domingo, 11 de novembro de 2012
A CONVENÇÃO DO BLOCO
Realizou-se ontem e hoje em Lisboa a VIII Convenção do Bloco de Esquerda (BE). Venceu a moção A e João Semedo e Catarina Martins foram eleitos coordenadores do partido. Uma liderança "bicéfala", talvez para contrastar, como referiu Daniel Oliveira, com a liderança "acéfala" do Partido Socialista.
A fractura entre as moções A e B passou pelo facto de a segunda considerar que sem o Partido Socialista não se pode constituir um governo de esquerda em Portugal. E foi vontade expressa pelos bloquistas que este governo seja derrubado já.
Todos conhecemos, desde a Revolução de Abril, melhor dizendo, desde o 25 de Novembro, a dificuldade de constituir um governo do PS com formações à sua esquerda, designadamente com o PCP, uma vez que o BE é uma criação mais recente. Assim, existem em Portugal apenas três partidos, os ridiculamente chamados partidos do "arco da governação", que estão "autorizados" a formar governo em Portugal: CDS-PP, PSD e PS.
É verdade que as propostas políticas dos partidos considerados à esquerda do PS divergem substancialmente das defendidas por aqueles três partidos. O que não deixa de ser, no mínimo, irónico é que, considerando-se o PS um partido de esquerda, ele só tenha vocação para se aliar aos partidos da direita. Mas uma coisa é a teoria e outra a prática. Na realidade, o PS não é há muito tempo um partido de esquerda, no sentido comum da palavra. Como o não é a maior parte dos partidos socialistas ou sociais-democratas europeus. Desde que Mário Soares "meteu o socialismo na gaveta" e Mitterrand lançou às urtigas o "programa comum da esquerda", que as coisas mudaram muito. Em Portugal, especialmente a partir de Guterres, tudo se foi inclinando para a direita, em nome da realpolitik. Ainda que a actual versão ultra-liberal do nosso Partido Social-Democrata seja, mesmo assim, ainda surpreendente não só para os sociais-democratas mas para os portugueses e o mundo em geral. Como diria um escritor francês meu amigo, de quem traduzi, em tempos, uma peça: «Está o mundo às avessas.»
Acredito que existem "verdadeiros socialistas" dentro do PS, mas não é socialista a direcção que representa o Partido. Para ser sincero, nem sei o que ela é, como também não sei em que valores assentam os outros dois partidos do "arco da governação". A crise serve para iludir alguns mas não explica tudo.
Considera o BE que se verificará em breve uma grande transformação política em Portugal. “A situação vai mudar muito nos próximos meses. E haverá governo de esquerda queira ou não a direcção do PS”, Fernando Rosas dixit.
Como não sou profeta, não possuo a capacidade de adivinhar o nosso futuro político a curto prazo. Mas creio que a política prosseguida em Portugal, a que não é alheia a situação política da Europa, conduzirá a alterações profundas no Velho Continente. E que essas alterações não serão precisamente aquelas que agora flutuam no horizonte do neo-liberalismo triunfante. Arriscar-me-ia a escrever que esta cavalgada da financiarização da economia, se assim me posso exprimir, resultará numa tragédia não só para os povos atingidos pelas suas consequências mas para os seus promotores. Quem tiver ainda uns anos de vida pela frente poderá constatar da bondade da minha previsão.
Voltando ao Bloco, e consignando de passagem uma saudação à inteligência, competência e combatividade de Francisco Louçã (que agora se retira da liderança, que não da política), acredito que é possível encontrar uma plataforma de entendimento governamental entre o BE e o PCP (se este abdicar de algumas coisas mais formais do que essenciais). Não acredito que esse entendimento possa englobar o PS com a direcção actual. Mas acredito numa coisa. Ou uma parte dos "verdadeiros socialistas" vota PCP e BE em próximas eleições, reduzindo o PS a uma organização evanescente, ou surje um PS alternativo, se para tal estiverem disponíveis algumas figuras de referência do actual Partido Socialista.
Não creio é que a actual situação portuguesa (e europeia) se possa prolongar indefinidamente. Disse Carl Von Clausewitz que "a guerra é a continuação da política por outros meios". Quando a segunda não basta, avança-se para a primeira. Como aquilo a que se assiste presentemente (e para lá de todas as outras considerações) é uma guerra económica, e não chegando esta, então seguir-se-á a guerra tout court. Cujos resultados são imprevisíveis. Nunca é demais recordar que, no século passado, a Alemanha se enganou já duas vezes. Uma terceira seria excessivo.
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