terça-feira, 20 de janeiro de 2015

AIDA




É dispensável qualquer palavra de enaltecimento da ópera Aida, de Verdi, tal a projecção que atingiu no mundo lírico como uma das maiores criações musicais não só do famoso compositor italiano como de qualquer outro autor de qualquer outra época.

Este favor dos melómanos deve-se não apenas à excelência da partitura mas também ao argumento, numa altura em que o fascínio do Orientalismo, na sequência da expedição de Bonaparte ao Egipto e dos trabalhos pioneiros de Champollion sobre os hieróglifos,  começava a seduzir os espíritos mais cultos e mais sedentos de exotismo.


Foi o Khediva do Egipto, Ismaïl Pasha, homem desejoso de modernizar o seu país e largamente influenciado pelo Ocidente, que encomendou a Verdi uma ópera para inaugurar o Teatro de Ópera do Cairo que mandara construir. Diga-se, de passagem, que este teatro, de madeira,  foi completamente destruído por um incêndio em 28 de Outubro de 1971, existindo hoje no local um edifício de escritórios, armazéns e garagens, naquela que ainda se chama Midan Ubira (Praça da Ópera). O novo edifício da Ópera foi erguido na lha de Gezira, entre dois braços do Nilo, no centro do Cairo, e inaugurado pelo presidente Hosni Mubarak em 1988.


 Devido a problemas com o envio dos cenários e guarda-roupa, em resultado do cerco de Paris (1870-1871) durante a Guerra Franco-Prussiana, o Teatro do Khediva acabou por ser inaugurado com outra ópera de Verdi, Rigoletto, em  1 de Novembro de 1869, tendo Aida sido finalmente estreada em 24 de Dezembro de 1871.

O argumento de Aida, que todos conhecem, foi elaborado pelo egiptólogo francês Auguste Mariette (sepultado nos jardins do Museu Egípcio do Cairo), ainda que haja quem sustente que a autoria se deve a Temistocle Solera. O libretto é da pena de Antonio Ghislanzoni. Também ainda hoje se mantém a questão de saber se Aida foi ou não encomendada para a inauguração do Canal de Suez, que ocorreu oficialmente em 17 de Novembro de 1869.

Tudo isto a propósito de uma curiosa produção de Aida, na Ópera de Zurich, em 2006. Já é habitual a Ópera desta cidade suíça brindar-nos com encenações extravagantes e muito pouco convencionais, algumas de um franco mau gosto. Mas esta mania de inovar a todo o custo, só para parecer diferente, é um sinal dos tempos, e há sempre quem esteja disposto a pagar em nome de uma suposta modernidade.

A Aida de Zurich tem a particularidade de decorrer não no Egipto faraónico, como é intrínseco à própria história, ma no Egipto dos Khedivas, isto é, no século XIX. Para emprestar maior realismo à encenação, nem sequer faltam, nas vestimentas rituais dos sacerdotes, os adequados aventais maçónicos, muito em uso no Egipto daquela época. Eu mesmo tive ocasião de fotografar (mas não sei de  momento onde tenho as fotos), algumas vestes e insígnias maçónicas da família real egípcia, no Palácio de Manial, na ilha de Rawdha, a sul do Cairo, que foi residência do príncipe Muhammad Ali Tawfiq, tio do rei Faruq.



Esta produção, que apesar do desfasamento temporal não é escandalosa, reúne um leque de muito bons cantores: Nina Stemme (Aida), Salvatore Licitra (Radames), Luciana d'Intino (Amneris), Juan Pons (Amonasro) e Matti Salminen (Ramfis). A encenação é de Nicolas Joel e o maestro Adam Fischer dirigiu a Orquestra da Ópera de Zurich.

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