidade. Em Marrocos, as concessões do rei proporcionaram um provisório período de acalmia, mas nada sabemos quanto ao futuro. A Argélia, perante manifestações e repressão vai-se aguentando, No Iémene, afastado o presidente Saleh, reina uma "relativa" tranquilidade.  Na Arábia Saudita e nos países do Golfo "não se passa nada". Curioso!!!.

Abstenho-me, por ora, de falar da África Central, onde os ventos não correm igualmente de feição.

Conheço a Síria, onde estive mais do que uma vez, ainda há poucos anos, e não me pareceu existir uma verdadeira e generalizada contestação ao regime. Por outro lado, tive oportunidade de constatar que as desigualdades económicas e sociais eram na Síria substancialmente inferiores ao resto dos países árabes, possivelmente com a exclusão da Tunísia. Creio poder mesmo afirmar que a Síria e a Tunísia eram, no seu conjunto, os países árabes (e conheço quase todos) com um nível educacional e económico mais elevado, os mais cosmopolitas e, se quisermos, os mais ocidentalizados, no que a palavra encerra de bom e não de mau. Reinava na Síria uma absoluta liberdade religiosa, num país com cerca de 20 confissões, cristãs, muçulmanas, judaica e outras, coexistindo com agnósticos e ateus. A liberdade que se pretende impor agora na Síria é a da perseguição a todos os que não seguirem a cartilha que eventualmente venha a ser adoptada caso se verifique uma queda do regime. Para além do êxodo populacional (só possível aos mais favorecidos), teremos, como no Don Carlo, de Verdi, "la pace dell'avel, a "paz dos cemitérios".

Intriga-me sempre a posição dos Estados Unidos no fomento (ou ajuda) destes conflitos nacionais, com o fim de degenerarem em conflitos regionais. Não creio que lucrem com isso, a médio prazo, a menos que se comprazam no ódio que é votado aos americanos em quase todo o mundo.

Recordo que o bombardeamento da Sérvia foi forçado até o último instante por Madeleine Albright. Que a invasão do Iraque (sendo Colin Powell secretário de Estado) foi pressionada por Condoleezza Rice. E que é agora Hillary Clinton que se arvora em campeã dos direitos dos sírios. Estas três mulheres têm levado a desgraça e a morte a milhões de seres humanos. Infelizmente, continuam vivas.


segunda-feira, 7 de maio de 2012

URNA FATALE




Piero Cappuccilli canta "Urna fatale", de La Forza del Destino, de Verdi, no Teatro Alla Scala, de Milão, em 18 de Junho de 1978


São as urnas, normalmente, fatais. Quer quando utilizadas para acondicionar os mortos que seguem para a sua, presumivelmente, última morada, quer quando destinadas a acondicionar os boletins dos escrutínios eleitorais.

Tivemos estes dias algumas eleições, todas importantes, embora algumas pareçam (um erro) mais importantes do que outras.

A comunicação social portuguesa (e mundial) deu a primazia da informação à eleição presidencial em França, que foi fatal, ainda bem, para Nicolas Sarkozy. As eleições gregas foram também objecto de interesse da imprensa internacional, não por causa da substituição do incumbente, mas atendendo à crítica situação económica e financeira da Grécia e ao previsível, e confirmado, resultado inconsequente da votação. Aparentemente inconsequente, mas perfeitamente consequente em face das políticas prosseguidas naquele país, primeiro pelos seus dirigentes incapazes e corruptos e depois pelas receitas (que nem ao Diabo lembrariam) destinadas à "recuperação nacional". Quero dizer que a União Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional, uma troika de mau agoiro, agindo sob a batuta, melhor, sob o cabo da vassoura da Lilith germânica, ultrapassaram os desígnios de Satan, do pequeno Satan, entenda-se, já que o Grande Satan habita outras paragens.

Mas realizaram-se, igualmente, eleições na Sérvia, país que deveria merecer as maiores atenções. Eleições presidenciais (primeira volta) e parlamentares.  Passam à segunda volta o actual presidente Boris Tadic (26,7 %) e o seu concorrente directo Tomislav Nicolic (25,5%). A segunda volta será a 20 de Maio. Os resultados das eleições legislativas, segundo os dados de que dispomos, foram sensivelmente idênticos aos obtidos nas eleições presidenciais. Assim, o Partido Democrático, de Tadic, e o Partido Progressista Sérvio, de Nicolic, obtiveram percentagens semelhantes às dos seus líderes. O partido Socialista, outrora liderado por Slobodan Milosevic, obteve 16,6%, ficando em terceiro lugar.

Hoje, e apesar do boicote da oposição, realizaram-se também eleições legislativas na Síria, as primeiras eleições democráticas das últimas décadas. Segunda informa a cadeia russa RT, concorreram mais de 7.000 candidatos, incluindo 710 mulheres, para os 250 lugares do Parlamento. Concorreram diferentes partidos políticos e candidatos independentes. As secções de voto encerraram ás 19 h (TMG) e não existem ainda resultados escrutinados. Desde 1963, é a primeira vez que a população síria é chamada a escolher directamente os seus representantes. Não obstante o clima de violência que se regista no país, o acto eleitoral decorreu com a possível normalidade, não se tendo registado significativos incidentes. O novo sistema eleitoral consta da nova Constituição aprovada, há meses, por referendo popular, e que visa dotar o regime de alguma legitimidade, dado que até agora o partido Baath, de Bashar Al-Assad, detinha o monopólio da representação nacional. Também destas urnas se aguardam os resultados, embora deles não se espere uma significativa mudança na evolução política do país.

Contudo, todas as eleições referidas são importantes não só para os respectivos países mas para a Europa e para o equilíbrio internacional.

E através destas urnas se poderá intuir também da força do destino.

domingo, 6 de maio de 2012

HOLLANDE PRESIDENTE


Com a vitória, esperada, de François Hollande para a presidência da República Francesa, Nicolas Sarkozy abandona o lugar aonde nunca deveria ter entrado.

Não é Hollande um homem de génio, nem sequer uma personalidade altamente prestigiada, como quase todos os seus antecessores, da direita, do centro ou da esquerda, ou de qualquer área mais ou menos indefinida. Mas importava remover Sarkozy do Eliseu, a bem da França e da Europa. Foi o que os franceses fizeram, e só me espanta que a sua vitória tenha sido por tão curta margem. O que demonstra que a lucidez política não é hoje uma virtude em terras da Gália, o que não abona muito em favor dos franceses. Não devemos, porém, criticá-los, pois essa desejável lucidez política abandonou também outros povos, em eleições ainda recentes. Contudo, salvou-se a honra da Nação.

Precisava a Europa de figuras carismáticas, nestes tempos obscuros em que tudo se confunde. Mas porque os candidatos surgem obrigatoriamente dos directórios partidários, vota-se mais contra alguém do que a favor de alguém, isto é, do mal o menos.

Como referiu Jacques Rancière, em entrevista que aqui transcrevemos, a eleição não é a democracia ou, mais concretamente, não faz só por si a democracia, nem esta se esgota em eleições. Mas é o que temos, por enquanto.

Também hoje os gregos foram votar para o Parlamento. Os resultados, igualmente não inesperados, constituíram um terramoto político, de consequências que só poderão ser avaliadas nos próximos dias ou semanas.

A chancelerina Angela Merkel, uma luterana obstinada, começou já a ensaiar uma operação de viragem face aos resultados nas urnas alheias e nas suas próprias (confrontar eleições de hoje no Schleswig-Holstein), mas creio que será tarde. As próximas eleições gerais alemãs poderão ser-lhe fatais. Estaremos assim perante uma morte política anunciada.

Neste cenário de incertezas europeias, há uma coisa que não consigo compreender. A precipitação do governo português em fazer aprovar na Assembleia da República o chamado Tratado Orçamental, que o próprio Hollande dissera já ser necessário renegociar. Sobre esta matéria, aguardaremos os próximos capítulos.

Como aguardaremos o próximo governo francês, os resultados das eleições para a sua Assembleia Nacional,  o cumprimento das promessas eleitorais de Hollande, a sua política interna e externa.

E também o que vai acontecer na Grécia. E em outros países da Europa. Apenas para não sairmos do Velho Continente.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

FERNANDO LOPES



O meu amigo João Gonçalves republicou o post colocado por Medeiros Ferreira no seu blogue "Córtex Frontal", evocando a figura ontem desaparecida do realizador Fernando Lopes, homem da maior importância no cinema português, e que por isso passo a transcrever:

«Encontrámo-nos como dois não-lisboetas que gostavam de Lisboa e suas ilhas de liberdade num Portugal amordaçado. Para o Fernando, o Cinema, para mim as Associações de Estudantes, para os dois o mundo da cultura, da inovação e do convívio entre gente de qualidade. O local de encontro foi o VÁVÁ, esse café mágico dos anos sessenta, no cruzamento das avenidas dos EUA e de Roma onde se teceu a modernidade, e até a post-modernidade, entre estudantes subversivos, artistas rebeldes e publicítários criativos. Lembro-me como se fosse hoje, e especialmente hoje, da nossa partida do café para irmos, em grupo comandado por essa agregadora chamada Milice Ribeiro dos Santos,  à estreia do Belarmino em 1964. Um literal murro no estômago, com savoir-faire. E, depois, as noites da Lisboa dos cafés e dos restaurantes, desde o Monte Carlo e Monumental, à Ribadouro e ao Gambrinus. Uma amizade tecida entre notícias das novidades culturais e políticas, com muita emulação para agradar ao auditório feminino da emancipação emergente. O meu exílio interrompeu esse convívio quotidiano por seis anos, durante os quais o Fernando se revelou aquele líder da organização do moderno cinema português que todos reconhecem. Mas o 25 de Abril voltou a reunir-nos de várias maneiras: estivemos juntos em alguns dos bons combates políticos do nosso tempo, e o Fernando produziu das melhores campanhas políticas, como as do General Ramalho Eanes. Sim, porque o Fernando Lopes não foi só um cineasta e um director de programas de referência - foi ele o responsável pela vinda do Sesame Street- e o que deu o selo de qualidade ao Canal 2 do seu melhor tempo. Ele foi sobretudo um cidadão e um homem de cultura inovador, muito à frente do seu tempo e das suas circunstâncias.»

Com a morte de Fernando Lopes, e não é uma figura de retórica, ficámos mais pobres.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

BALNEÁRIO DO REAL MADRID


Esta fotografia, colocada há 30 minutos no Facebook pelo jogador Pepe, já tem cerca de 30.000 "likes". A velocidade do Facebook e a atracção do futebol.

CAMPANHA SUSPENSA



Graves incidentes no Cairo, na zona de Abbassiya, perto do ministério da Defesa, que provocaram já 20 mortos (segundo as informações mais recentes) e mais de 50 feridos, levaram a que alguns candidatos interrompessem a respectiva campanha para as eleições presidenciais, que deverão iniciar-se nos próximos dias 23 e 24 de Maio.

As confrontações ocorreram entre apoiantes e opositores dos partidos islâmicos com a participação de criminosos de delito comum que se evadiram das prisões durante o período que se seguiu à queda do regime e, dadas as circunstâncias, continuam em liberdade. O exército foi forçado a intervir para restabelecer a ordem, uma ordem bastante precária nas últimas semanas, em que se tem assistido a um recrudescer da violência à medida que se aproxima o escrutínio presidencial.




Apesar dos protestos do Movimento 6 de Abril, que acusa os militares de crimes contra a revolução e os revolucionários, parece que as Forças Armadas não abandonarão a cena política, conforme haviam prometido, após a eleição do novo presidente, com o pretexto, e provavelmente com a necessidade, de garantirem a ordem pública. Tudo permanece, pois, em aberto na Terra dos Faraós.

A LÍBIA E O FUTEBOL



Em entrevista concedida hoje ao PÚBLICO, o jogador líbio Djamal Mahamat, que acabou de completar 29 anos (nasceu em Tripoli em 26 de Abril de 1983) e que integra desde o ano passado a equipa do Sporting Clube de Braga, tece interessantes considerações sobre o futebol em geral e sobre a prática do desporto na Líbia. Diz que no seu país o futebol já não é um jogo de morte (no passado verificaram-se vários actos de violência) e que Qaddafi nunca castigou os jogadores por perderem um desafio, antes os presenteando por ocasião das vitórias.

Parece, pois, que a imagem que nos chegava do Iraque, no tempo de Saddam Hussein, que os futebolistas perdedores eram castigados (e não temos a certeza que isso fosse verdade, já que tantas coisas que se afirmavam sobre o Iraque eram falsas, como as armas de destruição maciça) e que se projectou também sobre a Líbia, carecia igualmente de fundamento.