segunda-feira, 4 de agosto de 2014

AS MONSTRUOSIDADES VULGARES




Peço desculpa pela utilização do título de um romance de José Régio, mas parece-me a expressão mais adequada para definir aquilo em que se vai tornando o folhetim do Caso Banco Espírito Santo.

Nem posso deixar de sorrir ao ouvir a comunicação do governador do Banco de Portugal, após semanas de garantias prestadas na comunicação social por parte de figuras supostamente credíveis, desde o primeiro-ministro Passos Coelho ao inefável comentador político Marcelo Rebelo de Sousa.

Seria ocioso referir as incontáveis declarações dos últimos meses sobre o estado de saúde do sistema bancário português em geral (depois dos inconcebíveis e ainda não julgados casos BPN e BPP) e, em particular, do próprio Banco Espírito Santo, o BES.

A partir de certa altura surgiram umas pequenas dúvidas sobre a solvabilidade do Grupo Espírito Santo, o GES, mas foi garantido que existia um cordão sanitário à volta do Banco. A seguir, começou a constar que o GES (essa imensa constelação de entidades cruzadas) tinha problemas, mas garantia-se que o BES estava imune. Tudo isto foi dito recorrendo-se sempre a uma linguagem propositadamente técnica e, por definição, pouco acessível à generalidade dos portugueses.

Afinal, conclui agora o regulador que existiam fraudes, que a administração (entretanto afastada) do BES o enganou, que é necessária, só para o Banco (a partir de hoje chamada Novo Banco) a módica quantia de 4900 milhões de euros! E que os "activos tóxicos" (quais?) ficarão no BES antigo (o bad bank) a aguardar resolução.

Ora tudo isto, aqui sumariamente descrito em meia dúzia de palavras, é uma monstruosidade. Mas uma monstruosidade vulgar, de tal forma estamos já habituados às sucessivas mentiras com que vimos sendo brindados pelo poder político.

Tão vulgar que, perante a falência do principal banco privado português (entoem-se louvores à gestão privada) nem o primeiro-ministro se preocupou em interromper as férias à beira-mar para informar o país do facto (talvez para não contradizer as suas afirmações anteriores), nem sequer a ministra das Finanças foi além da elaboração de um mero comunicado de intendência.

Pretende-se que a injecção de capital agora decidida não custará um cêntimo aos contribuintes. E garante-se que os depósitos estão assegurados, bem como os postos de trabalho. A ver vamos.

Há ainda a obrigação da contribuição extraordinária dos outros bancos que operam no país. Uma questão a acompanhar atentamente.

Como foi possível que tudo isto acontecesse? A supervisão, que já falhara no caso do BPN, ao tempo de Constâncio, volta agora a revelar-se ineficaz com Carlos Costa.

Realmente, o sistema capitalista, especialmente se continuar desregulado, é óptimo para os capitalistas, especialmente para os capitalistas sem escrúpulos.

3 comentários:

Anónimo disse...

Essa conversa toda é o mesmo que dizer "como foi possível que tenham assaltado esta loja" com tanta polícia que existe no mundo... Bah, não é um processo de irregularidades normal que está aqui em causa, é um processo de fraude. As pessoas que andaram a cometere ilegalidades e a tentar sacar o máximo que puderam nos últimos meses souberam fazê-lo, também são espertos! A supervisão não é uma polícia, não tem escutas, não pode adivinhar aquilo que é ocultado de forma maldosa e criminosa. Assim que rebentou a bomba foram rápidos e eficazes, o pior está estancado. Agora têm que estudar formas de, no futuro, terem mecanismos para prevenirem estas surpresas, mas não merecem o tratamento injusto e parcelar que este texto lhes dá.

João

Anónimo disse...

Não posso de deixar de comentar o comentário das 15:45, pois para além de revelar uma candura angelical, mostra também que se pode viver aqui na Terra e simultaneamente noutra galáxia!!! Ainda bem que existem espíritos assim: crentes, atentos venerandos e obrigados. Provavelmente, acreditam também no Pai Natal, nas fadas e nos gnomos. Abençoadas estas almas, pois é delas o reino dos céus (o dos pardais, é óbvio!!!)

Anónimo disse...

Caro anonimo esclarecido: e argumentos, há?

João