quarta-feira, 3 de agosto de 2011
O JULGAMENTO DE HOSNI MUBARAK
Começou hoje no Cairo o julgamento do ex-presidente da República Mohamed Hosni Mubarak, e dos seus dois filhos Alaa e Gamal. O antigo Raïs é acusado de corrupção e de ter ordenado à polícia que disparasse sobre os manifestantes, durante os primeiros dias da contestação ao regime. Mubarak (tal como os filhos) declarou-se hoje não culpado. O julgamento prosseguirá a 15 de Agosto.
O antigo presidente, que tem 83 anos e está gravemente doente, foi transportado de maca para o tribunal e assistiu a esta primeira sessão numa jaula de ferro. O edifício da Academia da Polícia, onde decorre o julgamento, foi rodeado por vários tanques e um aparatoso dispositivo militar. Os advogados de defesa de Mubarak convocaram 1.600 testemunhas, entre as quais o marechal Hussein Tantawi, presidente da Junta Militar e que foi durante anos o ministro da Defesa de Mubarak.
O julgamento acontece por pressão da oposição e dos manifestantes que durante semanas contestaram o regime ou das suas famílias (no caso dos que foram abatidos pela polícia) e que acusam de inércia a Junta Militar
Todavia, e apesar do seu longo e autocrático consulado, Mubarak dispõe ainda de muitos apoiantes entre o povo egípcio. Também a instabilidade da situação no país, consequência da revolução, e que provocou a queda a pique do turismo, uma das principais fontes de receita da população, tem indisposto um número crescente de pessoas contra os contestatários, sendo que a Irmandade Muçulmana vai procurando navegar entre as várias tendências, enquanto se aguarda a realização de eleições.
Por outro lado, o julgamento de Mubarak (um acontecimento inédito no mundo árabe) está a provocar a maior perturbação nos regimes do Norte de África e do Médio Oriente e nas próprias populações. E constitui também uma armadilha para a Junta Militar, cujos membros fizeram parte dos governos e dos círculos mais próximos do ex-presidente. O tribunal não poderá condenar Mubarak (que incorre na pena de morte) e também não poderá absolvê-lo. Resta-lhe protelar a conclusão do julgamento tanto tempo quanto lhe for possível.
E ao contrário de Ben Ali, que fugiu da Tunísia e se refugiou na Arábia Saudita, Mubarak manteve-se no Egipto, um facto que concorre para a sua defesa. Bem vistas as coisas, Mubarak (tanto quanto se sabe) não fez mais nem menos do que têm feito, e continuam a fazer, os seus homólogos do Mundo Árabe. Por isso, o seu julgamento suscita viva emoção não só no Egipto (entre os seus partidários e simpatizantes) mas nos outros países islâmicos e mesmo no Ocidente.
Como podem os líderes mundiais aplaudir, em nome da justiça, o julgamento de um homem com quem mantiveram as mais próximas e amistosas relações durante décadas, e continuar a dialogar e a negociar com chefes de Estado cujo comportamento é idêntico ao de Mubarak? Trata-se de uma contradição insanável.
Enquanto os sírios tentam derrubar Bashar Al-Assad, autor de uma repressão neste momento já com mais vítimas do que as registadas no Egipto, e os líbios insistem em forçar a saída de Muammar Qaddafi, que permanece em Tripoli apesar dos bombardeamentos da NATO, atrevo-me a pensar que os egípcios (e os tunisinos) começam já a interrogar-se quanto ao futuro, após o entusiasmo (natural) das primeiras horas das respectivas revoluções.
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1 comentário:
De boas intenções está o inferno cheio. As intenções dos egípcios, em especial da classe mais politizada e instruída eram boas mas o resultado pode revelar-se negativo no contexto geral. A ver vamos.
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