sexta-feira, 23 de abril de 2021

A ALTA CULTURA E A CULTURA MODERNA

Devo ao Daniel Sousa a referência à edição, em fins do ano passado, de A Cultura Moderna, de Roger Scruton (1944-2020), tradução de Modern Culture (1998, 2000) cuja publicação me havia passado despercebida. Não comungando de muitas das afirmações do autor, devo concluir que se trata de um trabalho interessante, fruto de profunda reflexão, ainda que o universo de Scruton se restrinja quase ao universo anglo-saxónico (obviamente, ele é inglês), com algumas cedências ao mundo germânico e pouquíssimas ao resto do continente europeu.

Começa Scruton por ensaiar a definição de cultura, ou de culturas, socorrendo-se de Herder e de Humboldt para depois se debruçar sobre a cultura popular e para chegar ao conceito de cultura moderna, fazendo também a distinção entre cultura e civilização.

Atendendo à densidade da obra seria impertinente proceder a qualquer resumo, pelo que me limitarei à transcrição de algumas passagens que, por uma ou outra razão, detiveram a minha atenção.

«Há três tipos de saber distintos: saber que, saber como e saber o que. Eu sei que o urânio é radioactivo; sei como andar de bicicleta; e, por vezes, sei o que fazer, o que dizer ou o que sentir.» (p. 33)

«Segundo a perspectiva que proponho, a alta cultura não é uma fonte de saberes técnicos ou científicos (saber que ou saber como), mas uma fonte de sabedoria prática (saber o que). O seu sentido reside na visão ética que perpetua, e na ordem que culmina nas nossas emoções. Deste ponto de vista, não pode existir uma cultura científica, da mesma forma que não pode existir uma religião científica; a cultura, como a religião, trata a questão que a ciência deixa sem resposta: a questão de o que sentir. O saber que nos outorga não é um saber dos factos nem dos meios, mas dos fins: o mais precioso saber que possuímos.» (p. 35)

«Utilizar o Livro de Oração Comum ou a Missa Tridentina não é uma questão de "mera forma". Presumir que o rito é uma questão de forma implica conceber o tipo de separação entre forma e conteúdo que é precisamente a morte (a morte por discórdia) de uma verdadeira cultura comum» (p. 37)

«A actividade racional abrange tanto os fins como os meios. Numa era tecnológica, adquirimos progressivamente um maior domínio dos meios para alcançar os nossos fins, e um menor domínio das razões que nos fazem querer alcançá-los. [...] O domínio dos meios, que emancipou a humanidade do trabalho pesado, trouxe consigo o mistério dos fins - uma incapacidade de responder convictamente à questão de o que sentir ou o que fazer. O mistério adensa-se com o advento da sociedade dos consumidores, onde todos os meandros da vida social são dedicados ao consumo. Este, na sua forma habitual, não é verdadeiramente um fim. O acto de consumo destrói o que é consumido e deixa-nos de mãos vazias: as aspirações do consumidor são ilusões perpetuamente recorrentes, e que se desvanecem no preciso momento em que as avistamos, destruídas pela avidez do nosso apetite. A sociedade de consumo é, pois fantasmagórica, um lugar onde os espectros das satisfações são perseguidos pelos espectros de verdadeiros desejos. [Nota de rodapé: A contribuição mais sólida que Marx legou ao estudo da economia política foi, no meu entender, o reconhecimento do carácter alucinogénico da economia  monetária, tal como exemplificado naquilo que ele designou por "fetichismo  da mercadoria"]» (pp.53-4)

«Oscar Wilde afirmou que o cínico é aquele que sabe o preço de tudo e o valor de nada. Numa carta endereçada a Lord Alfred Douglas, Wilde descreveu o sentimentalismo como "o feriado bancário do cinismo". É certo que os comentários de Wilde costumam ser mais espirituosos do que verdadeiros. Estes, contudo, são certeiros. O cinismo e o sentimentalismo são dois  modos de reduzir coisas com valor a coisas com um preço.» (pp. 81-2)

«As fantasias são propriedade privada, da qual podemos dispor de acordo com a nossa vontade, sem obrigação de prestar contas ao outro. Se, no acto do amor, a nossa mente se ocupa com elas, já constituem um abuso do outro, que é convertido num recurso substituível para atingir um prazer que só a nós diz respeito, em vez de ser o objecto de um desejo que se dirige à sua pessoa. Assim, o parceiro ideal do fantasista é o gigolô ou a prostituta, já que a natureza comercial da transacção resolve, definitivamente, o problema moral da existência de outra pessoa quando o que se procura é a satisfação sexual. Ao participar de uma transacção comercial, a prostituta é substituível e, portanto, não está verdadeiramente presente no momento do desejo. Ela é a ausência universal, que a fantasia preenche com atributos substitutivos. A ligação entre a pornografia e a prostituição é evidenciada pela etimologia. O resultado final da fantasia pornográfica é a transformação do objecto do desejo em "mercadoria", e a substituição do amor e dos sacramentos vestigiais pela lei do mercado. É este o desencantamento final do mundo humano. Quando o sexo se converte em mercadoria, o santuário mais importante do ideal humano vem a ser um mercado, e o valor é reduzido a um preço.» (p. 91) [O sublinhado é meu]

«Num mundo onde tudo está à venda, onde o valor é o preço, e o preço é o valor, onde se transaccionam sentimentos, e onde o sentimentalismo fraudulento já não se distingue dos atributos genuínos, o artista muda-se em modernista e a cultura refugia-se uma divisão inacessível, bem acima do mercado. Ao longo de mais de um século, a cultura moderna tem sido uma cultura modernista e, ainda que estejamos agora a entrar numa fase "pós-moderna", ou "pós-modernista", ou, talvez, "pós-pós-modernista", não podemos entender devidamente o lugar one estamos sem ter em conta o empreendimento modernista.» (p. 97)

«Ao propiciar uma vitória recorrente sobre o mal, a morte e tudo o que nos prende ao reino animal, a Eucaristia renova a nossa fé e confirma-nos como criações destinadas a uma esfera superior. Apesar da morte de Deus, a Eucaristia mantém o seu apelo. A cerimónia religiosa assume agora uma dimensão mítica, e um outro "como se" apodera-se das nossas digressões mortais. Este é o tema de Parsifal, a mais enigmática e inefável ópera que Wagner compôs, tão pagã como cristã.» (p. 103)

«A concepção de Wagner sobre o amor erótico descende directamente do Romantismo. O amor que é retratado no drama tem origem no exterior do lar. É uma força indomável e não domesticada que conduz ao adultério (Tristão e Isolda) ou ao incesto (As Valquírias). Este amor só vence quando se opõe à moralidade, ou quando profana o casamento. Os filhos raramente aparecem; quando, do amor de Siegmund e Sieglinde, resulta uma criança, ela é de imediato feita órfã e entregue a uma casa que não é de todo uma casa, mas um lugar de servidão e alienação. Assim, o amor não se cumpre nesta vida, e deve almejar a sua própria extinção: todas as outras coisas em que nos cumpriríamos foram eliminadas pela própria transgressão amorosa.» (p. 105)

«Um dos grandes admiradores de Wagner era Baudelaire, o poeta nocturno da cidade; mas o heroico não tem lugar na poesia de Baudelaire. Da mesma forma, ele também não tenta resgatar o ideal através do mito e da sua reconstituição. Para Baudelaire, tudo o que era ideal, nobre ou ético pertencia a um mundo que havia sido chamado a retirar-se. Ele foi, talvez, o primeiro artista a reconhecer o abismo que se interpôs entre a comunidade real que o artista observa e a comunidade imaginada que a sua linguagem invoca. Tomando as palavras de Eliot: "não é simplesmente com o uso de imagística da vida comum, não simplesmente com o uso de imagística da vida sórdida de uma grande metrópole, mas também com a elevação de tal imagística à máxima intensidade - apresentando-a como ela é e, contudo, fazendo-a apresentar algo que é muito mais do que ela própria - que Baudelaire criou um modo de libertação e de expressão para os outros homens". Mas as palavras "máxima intensidade" não dizem o suficiente - nem o diz o parêntese pouco convincente de Eliot. A intensidade da experiência em Baudelaire equivale a uma avaliação. Manifesta-se porque o poeta situa a experiência no contexto espiritual que desvenda o seu sentido. No meio da inconstância, Baudelaire manteve uma noção firme de pecado e do Inferno como punição para esse pecado. Este "reconhecimento da realidade do Pecado", escreve Eliot, "é uma Nova Vida; e a possibilidade de danação é um alívio tão imenso num mundo de reforma eleitoral, plebiscitos, reforma sexual e reforma do vestuário que a própria danação é uma forma imediata de salvação - de salvação do ennui da vida moderna". Mas também esta explicação é pouco convincente. Reformas e plebiscitos têm pouca ou nenhuma importância n'As Flores do Mal porque não têm impacto algum na incansável consciência observadora. Esta consciência é dominada por um sentimento de perda - não a perda do paraíso, mas a perda dessa perda, a evaporação de sonhos que já foram sagrados. O ennui da vida moderna indicia uma perturbação mais profunda - a dissipação da comunidade que deu sentido aos sacramentos.» (pp. 106-7)

«Em Baudelaire, descobrimos o mais importante projecto do modernismo: o intento de reanimar o espírito por via do ultraje. A decadência da sensualidade, a lassitude alimentada a ópio, a ferida aberta do sexo e a neblina alcoólica que tanto oculta quanto acentua o desespero - todas estas coisas são evocadas numa linguagem irrepreensível, o que as transforma em expressões do sofrimento moral, provações do espírito, tão degradantes que vêm a provar, paradoxalmente, que o espírito pertence a outro lugar. (Veja-se, por exemplo, o prefácio em verso d'As Flores do Mal, assim como o soneto intitulado "Recolhimento"). O projecto foi retomado pelos sucessores directos de Baudelaire - o mais impetuoso deles, Rimbaud - e, mais tarde, por T. S. Eliot, o primeiro escritor verdadeiramente modernista da literatura inglesa. A Terra Devastada efectua uma síntese notável.» (p. 109)

«O modernismo artístico de Eliot marcou o início de uma jornada espiritual, que só terminou quando o poeta abraçou a religião cristã, tal como foi definida, na sua modalidade excêntrica e localizada, pela doutrina e liturgia da Igreja Anglicana. Para Nietzsche, a crise da modernidade surgira devido ao declínio da fé cristã. Por outro lado, e como Nietzsche, Wagner e Baudelaire fizeram notar, a Humanidade não pode, simplesmente, viver sem fé; e, para aqueles que herdaram os costumes e noções de uma cultura cristã, essa fé deverá ser o cristianismo.» (p. 111)

«Eliot não foi o único a abordar o problema do artista moderno em termos teológicos. A mesma ideia - de que a reinvenção da tradição e a redescoberta da comunidade religiosa consistem precisamente no mesmo exercício espiritual - anima a obra de Arnold Schönberg, e foi transportada para a forma dramática na ópera inacabada Moisés e Aarão (que, apesar de tudo, acaba por reconhecer sombriamente a impossibilidade da tarefa a que o artista-sacerdote se propôs). (p. 113)

«Nada nos deve impressionar mais de que o colapso do projecto modernista quando se dá a morte do móbil religioso. O resultado foi a produção massificada e estéril de Picasso nos seus últimos anos, ou o perfeccionismo ressequido de Boulez e do seu Marteau sans maître, uma peça de museu, a última flor prensada no livro do modernismo, um memento mori sobre o qual nos detemos ocasionalmente, e que logo devolvemos, não sem melancolia, à sua sepultura.» (p. 114)

«Como demonstram os meus exemplos, o modernismo implica uma separação acentuada entre a alta cultura dos seus precursores e o sentimento religioso que ele evoca. Ao velar a sepultura da antiga religião, o modernismo reteve, ao longo dos anos, a sua dignidade sobrenatural. Mas a sepultura é cada vez menos visitada, e o movimento começa a parecer cada vez mais redundante e absurdo.» (p. 114)

«A primeira diligência do modernismo consistiu em tornar difícil a alta cultura: erguer em torno da beleza uma muralha de erudição. Este intento escondia um duplo propósito: por um lado, proteger a arte da influência do entretenimento popular; por outro lado, criar uma nova barreira, um novo obstáculo à afiliação e um novo rito de passagem para o mundo adulto e esclarecido.» (p. 117)

«A rotinização do gesto modernista deve ser integrada no seu contexto histórico - o kitsch e a aversão ao kitsch. Se olharmos para a pré-história do modernismo, descobriremos uma propensão ocasional para o sentimentalismo: observamo-lo sem reservas, por exemplo, em Murillo, Guido Reni ou Greuze. Descobrimos, também, expressões artísticas mecânicas ou assentes em clichés, como é o caso de grande parte da produção de Telemann e Vivaldi. Mas não encontramos nada, nem sequer as Estações de Vivaldi, que possa ser descrito de ânimo leve como kitsch. » (p. 122-3)

«Num dos poucos estudos que existem sobre o fenómeno, o romancista Hermann Broch sugere que não devemos falar de arte ou cultura kitsch, mas do Kitschmensch - o homem-kitsch - que habita essa cultura e, ao mesmo tempo, a determina. Isto deve fazer-nos duvidar de que a peregrinação de Eliot ainda esteja disponível. De facto, é impossível fugir ao kitsch, procurando refúgio na religião, quando a própria religião é kitsch. A "modernização" da Missa católica e do Livro de Oração anglicano foi, na verdade, um processo de kitschificação; e as intenções da arte litúrgica estão, hoje em dia, contaminadas pela mesma enfermidade.» (pp. 124-5)

«A pior coisa que pode acontecer é ser culpado de produzir kitsch involuntariamente; é melhor produzi-lo voluntariamente e, nesse caso, não será kitsch de todo, mas uma espécie de paródia sofisticada. (A intenção de produzir kitsch verdadeiro é uma intenção impossível, tal como a intenção de agir de forma não intencional.) O kitsch preventivo coloca entre aspas o kitsch verdadeiro, e espera assim preservar as suas credenciais artísticas. O dilema não é entre kitsch e vanguarda, mas sim entre kitsch e "kitsch" - o kitsch que se atreve a rir de si mesmo.» (p. 126)

 «O próprio facto de ser possível referirmo-nos a um "mercado" cultural dá testemunho da alteração de que foi alvo o empreendimento artístico na "era da reprodutibilidade técnica", como Walter Benjamin a descreveu.» (p. 131)

 O autor dedica a seguir um capítulo inteiro à "Yoofanasia", a partir de "Yoof", abreviatura de "Youth". Trata-se da cultura popular da juventude, com linguagem, costumes e território próprios.

«O intelectual francês do nosso tempo não é um descendente directo dos revolucionários de 1789, por mais que a sua maneira de ver as coisas se pareça com a deles. Ele é um produto do Partido Comunista Francês, que é, por sua vez, uma importação da Rússia. O intelectual alemão está profundamente empenhado na reacção ao Partido Nazi, que é, ele próprio, uma consequência perversa da Revolução Russa.» (pp. 163-4)

«Em Paris, os soixante-huitards fingiram que tinham colocado Gramsci na cadeira de Lenine. Mas o seu fascínio por Gramsci justificava-se apenas por verem nele uma versão saneada de Lenine, que propunha a mesma ideia do Partido como um clube exclusivo dos intelectuais, uma nova forma de afiliação, acima e além da sociedade burguesa, e dela fazendo juízo.» (p. 164)

«A posição do intelectual no mundo pós-moderno tem uma das suas instâncias mais representativas na geração que eclodiu em todo o seu esplendor depois de 1968 - esse annus mirabilis em que o espírito revolucionário, extinto na Europa durante meio século, subitamente se reergueu no meio da prosperidade e do lazer. Estes indivíduos julgaram acertadamente o momento, estavam em sintonia com o Zeitgeist e colheram a sua recompensa. Alguns deles eram sobreviventes do período entre guerras - Herbert Marcuse e Wilhelm Reich, por exemplo. Outros, como Sartre, formaram-se durante a Segunda Guerra Mundial. Outros ainda, como Theodor Roszak, na América, ou Michel Foucault, em França, eram baby boomers do pós-guerra, tendo crescido durante a Guerra Fria, mas sem conhecerem a experiência do perigo. Todos eles partilhavam uma paixão determinante, que era o ódio á burguesia e ao compromisso político por meio do qual a burguesia parecia estar sempre no poder.» (pp. 164-5)

«Com efeito, a nossa cultura comum, que cresceu no interior da ordem cosmopolita do Império Romano, sob a liderança inspirada de São Paulo (um judeu desenraizado, que era também um cidadão Romano), é, claramente, orientada para o exterior, uma cultura de mercadores, aventureiros e artesãos, de marinheiros e construtores de cidades, para quem a vida entre estrangeiros é norma.» (p. 166)

«A cultura do repúdio é, por vezes, denominada (não sem um certo desdém) como "politicamente correcto", sob o pressuposto de que os gurus académicos estão envolvidos numa espécie de exercício de lavagem cerebral, para assegurarem que nenhuma ideia política será veiculada ou admitida no campus, a não ser as do tipo liberal-igualitário. Mas, apesar desta hipótese ser interessante, duvido que tenha verdadeiramente alguma relevância para o fenómeno da cultura. As feministas, os activistas dos direitos homossexuais, os novos historicistas, os criptomarxistas, os foucauldianos e os desconstrucionistas que proliferam nos departamentos de Humanidades não têm, em regra, grande interesse nas ideias políticas dos seus alunos. Também não são homogéneos nas suas opiniões; nem são especialmente apensos à mundividência liberal-igualitária. O que os une não são as suas convicções políticas, mas um projecto comum, e este projecto deve ser entendido em termos espirituais.» (pp. 171-2)

«No seu Doutor Fausto, a obra com que se despediu da cultura ocidental, Thomas Mann traça o retrato de um compositor, derradeiro representante da arte da nossa civilização, a braços com Satanás. Adrian Leverkühn ambiciona culminar o seu trabalho artístico com uma "revogação da Nona Sinfonia" - uma negação desse grande prodígio da ideia iluminista, onde se invoca a ideia de uma irmandade universal, sem o intuito de rejeitar a antiga cultura cristã, mas tendo em vista perpetuar o seu ideal ético. O Diabo, porém, é uma criatura da religião antiga. As suas obras não podem ser entendidas, ou definidas, a não ser nos termos da cultura que ele tem a pretensão de destruir. Só se podem fazer as obras do Diabo onde o móbil religioso sobrevive. É por isso que a alta cultura da nossa civilização é o único alvo que lhe resta. As suas obras são insondáveis - e, no último capítulo, tentei traçar os contornos de uma delas. Mas as suas obras provam, também, a tese que tenho vindo a defender ao longo deste livro, nomeadamente, que a cultura tem raízes na religião, e que o verdadeiro intento de uma alta cultura é o de perpetuar a cultura comum que lhe deu origem - perpetuá-la, não como religião, mas como arte, com a vida ética transfixada pelo olhar estético.» (p. 191)

«Possuímos um conhecimento científico vasto sobre o nosso mundo, e temos assegurado o seu domínio técnico. Mas o seu sentido é-nos ocultado. Temos o conhecimento dos factos e o conhecimento dos meios, mas nenhum conhecimento dos fins. O meu propósito neste livro foi o de ilustrar esta estranha ignorância - aquela em que não ignoramos que, não ignoramos como, mas ignoramos o que.» (p. 197)

«Publicado logo após a Primeira Guerra Mundial, O Declínio do Ocidente, de Oswald Spengler, apresenta uma "morfologia comparativa" das culturas. "O Ocidente", defende Spengler, chegou ao fim, como é forçoso que aconteça em qualquer cultura. Vivemos, hoje, o período da mera "civilização", onde os assuntos administrativos e a tecnologia se sobrepõem por completo ao desabrochar estival do espírito. Spengler descreve deste modo o Iluminismo, novamente, nos termos da distinção entre Kultur e Zivilisation de Herder. A nossa cultura ascendeu ao cume da sua consciência reflexiva na época de Goethe, que lhe encapsulou o espírito no Fausto. Depois disso, segundo Spengler, soçobrou rapidamente, sendo substituída pelas rotinas álgidas de uma civilização destinada, enfim, a desintegrar-se no Nada, à medida que a sua estrutura entra em decomposição.» (p. 198)

Transcrevi algumas reflexões de Scruton que me pareceram importantes, mas só a leitura da obra permitirá ajuizar convenientemente do seu pensamento.

 

NOTA: Utilizando o livro a ortografia do AO90, fiz as transcrições segundo a correcta ortografia anterior. 

 

Sem comentários: