quinta-feira, 3 de julho de 2014
DOMESTICAR A JUSTIÇA
Artigo de Fernando Dacosta, hoje no jornal "i", sobre a intervenção de Cunha Rodrigues no Grémio Literário:
“O ruir da Europa será o ruir de um dos mais extraordinários movimentos humanistas da história”, sublinhou Cunha Rodrigues, numa notável conferência no Grémio Literário.
Integrada no ciclo “Que Estado? Que sociedade? Que soberania?”, ali promovido em parceria com o Clube Português de Imprensa e o Centro Nacional de Cultura, a intervenção do ex-procurador-geral da República revelou-se, pela sua espessura humanista, de uma lucidez e de um desassombro invulgares. “A desconstrução dos direitos na Europa”, destacou, “é um dos aspectos mais devastadores da crise actual”. Por efeitos dela, “o papel dos juristas foi distribuído a outros actores, que alteraram tudo”. Consequentemente, os que “se manifestam hoje são titulares de direitos não cumpridos”, já que “todas as opções têm incidido na tributação do trabalho, não do capital”. Estamos numa “democracia pós-representativa” com o poder “entregue aos directórios dos partidos. O poder político elegeu-se crítico da justiça”. Décadas após a sua criação, “a CE continua um objecto político não identificado”. A crise provocou, entretanto, “um ambiente de pensamento único”, de “não haver alternativa”, ao mesmo tempo “que fez propagandear ser ela geradora de novas oportunidades, de empreendedorismos para os mais imaginativos”. Enquanto isso, “o direito e a justiça deixaram de constituir pilares de segurança, foram domesticados”. Daí os idosos, por exemplo, “terem deixado de ser donos do dinheiro que acumularam durante a vida de trabalho e os jovens terem de emigrar”.
Irónico, Cunha Rodrigues (de comunicabilidade envolvente) fingirá, por fim, justificar as suas posições lembrando “que depois de meio século de magistrado ou se fica empedernido ou ingénuo – eu fiquei ingénuo!”
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