terça-feira, 1 de agosto de 2023

A ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA DA IGREJA CATÓLICA

A Igreja Católica é, de alguma forma, a continuação do Império Romano. Quando o Cristianismo, a partir do Médio Oriente, se começou a espalhar pelo Império, e os seus fiéis a ocuparem os seus postos político-militares, a nova Igreja (em grego, Ekklesia=Assembleia) começou a adaptar-se à organização administrativa de Roma. Os próprios lugares de culto, pagãos, foram sendo apropriados pelos cristãos, à medida que os novos crentes, deixando de ser perseguidos, passaram eles mesmos a perseguir os seus anteriores perseguidores. O Cristianismo começou a ser tolerado no Império com Constantino I e tornar-se-ia mesmo a religião oficial com Teodósio I, sendo os adoradores da antiga religião, ou religiões, expulsos dos seus templos. O imperador Juliano, homem sábio, procedeu a uma última tentativa em defesa das antigas crenças, mas acabou por morrer assassinado. Num famoso romance histórico, o escritor Gore Vidal traça o quadro desse tempo. 

A Igreja Romana era no início a única Igreja Cristã. A separação de Bizâncio só seria definitivamente consumada no século XI, com Miguel Cerulário, patriarca de Constantinopla. Mas a organização da Igreja Católica Apostólica Romana (e da Igreja Ortodoxa), permaneceu semelhante à configuração inicial. Isto é, à semelhança do Império uno que seria dividido em 395 em Império Romano do Ocidente e Império Romano do Oriente, a Igreja dividir-se-ia, embora posteriormente, em Igreja Católica e Igreja Ortodoxa.

Está o território católico fraccionado em Dioceses (do grego, Dioikesis), que eram divisões administrativas das províncias romanas. À frente de uma Diocese está colocado um Bispo. As principais cidades (Civitas), as Metrópoles, passaram a ser designadas Arquidioceses e os seus titulares Arcebispos ou Metropolitas. O principal Arcebispo de um país passou a ter a designação de Primaz. As Dioceses dependentes de uma Arquidiocese (hoje todas as dioceses respondem directamente ao Papa) são consideradas sufragâneas. O Primaz tinha (como o nome indica) primazia sobre os outros Arcebispos do país.

Assim, o Arcebispo de Braga usa o título de Primaz das Espanhas, em disputa com o seu colega de Toledo. O Arcebispo de Lyon é Primaz das Gálias. O Arcebispo de Gniezmo é Primaz da Polónia. O Arcebispo de Esztergom-Budapeste é Primaz da Hungria.

Há ainda a dignidade de Patriarca, como título ou como bispo residencial. No rito latino da Igreja Católica, o único Patriarca como bispo residencial foi, durante muitos anos, o Arcebispo de Veneza, ou não fosse a cidade a capital da Sereníssima República. No tempo de D. João V, o Arcebispo de Lisboa foi também elevado à dignidade de Patriarca, devido às insistentes solicitações (e dádivas) do monarca ao Papa. A dignidade de Patriarca pode também ser usada como título: o Arcebispo de Goa e Damão usa o título de Patriarca das Índias Orientais. O Arcebispo de Madrid usou o título de Patriarca das Índias Ocidentais. No Oriente, a dignidade de Patriarca pode ser usada como bispo residencial. Temos nessa acepção o Patriarca Latino de Jerusalém ou o Patriarca Latino de Alexandria. Há, também, os Patriarcas residenciais de rito oriental, mas em comunhão com Roma.

Existem vários Patriarcas residenciais na Igreja Ortodoxa: Constantinopla (o Patriarca Ecuménico), Moscovo, Alexandria (não confundir com o Patriarca Latino ou o Patriarca Copta), Bulgária, Roménia, Sérvia, Antioquia, Jerusalém, Geórgia.

Existem na Igreja Católica milhares de bispos não residenciais (bispos que não o são de uma diocese actualmente activa). É o caso dos bispos auxiliares de bispos residenciais e de bispos que se encontram em funções ao serviço da Santa Sé, como os Núncios Apostólicos, os Prefeito e membros das Congregações Romanas (ou Dicastérios, em grego dikasterion, ou tribunal de justiça no Império Romano), etc. Como todos os bispos têm de o ser de uma diocese, a Igreja passou a dar a esses bispos o título de uma diocese hoje não activa, em poder de "infiéis", como é o caso de antigas dioceses actualmente em território de países ortodoxos ou muçulmanos. Chamam-se, por isso, bispos "in partibus infidelius". Os bispos auxiliares com direito de sucessão são designados bispos-coadjutores.

São dicastérios, além das congregações romanas (ou ministérios da Santa Sé), a Secretaria de Estado, os Tribunais da Santa Sé, os Conselhos Pontifícios e outras instituições semelhantes.

A dignidade de cardeal é a mais elevada na Igreja. São nomeados pelo Papa, em Consistório reunido para o efeito. No Império Romano, o título de cardini era dado a oficias da coroa, generais, prefeitos do pretório, etc. Na Igreja passaram a ser atribuídos aos membros de uma espécie de Conselho do Papa. O conjunto dos cardeais constitui o Sacro Colégio que, entre o Concílio de Trento e o Concílio do Vaticano II era composto de 70 membros, distribuídos por três ordens: 6 cardeais-bispos; 52 cardeais-presbíteros; 12 cardeais-diáconos. O número de cardeais é hoje ilimitado e depende da vontade do Papa. Os cardeais-bispos são os bispos das seis dioceses suburbicárias de Roma: Albano, Frascati, Palestrina, Porto-Santa Rufina, Sabina-Poggio-Mirteto eVelletri-Segni. O cardeal-bispo mais antigo acumula com o seu título o título da sétima diocese suburbicária, a diocese de Óstia e assume a dignidade de Decano do Sacro-Colégio. O título de cardeal-presbítero é conferido aos bispos das principais dioceses do mundo. São cardeais-diáconos os membros das congregações romanas. A eleição do Papa está reservada aos cardeais, reunidos em Conclave, mas actualmente só podem participar os cardeais com menos de 80 anos. Por disposições pontifícias, hoje só pode ser criado cardeal quem for bispo. Em tempos mais antigos, existiram cardeais que apenas eram padres, e até leigos, sem qualquer ordenação religiosa.

O lugar de Secretário de Estado do Vaticano é desempenhado por um prelado, normalmente cardeal, cujas funções equivalem às de primeiro-ministro do Papa.

O Camerlengo da Santa Sé (do latim, camerarius, ou adido à câmara, no Palácio Imperial Romano) é o cardeal que administra a Igreja no intervalo entre a morte (ou resignação) de um Papa e a eleição de outro.

O Núncio Apostólico é o prelado que desempenha as funções de embaixador da Santa Sé nos diversos países com que a Igreja mantém relações diplomáticas. Não havendo relações diplomáticas oficiais, o Núncio tem a designação de Delegado Apostólico. Nos países católicos, o Núncio é normalmente considerado o Decano do Corpo Diplomático, independentemente da sua antiguidade no posto, e tem precedência sobre os embaixadores de todos os outros países.

A designação de Basílica é também derivada do Império Romano. As basílicas eram edifícios utilizados pelos romanos para grandes reuniões. Locais onde se administrava a justiça, realizavam transacções comerciais, etc. Com a apropriação pelos cristãos dos edifícios da administração romana, estes converteram as basílicas em lugares de culto. Assim, as igrejas mais vastas e notáveis, passaram a ser designadas por basílica, normalmente apenas uma por cidade. Em Roma, sede da Igreja, há três basílicas: São Pedro do Vaticano, São João de Latrão e Santa Maria Maior. Há ainda São Paulo Extra-Muros, que não prejudica o número de três porque está fora de muros. Lisboa, que não podia ficar atrás, tem três basílicas: a Sé Catedral, a Basílica dos Mártires e a Basílica da Estrela. 

Muito mais haveria a dizer sobre esta matéria, que é inesgotável, mas fiquemos por estes breves apontamentos.

1 comentário:

Anónimo disse...

Excelente ... e subtil. Obg.