segunda-feira, 5 de janeiro de 2015
O SUICÍDIO EUROPEU
Dois livros recentemente publicados, e que se encontram no top das vendas, dão conta do estado a que chegou a França, e a Europa.
Refiro-me a Le suicide français, de Éric Zemmour e a L'ère du peuple, de Jean-Luc Mélenchon, o primeiro próximo do Front National, o segundo até há pouco membro do Front de Gauche.
Sendo que os autores se encontram diametralmente opostos no campo ideológico e político, é curioso notar que coincidem em muitos aspectos, e de uma maneira ou de outra apelam à criação de uma VI República. São unânimes em considerar a presidência de Hollande um desastre francês (e europeu); mas enquanto Zemmour, entre muitas coisas, "reescreve" a história de França e traça um paralelo entre Napoleão I e De Gaulle e entre a Revolução de 1789 e o Maio de 68, Mélenchon convoca o povo a intervir para libertar a democracia (supostamente o governo do povo) da governação imposta pelo mundo financeiro, que asfixia a liberdade real das nações, apenas permitindo o exercício de direitos formais e, mesmo assim, apenas quando estes não possam perturbar a hegemonia dos "mercados".
Sabemos todos, ou quase todos, que a Democracia na Europa não passa hoje de uma farsa que nem os seus dirigentes se esforçam por ocultar. As provas são eloquentes. Neste momento, e perante a hipótese do partido grego Syriza obter uma maioria de votos nas próximas eleições legislativas, Angela Merkel e o seu sinistro ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble, avisaram já que uma vitória da "extrema-esquerda" naquele país o condenaria à miséria, quero dizer, a uma maior miséria do que aquela que já existe no berço da civilização ocidental.
Começo a não ter dúvidas de que, a prosseguir este caminho, não só a chanceler Merkel cairá a curto prazo, como, o que é mais preocupante para a Europa, arrastará a Alemanha na queda e, por arrastamento, desencadeará no Velho Continente um conflito de proporções inimagináveis.
É por isso que as análises contidas nestes dois livros, um, o de Zemmour, longo de mais de 500 páginas, o outro, o de Mélenchon, apenas com 150, devem ser objecto de reflexão. Porque, latinos que somos, o que importa à França diz-nos também respeito, muito mais que aos povos nórdicos com quem não temos excessivas semelhanças.
A União Europeia que, no início, terá sido, possivelmente, uma ideia generosa, revela-se hoje um monstruoso equívoco, e a prossecução das actuais políticas comunitárias terá, inevitavelmente, consequências fatais. Não foi gratuitamente que o primeiro-ministro britânico, David Cameron, anunciou ontem ter em mente a antecipação do referendo no Reino Unido sobre a continuação daquele país na União Europeia (e a Inglaterra nem sequer pertence à Zona Euro). E nunca é demais lembrar que os povos europeus nunca foram chamados a referendar a sua adesão à União e aos subsequente tratados (salvo as raras excepções que confirmam a regra).
Os próximos meses serão decisivos para os anos à venir, para utilizar uma expressão cara a Blanchot, e para o futuro da pax europeia, que não deixou de ser perturbada após a Segunda Guerra Mundial, nomeadamente com os conflitos da Jugoslávia, primeiro e, agora, da Ucrânia.
Nada está adquirido, como é evidente. Existe, todavia, uma margem de esperança, se os homens que estão mandatados (sabe Deus como) para governarem os povos, tiverem um módico de lucidez, enquanto é tempo, Porque depois, como é de uso dizer-se em muitas óperas, será tardì!
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