sexta-feira, 2 de agosto de 2019

CHATEAUBRIAND E NAPOLEÃO




O historiador, escritor e académico francês Marc Fumaroli (n. 1932) publicou agora um livro, Le Poète et l'Empereur, sobre o relacionamento de François-René de Chateaubriand com Napoleão I.

Chateaubriand (1768-1848), figura maior da literatura francesa, possuía uma certa admiração e estima por Napoleão Bonaparte (1769-1821), que foram quebradas por um trágico e inútil acontecimento: o fuzilamento do jovem duque de Enghien por ordem de Bonaparte, então ainda Primeiro Cônsul, em vésperas de se tornar Imperador, com o pretexto de que estaria envolvido numa conspiração para o assassinar. Após um julgamento sumário, cuja sentença estava pré-determinada, o duque foi executado a 21 de Março de 1804. Este acto indignou a Europa e não poderia deixar de merecer a maior reprovação de Chateaubriand que, embora até ao fim da vida se tenha mantido discretamente nostálgico de Bonaparte (eram praticamente da mesma idade), cortou todas as relações com o Imperador. A propósito deste caso, o célebre diplomata príncipe de Talleyrand disse: «C'est pire qu'un crime, c'est une faute», frase que também é atribuída a Joseph Fouché, outra figura ministerial da época, bem conhecido por ter traído todos os seus amigos, e célebre por ter atravessado incólume o conturbado período político francês, desde a Revolução, passando pelo Directório, pelo Consulado, pelo Império até à Restauração. Com o apoio de Talleyrand, ainda conseguiu, a custo, ser nomeado ministro por Luís XVIII. A propósito deste episódio, quando os dois saíram da audiência real, Talleyrand, que tinha um defeito num pé, apoiando-se em Fouché, Chateaubriand diria: «O vício apoiado sobre o crime».

Regressando à obra, Fumaroli empenha-se, sustentado nos textos do escritor, em demonstrar que perdurou o fascínio de Chateaubriand pelo génio do general, misturado com a desconfiança da megalomania deste, que julgava funesta para os homens e para a França. 

Oriundo de uma família nobre, precursor do romantismo, embaixador, membro da Academia Francesa,  Chateaubriand regressará ao catolicismo em 1799 e publicará, em 1802, Génie du christianisme e, em 1811, Itinéraire de Paris à Jerusalém (sobre a sua viagem no Mediterrâneo). A sua obra fundamental, e monumental, é, contudo Mémoires d'outre-tombe, uma espécie de autobiografia, publicada entre 1849 e 1850, a que Jean d'Ormesson chamou  "chef-d’œuvre absolu".  Nela se procede também a uma evocação da carreira do Imperador, integradora da vida de Napoleão.

Longe de pretender ser uma biografia de Chateaubriand, a breve obra de Marc Fumaroli é antes uma reflexão erudita sobre o escritor e o político, completada por dois outros textos: Chateaubriand et Rome (conferência proferida na Escola Francesa de Roma em 2001) e Chateaubriand, Goethe et les Frères Humboldt, ensaio já publicado em revista.

Estas três peças literárias, agora dadas à estampa, são um verdadeiro banho de cultura que nos é proporcionado pelo sempre admirado autor de L'État culturel


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