sábado, 30 de setembro de 2023

A IGREJA DO NAUFRÁGIO DE SÃO PAULO, EM VALETTA

A Igreja Colegiada do Naufrágio de São Paulo, em Valetta, é uma das mais importantes da cidade, por ela em si mesma e pelo que representa. Muitos escritores consideram o naufrágio do Apóstolo São Paulo na costa da ilha (c. 60 AD) como o maior acontecimento na história de Malta, pois foi ele que trouxe aos seus habitantes a fé cristã. A ilha é referida nos Actos dos Apóstolos (28, 1), atribuídos a São Lucas: « Estando já a salvo, soubemos que a ilha se chamava Malta».

O culto de São Paulo espalhou-se por toda a ilha e muitas igrejas são-lhe dedicadas, entre elas a Catedral de São Paulo em Mdina. E em Rabat existe a Gruta onde o Apóstolo viveu durante os três meses que permaneceu na ilha e à volta da qual foram escavadas catacumbas para os cristãos dos primeiros séculos e que serviram depois como abrigos subterrâneos durante a Segunda Guerra Mundial. 

A construção da igreja na versão actual começou em 1639 e prolongou-se por 40 anos. Mede 35 m de comprimento e 22 m de largura e possui uma nave central e duas naves laterais. A Sacristia encontra-se do lado esquerdo e o Oratório do lado direito. Nas naves laterais existem dez Capelas, cada uma com a sua cúpula. São dedicadas, do lado esquerdo a S. Miguel, S. Crispim e S. Crispiniano, Santíssimo Sacramento, S. Caetano e Santo Crucifixo e do lado direito a S. Martinho, São Homobonus, Nossa Senhora da Caridade, S. José e Santa Teresa d'Ávila. 

Fachada (em 2007)

 

A fachada ostenta uma imagem da Imaculada Conceição, sobre a porta central, flanqueada por duas torres com sinos. Sob os campanários encontram-se as estátuas de pedra de S. Pedro e de S. Paulo. Sobre cada uma das portas laterais há inscrições em mármore em honra de S. Paulo, uma comemorando a dedicação do templo em 1569 e a outra comemorando o restauro da nova fachada, concluído em 1886. A igreja é coberta por uma magnífica abóbada elíptica, ricamente pintada. A Capela-Mor, onde se  encontra o riquíssimo Altar-mor, foi alargada em 1762, pelo Grão-Mestre Manuel Pinto da Fonseca, para que pudesse acolher no recinto o trono do Grão-Mestre. Este manteve-se, ao lado do trono do Bispo de Malta mesmo depois da ocupação de Bonaparte em 1798 e só foi retirado após as reformas do Concílio Vaticano II. No dia da festa de S. Paulo, o Altar-Mor é ornamentado com treze magníficos e grandes castiçais de prata ladeados por seis pequenas estátuas de ouro e prata dos Apóstolos, cópias exactas das que existem na Basílica de S. João de Latrão, em Roma. No centro do altar é colocada uma base de prata, sobre a qual é posto, durante os três dias precedendo a festa, o relicário do Santo, em ouro e pedras preciosas.

Altar-Mor

A igreja possui um valioso conjunto de peças, em ouro, prata e pedras preciosas, como custódias, relicários, salvas, cálices, lampadários, tabernáculos, turíbulos, tendo vários destes objectos sido oferecidos pelos Grão-Mestres Pinto da Fonseca e Manoel de Vilhena.

Muito antes da igreja conventual de São João ter sido designada Co-Catedral, em 1816, a Igreja paroquial do Naufrágio de São Paulo era a igreja do Bispo de Malta em Valetta. Este, aliás, continua a possuir o seu trono na Igreja de São Paulo. 

Atrás do Altar-Mor encontra-se o Coro, construído um ao antes da erecção da cúpula, e realizado com os fundos concedidos por Don Cesare Passalacqua, procurador e grande benfeitor da igreja e cujo retrato se encontra na Sacristia. O Coro possui 22 cadeiras de madeira, 11 de cada lado, uma das quais ostentando as armas do  Capítulo.

Sobre o Coro, num nicho aberto na parede, encontra-se, segundo a tradição, parte da coluna original em que S. Paulo foi martirizado em Roma, no local onde hoje se ergue a igreja San Paolo alle Tre Fontane. Esta parte da referida coluna onde o santo foi decapitado foi doada à igreja, em 1818, pelo Papa Pio VII. 

Por Breve de 1733, o Papa Clemente XII elevou à categoria de Colegiada a igreja paroquial do Naufrágio de São Paulo. A cerimónia da investidura dos primeiros cónegos do novo Reverendo Capítulo da nova Colegiada teve lugar em 1733 no Palácio do Inquisidor, na Vittoriosa, e foi conduzida pelo Inquisidor, como representante da Santa Sé em Malta, Mgr. Giovanni Francesco Stoppani. Por Bula Apostólica de 1815, o Papa Pio VII concedeu aos cónegos do Capítulo o direito a usarem roquete, mozzetta de púrpura e cappa magna de arminho, bem como cordão de ouro e cruz peitoral. 

São Paulo

A estátua de madeira do titular da Igreja, São Paulo, foi esculpida por Melchiorre Gafà (1635-1667) em Roma, em 1659, tendo sido encomendada por Paolo Testaferrata, Barão de Gomerino. Durante anos foi conservada na casa particular da família e oferecida mais tarde à igreja pelos seus herdeiros. Esta estátua é passeada processionalmente em Valetta em dias solenes, como na festa de São Paulo, em 10 de Fevereiro.

Revestiam especial interesse nesta igreja paroquial as Confrarias ou Guildas Comerciais que lhe estavam afectas. Cada Confraria apoiava a Capela em que se realizavam os serviços religiosos em honra do seu santo padroeiro. Durante muitos anos houve sete Confrarias cada uma com a sua Capela, a saber: a Guilda dos Retalhistas e Vendedores de Carne, Peixe e Verduras tinha a Capela de S. Miguel; a Guilda dos Sapateiros e Fabricantes de Arreios a Capela de S. Crispim e São Crispiniano; a Guilda dos Ferreiros a Capela de S. Eligius (hoje Capela do Santíssimo Sacramento); a Guilda dos Ourives a Capela de Santa Helena (hoje Capela de Nossa Senhora da Caridade); a Guilda dos Tapeceiros, Alfaiates e Tecelões a Capela de S. Homobonus; a Guilda dos Mercadores de Vinho a Capela de S. Martinho. Também, durante anos, mesmo os Remadores e Trabalhadores Portuários tiveram uma Capela própria, a de Santa Ágata, hoje Capela de S. Caetano. 

Não cabe neste post a descrição das riquíssimas Capelas, tal como também não mencionámos  a decoração e as preciosas pinturas que ornamentam toda a igreja.

Na Capela de São José existe sobre o altar uma urna de mármore que contém um relicário de bronze dourado e pedras preciosas encerrando um fragmento do pulso direito de S. Paulo. A sua autenticidade foi garantia por diversos bispos e oferecida à igreja por Vincenzo Aloisio Bonavia, em 1823. Esta relíquia tem peregrinado não só em Malta mas também em Espanha e na Itália. 

Muito haveria a escrever a propósito do opúsculo em apreço, mas a presente apreciação já vai longa.

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