A propósito da publicação do seu livro Le Bon Gouvernement, que será posto à venda esta semana, o historiador e sociólogo Pierre Rosanvallon, professor no Collège de France, fundador do grupo "La République des Idées" e uma das figuras maiores da intelectualidade francesa contemporânea, concedeu à revista "L'Obs" (nº 2650 - 20 a 26 Agosto 2015) a entrevista que reproduzimos:
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Nesta entrevista, Rosanvallon considera que existe um divórcio dramático entre o "momento eleitoral" e o "momento governamental", que não cessa de se acentuar. E que é preciso distinguir duas dimensões: a primeira, resulta do desvio entre a linguagem das campanhas eleitorais fundada na ideia de uma inversão na ordem das coisa e a linguagem governamental que representa o regresso à realidade; a segunda, resulta do facto de que a democracia foi sempre pensada como um processo de selecção e de legitimação dos detentores do poder e não como uma concepção específica da maneira de exercer o poder.
Um dos problemas, segundo o autor, é também a forma como o poder executivo se tem imposto ao poder legislativo, o que explica que os responsáveis políticos estejam cada vez mais desligados da sociedade e profissionalizados, tornando-se puros homens do aparelho. Rosanvallon preconiza o desenvolvimento urgente do que, nos Estados Unidos, se chama good government organizations, que militam por mais transparência, controlo pelos cidadãos e luta contra a corrupção. Não pretendem tomar o poder, mas vigiá-lo e controlá-lo.
Nesta linha de pensamento, propõe a criação de várias organizações que contribuam para um "bom governo". Pessoalmente, não creio que a criação de mais conselhos e comissões conduza ao aprofundamento da democracia. Penso até que já temos órgãos a mais e cidadãos que vivem à custa de instituições que, conforma a prática demonstra, se revelaram perfeitamente inúteis, ou quase.
Sem prejuízo da brilhante análise do reputado especialista, sou de opinião que o problema é outro, de natureza diferente, e cujo tratamento não cabe nestas linhas. O capitalismo contemporâneo internacional e a forma como se impôs aos regimes ditos democráticos desvitalizou a democracia. Aliás, esta, a democracia dita liberal, implica, nos termos, uma contradição profunda.
Deixo apenas uma questão. A União Europeia consagrou como única forma de governação possível para os países que a integram a adopção de um modelo hoje ultraliberal, que impede o funcionamento de qualquer governo cuja ideologia esteja em desacordo com os seus pressupostos. E se do resultado de eleições nacionais sair um governo diferente, logo ele é compelido a demitir-se face ao estrangulamento económico e financeiro (por ora ainda não militar) de que é alvo. Donde resulta a perfeita inutilidade de eleições nacionais se o modelo está previamente definido.
Por isso, afigura-se legítimo afirmar que a DEMOCRACIA nos países ocidentais (para a estes apenas nos referirmos) é uma FARSA.
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