terça-feira, 19 de março de 2013

RETALIAÇÃO NAZI


 Transcrevemos, pelo seu interesse público, o seguinte post do blogue "Politeia":

RETALIAÇÃO NAZI



O ASSALTO AOS DEPÓSITOS EM CHIPRE
 
O que se passou no último conselho do Eurogrupo, na noite de sexta e na madrugada de sábado passados, assinala uma nova etapa na condução da União Europeia na defesa do capital financeiro em estreita aliança com objectivos nacionais hegemónicos, protagonizados pela Alemanha.

Até ao presente nunca o FMI tinha usado ou imposto tal meio nos países por ele intervencionados. Embora o Fundo desempenhe no plano internacional o papel de ponta de lança do capital financeiro, nunca FMI, nas múltiplas situações em que tem actuado, esteve em condições de aplicar uma medida semelhante por razões que bem se compreendem. No quadro de uma pura relação bilateral, como foram todas aquelas em que o FMI tinha intervindo até ser chamado pela Alemanha para a ajudar a defender o euro, seria politicamente muito difícil fazer a aplicação de tal meio. Todavia, num quadro profundamente anti-democrático, como é o da União Europeia, politicamente hegemonizado pela Alemanha com a participação de governos colaboracionistas, o FMI (e o capital financeiro que ele representa) já não teve qualquer problema em aceitar a aplicação de uma medida tipicamente nazi.

De facto, a decisão de confiscar uma percentagem de todos os depósitos dos bancos cipriotas é, pela sua natureza aleatória e pela completa ausência de causalidade entre a falência do sistema financeiro cipriota e os capitais nele depositados, um acto de retaliação tipicamente nazi.

Apanham-se os que estão por perto, que nada têm a ver com o acto que se pretende reprimir, para prevenir, pela brutalidade e pela arbitrariedade, a repetição de actos de natureza semelhante.

Sendo o acto em si é a todos os títulos condenável, poderia supor-se que ele é também na sua essência estúpido e irracional por verdadeiramente nada resolver quanto à causa do acto que pretende reprimir. Explicando melhor, se um atentado contra um SS (Reinhard Heydrich, por exemplo) poderia ser futuramente prevenido com um massacre de populações inocentes (Lidice, no exemplo dado), já que a respectiva resistência nacional teria doravante de passar a ponderar as consequências dos seus actos no povo que pretendia libertar ou vingar, no caso de Chipre poderia à primeira vista dizer-se que a retaliação nada resolve, por não haver uma ligação semelhante entre os detentores do capital financeiro e os depositantes. A verdade é quem assim pensar engana-se redondamente.

A retaliação decidida pela Alemanha na madrugada de sábado passado é ainda mais perversa: exactamente por não haver aquele tipo de ligação entre os depositantes e os detentores do capital financeiro é que a Alemanha espera que os capitais que antes afluíam aos bancos cipriotas, bem como muitos dos que estão depositados nos países periféricos intervencionados de facto ou de direito (Portugal, Grécia, Espanha, Itália), afluam aos bancos germânicos ou aos dos seus aliados por estas passarem a ser as únicas praças onde se podem sentir verdadeiramente seguros.

Com o tempo os processos perversos tendem a refinar-se de modo a que se possam alcançar exactamente os mesmos resultados que antes se pretendiam obter pela brutalidade física. É uma questão de ir afeiçoando os meios ao contexto do tempo em que se vive.

Dir-se-á, todavia, se assim for a Alemanha estará cavando a prazo a decadência da sua prosperidade económica em grande parte resultante do extraordinário excedente que há mais de uma década vem crescendo no seio da zona euro.

Certamente. Mas a partir daqui já entramos noutro tipo de conversa. Aparentemente assim será, embora a Alemanha possa supor que o extraordinário crescimento dos países emergentes lhe permitirá dentro de relativamente pouco tempo substituir os mercados europeus por aqueles. Embora os números não apontem nesse sentido, já que qualquer pequeno país europeu rico compra mais a Alemanha do que, por exemplo, a Índia, ela pode, por via do seu “racional irracionalismo”, caminhar mesmo assim para o fim com o entusiasmo grandioso das óperas de Wagner. Ninguém exprimiu esse pensamento melhor do que Hitler nas últimas horas da sua vida.

2 comentários:

absurdo disse...

Há quem sonhe, com li algures, no Marco-prussiano como moeda, em toda a sua grandeza do séc XIX ....

Anónimo disse...

Notável o texto de JMCorreia Pinto. Parabéns ao autor do blog por ter efectuado a transcrição. Estamos sempre a aprender.