quarta-feira, 2 de março de 2011

HITLER E OS LIVROS (II)


Foi publicada em português o mês passado, com o título A Biblioteca Privada de Hitler, a obra a que nos referimos aqui, em 17 de Maio de 2009, a propósito da edição em francês do original de Timothy W. Ryback, Hitler's Private Library.


Tivemos então oportunidade para tecer várias considerações sobre a paixão de Adolf Hitler pelos livros, o que não o impediu de mandar queimar as obras de muitos autores, quer pela origem dos mesmos, quer pelos temas que não se configuravam com a ideologia nacional-socialista. Importa, todavia, salientar, como o fez Ryback, que não só Hitler coleccionava livros com paixão, como os lia de forma quase compulsiva, afirmando mesmo alguns autores que o Führer lia à média de um livro por dia, o que não deixa de ser notável (ou preocupante), na medida em que durante mais de dez anos foi o senhor dos destinos do III Reich.


A obra notável de Philipp Gassert e Daniel S. Mattern, The Hitler Library - A Bibliography (2001), traça um inventário dos livros da biblioteca de Hitler, e o livro de Ambrus Miskolczy, Hitler's Library (2003), inicialmente publicado em húngaro (2000), com o título A Führer olvas: Tallózás Hitler könyvtárában, debruça-se especialmente sobre as obras que Hitler leu e anotou, as que leu inteiramente, as que leu superficialmente e as que escreveu, por excelência o Mein Kampf, já que das outras (uma em colaboração com Dietrich Eckart) não reza a história.


A primeira referência internacional á biblioteca de Hitler é feita pelo jornalista americano Frederick Oechsner, em 1943, no seu livro This is the Enemy. Refere o autor que Hitler possuía cerca de 16.300 livros na sua residência na Chancelaria, em Berlim, e na casa de campo de Berchtesgaden. Os livros estavam divididos em três grupos: a secção militar, contendo à volta de 7.000 volumes; a secção dedicada à arquitectura, escultura, pintura, teatro, etc., com cerca de 1.500 livros; uma terceira secção, com predominância de livros sobre astrologia, espiritualidade, nutrição, Igreja Católica, ficção, etc. Esta secção incluía um livro sobre o estudo das mãos, às quais Hitler atribuía a maior importância, a ponto de catalogar as mãos de diversas personalidades, ou pessoas amigas, ou inimigas. Hitler apreciava as mãos de Hindenburg, Mussolini, Franco, Beethoven ou Wilhelm Furtwangler e detestava as de Goering, de Röhm, de Max Liebermann, de Fritz Ebert, de Lenine.


A leitura destas obras permitirá aos estudiosos uma melhor percepção sobre o pensamento de Adolf Hitler, sobre as suas convicções mais profundas ou mais circunstanciais (através das muitas anotações e comentários marginais que fazia), das personalidades que lhe eram realmente mais próximas (através das dedicatórias), e da evolução dos seus interesses (através da data da publicação ou da aquisição das obras). Um manancial para historiadores, políticos e militares, e certamente para muitas mais pessoas

2 comentários:

O tal leitor disse...

É curioso o fascínio que personagens como esta exercem sobre mentes diversas. Hitler era uma criatura intelectualmente medíocre,como se vê pela sua única obra,o "Mein Kampf",amontoado de ideias mal digeridas sobre a superioridade racial ariana,a determinação dos judeus como "razza dannata" culpada de todos os males do mundo,a necessidade de vingança das consequências do Tratado de Versailles,o projecto de um "Lebensraum" alemão,ideias correntes na época,e mais racionalmente expostas por outros autores. O facto de ter uma biblioteca com 16.000 livros,ou 160.000,não faz dele nem um intelectual nem indivíduo de qualquer respeito humano. Traços interessantes são o seu poder oratório,magnetizando multidões,jogando hàbilmente com o irracionalismo latente nas massas humanas,com ideias simplistas mas convincentes para as frustrações da época. E isso envolvido numa estética discutível mas eficaz,criada por Goebbels,Rieffenstahl,e outros,que fascinou públicos e privados. Mas estas distracções nunca apagarão a sua total responsabilidade na criação de um sistema político que conduziu consciente e expressamente ao extermínio inclassificável de milhões de seres humanos por pretextos raciais,e ter conduzido a uma guerra calamitosa,talvez a mais calamitosa de todas as guerras,em que destruiu o seu próprio país,boa parte da Europa e outros milhões dos seus habitantes,anulando de passagem o papel central que a Europa desempenhava no mundo,e que dando lugar à emergência do Americanos e dos Soviéticos,nunca mais voltou a possuir. Espero que estas divagações sobre as bibliotecas desta monstruosa figura não sirvam para tentar "lavar" uma das figuras mais repelentes da História Universal.Como o sangue na mão da Lady Macbeth,que ao pé do cabo austríaco,era uma menina de coro,esse sangue não se lava nem se apaga,e perseguirá a sua memória para sempre.

Anónimo disse...

Já agora os outros dois livros sobre a biblioteca de Hitler deveriam também ser traduzidos para português, ao menos o de Miskolczy