sexta-feira, 28 de setembro de 2012
O "SUICÍDIO" DE JEAN GENET
O escritor francês Gilles Sebhan publicou em fins de 2010 um interessante livro, Domodossola - Le suicide de Jean Genet, que adquiri na altura mas só agora tive ocasião de ler. Já lera anteriormente outra obra sua de notável oportunidade e importância, Tony Duvert - L'enfant silencieux (2010), uma homenagem póstuma a este "escritor maldito", celebrizado nos anos 70 (chegou a receber o prémio Médicis) e que, em nome do moralmente correcto, caiu no esquecimento do público e da crítica, e veio a ser encontrado pela polícia, cadáver já em estado de putrefacção, numa casa abandonada de Thoré-la-Rochette, em 20 de Agosto de 2008.
Neste novo livro, Gilles Sebhan estabelece um paralelo entre dois casos que considera semelhantes: um, o suicídio frustrado de Jean Genet, na cidade italiana de Domodossola, em 26 de Maio de 1967 (acontecimento superficialmente referido nas biografias do escritor), por ingestão imoderada de Nembutal, o seu sonífero habitual. Recorde-se que foi exactamente com Nembutal que se suicidou o seu antigo amante, o funâmbulo Abdallah, em 27 de Fevereiro de 1964.
O outro caso é o do próprio Sebhan, relativamente a uma complicada relação também com um jovem árabe, Majed, uma relação que Sebhan acabou por romper e de que não se recompôs, como provavelmente Genet não se conformara com o quase abandono a que votara Abdallah, após as sucessivas quedas deste da corda do circo, que o deixaram incapacitado para o exercício da sua arte.
Em ambos os casos, uma relação difícil com consequências, no primeiro caso fatais e no segundo, de acordo com o autor, desconhecidas. A confirmar aquilo que Frédéric Mitterrand, ex-ministro da Cultura de Sarkozy, descreveu, no seu livro La mauvaise vie, como "la tentation arabe".
Porque a análise "simultânea" dos acontecimentos demonstra um profundo conhecimento psicológico das motivações dos intervenientes, este livro de Gilles Sebhan deve ser apreciado e meditado, independentemente das opções sexuais dos seus leitores.
quinta-feira, 27 de setembro de 2012
YANNICK DJALÓ (IX)
Segundo o jornal A Bola, o jogador Yannick Djaló, que foi cedido pelo Benfica ao Toulouse, marcou um golo sensacional ao serviço do clube francês, que assim obteve uma vitória sobre o Caen, apurando-se para os oitavos-de-final da Taça da Liga Francesa.
Desejamos que faça uma excelente carreira no seu novo clube.
quarta-feira, 26 de setembro de 2012
JUSTIÇA E PAZ
Pelo seu interesse, transcrevemos o comunicado da Comissão Nacional Justiça e Paz, a propósito da Nota "Missão da Igreja num país em crise", publicada pelo Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa, em 17 deste mês:
OS NÚMEROS E AS PESSOAS
1. Em 17 do corrente mês de Setembro, o Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa publicou uma Nota sobre a "Missão da Igreja num país em crise". A Comissão Nacional Justiça e Paz deseja, antes do mais, sublinhar a relevância desse texto, que reflete a voz autorizada e oportuna da Igreja Portuguesa sobre a situação do país.
2. O início do novo ano de atividades ocorreu sob o peso esmagador das notícias da 5ª avaliação da Troika, e suas repercussões sobre a economia e as condições de vida dos portugueses. De modo geral, as medidas anunciadas situam-se à sombra dos compromissos assumidos pelo país junto das instituições credoras, com a agravante de tudo apontar para um ano de 2013 mais austero, contrariamente aos anúncios anteriores do Governo. A tónica de crítica generalizada dos comentários transmitidos pelos media é inédita, expressiva e preocupante.
3. Não é intenção da Comissão Nacional Justiça e Paz participar, com este comunicado, no debate sobre aspetos económicos e financeiros discutíveis da situação. A Comissão reconhece a importância da análise quantitativa, sobretudo quando reflete ou denuncia aspetos humanos ou sociais, e por isso mesmo não desvaloriza os efeitos positivos que podem advir da revisão dos défices públicos a respeitar em 2012, 2013 e 2014, bem como a decisão do BCE respeitante ao financiamento das dívidas soberanas.
4. Pelo que respeita às notícias veiculadas pelo Governo quanto à 5ª avaliação da Troika, a primeira nota que ressalta é a de um discurso determinista e fatalista, do «caminho único» e do «não há outra via», quando o mais verdadeiro e humilde seria o de dizer «eu não conheço outro caminho», ou «eu não sou capaz de seguir outra orientação». E note-se que algumas das vias alternativas foram fechadas pelo próprio Governo, através da total aceitação dos ditames da Troika, com pública declaração de concordância. Só aqui, reconhecendo aos credores o direito de ditar, em nome de uma «credibilidade externa», amputou o país de uns quantos graus de liberdade. Esqueceu-se que os credores não são um grupo qualquer de agiotas, mas instituições internacionais de que Portugal é membro, com deveres e direitos. Pelo menos neste contexto, seria exigível um comportamento civilizado, justo e solidário entre todas as partes.
Em segundo lugar, o Governo tentou perceber a situação do país sem nada exigir da Europa. Quando tantas vozes nacionais e internacionais autorizadas reclamavam uma atitude adequada por parte da Europa, tudo quanto vimos foi um gesto de submissão aos governantes de países mais poderosos, que bem depressa esqueceram a sua própria história no contexto europeu da segunda metade do século XX, e não perderiam em investigar sobre os verdadeiros ganhadores da União Europeia e da Zona Euro, desde que uma e outra existem. Aliás, respeitados ex-dirigentes daqueles países têm dado sinais claros de crítica à linha política dominante.
Em terceiro lugar, o Governo mostra-se crente num pensamento económico que o falhanço do défice orçamental do corrente ano deveria, no mínimo, levar a considerar como discutível. Porque se insiste em continuar a aplicá-lo, como base, no orçamento de Estado para 2013? As profundas alterações das previsões para 2013 deveriam ser mais do que suficientes para considerar seriamente outros rumos possíveis.
Em quarto lugar, o Governo nunca foi capaz de demonstrar que os sacrifícios exigidos aos portugueses estavam distribuídos com equidade. Apesar de frases sonantes nesse sentido, a política pública não tem combatido eficazmente as disparidades na distribuição do rendimento e outras formas de desigualdade na sociedade portuguesa, havendo mesmo indícios de agravamento destas desigualdades nos últimos anos. Só agora se ouviu o anúncio de que seriam sujeitos a impostos novos alguns tipos de bens e de rendimentos de capital. O contraste entre o pormenor das medidas que atingem os rendimentos do trabalho e o carácter vago e brando de algumas que irão afetar, no futuro, a riqueza e os rendimentos de capital é significativo.
O desnível das condições de vida sofrido pelas pessoas e famílias por força da crise e das políticas públicas revela um quadro socioeconómico gritantemente desigual. Enquanto a uns falta pão, casa, água e luz, outros mantêm um nível de vida praticamente igual, se não mais elevado, do que aquele
que tinham antes da crise. Está aqui um critério fundamental de equidade: não basta proporcionalidade no que se retira (por via fiscal ou outra); também é preciso que exista equidade no que resta depois disso (rendimento disponível). Esta é a medida em que as pessoas e as famílias são afetadas pela crise e medidas conexas. Isto aplica-se não apenas aos rendimentos do capital, mas também a certos estratos de rendimentos do trabalho, como são os de alguns dirigentes de empresas.
Em quinto lugar, as medidas destinadas a acorrer ao desemprego — "o maior flagelo social do país", nas palavras do Ministro de Estado e das Finanças — serão pouco eficazes perante a gravidade do problema. As reações de espanto dos responsáveis governamentais e dos membros da Troika face ao agravamento deste fenómeno denotam uma preocupante desadequação do seu pensamento económico à realidade económica do país. Exige-se de quem governa, agora como sempre, mais atenção à realidade e menos enfeudamento a ideias pré-concebidas.
Sexto, os apoiantes do Governo têm tentado ilustrar o «sucesso» da governação explicando que os objetivos da despesa foram conseguidos e só os da receita não, argumentando que só os primeiros dependem do Governo e os últimos não. A CNJP sente a obrigação de denunciar a desonestidade intelectual desta argumentação. Seria grave que o Governo abandonasse o êxito das medidas destinadas a aumentar as receitas públicas ao simples acaso. O mesmo se diga, se bem que por razões diversas, da declaração de um membro da Troika, no sentido de que o programa a que o país está sujeito é um programa do Governo português, como se a Troika não tivesse tido imposições.
Sétimo, verifica-se que o Estado de Direito vai-se enfraquecendo: a garantia dos direitos dos cidadãos vai-se fragilizando, nomeadamente no que se refere à parte contratual contributiva da Segurança Social (valor das pensões da reforma, por exemplo), e ao valor dos salários contratados. As alterações das condições contratuais por decisão unilateral prejudica o sentimento de estabilidade e segurança que qualquer Estado de Direito deve garantir aos cidadãos.
Oitavo, ao afirmar que "Até agora protegemos o nosso modo de vida, em geral, e, em particular, os mais pobres, mais vulneráveis e mais desfavorecidos destes riscos catastróficos (de bancarrota)", o Governo revela desconhecer a realidade do país. Ocorre perguntar a que país se referia o Ministro da Finanças quando pronunciou aquelas palavras. Bastará interrogar os serviços sociais, públicos e privados, para concluir que "o nosso modo de vida, em geral, e, em particular, os mais pobres, mais vulneráveis e mais desfavorecidos" está desprotegido. As instituições de solidariedade, nomeadamente as relacionadas com a Igreja Católica, vêm testemunhando essa situação de desproteção e o seu persistente agravamento
A CNJP tem consciência de que a política anunciada para 2013 carece ainda de discussão e aprovação, designadamente na Concertação Social, na Assembleia da República e pelo Presidente da República, e, eventualmente, pelo exame do Tribunal Constitucional. A CNJP espera que ao longo do processo se possam modificar os aspetos mais gravosos do quadro apresentado.
5. A preocupação da CNJP é, antes mais, de natureza ética. Por isso, não pode subestimar as graves responsabilidades dos poderes públicos, de modo particular no que respeita à equidade e aos direitos básicos de subsistência e emprego. Mas não deve ignorar, igualmente, que as responsabilidades de cada um, cidadão e cidadã, de cada grupo e de cada empresa não se restringem apenas ao que seja exigido pelo Estado. Numa situação tão grave como esta, que muitos portugueses e portuguesas atravessam, impõe-se que, para além do que se situa no âmbito da competência dos poderes públicos, cada um responda positivamente à sua própria consciência, em matéria de justiça e de solidariedade. A gravidade da situação reclama urgência na ação, mas, como sublinham os nossos Bispos, importa reconhecer que "A superação da crise supõe [também] uma renovação cultural". Tal renovação requer uma revisitação de alguns valores fundamentais, geralmente reconhecidos pela nossa sociedade, mas cuja densidade se foi perdendo com o passar do tempo: a dignidade da pessoa humana, enquanto ser individual e social; o reconhecimento de que a liberdade exige as condições existenciais para o seu exercício; o sentido do bem comum como dimensão indispensável da realização pessoal. Pelo que respeita, em particular, aos cristãos, lembramos o exemplo de Jesus Cristo, que "veio, não para ser servido, mas para servir" (Mt. 20, 28).
Lisboa, 19 de Setembro de 2012
COMISSÃO NACIONAL JUSTIÇA E PAZ
domingo, 23 de setembro de 2012
A ÚLTIMA CEIA
Clique na imagem para ver melhor |
O blogue "We Have Kaos in the Garden" tem-se distinguido, ao longo do tempo, pela apresentação de "bonecos" que revelam uma imaginação prodigiosa. É uma forma inteligente e, por vezes, irreverente, de criticar a situação política nacional e internacional.
A imagem que hoje, com a devida vénia, reproduzimos, do post da passada quinta-feira, constitui um exemplo indesmentível da arte da composição sempre presente no referido blogue.
Desejamos que o(s) seu(s) autor(es) possa(m) por muito tempo brindar-nos com tão sugestivas imagens.
sábado, 22 de setembro de 2012
BISOGNA CHE TUTTO CAMBI
Num livro famoso que o filme de Visconti imortalizou, Il Gattopardo, Giuseppe Tomasi di Lampedusa escreveu, a propósito das mudanças políticas e sociais da Itália (que ainda não o era) do século XIX: «Se vogliamo che tutto rimanga come è, bisogna che tutto cambi».
Ao consagrar no romance, en passant, esta frase que se tornou célebre, estava no espírito do grande escritor siciliano que foi o príncipe de Lampedusa a ideia de que a manutenção de uma determinada ordem social (e económica) na Itália da época dependia de modificações profundas na sociedade. Só a radical transformação (aparente) das estruturas permitiria a conservação dos privilégios ancestrais que se encontravam em perigo face à revolução que conduziria à independência do país.
Vem isto a propósito (ou a despropósito) da reunião de hoje do Conselho de Estado. Não se esperam decisões surpreendentes, tanto mais que o Conselho é um órgão consultivo do presidente da República, obviamente sem capacidade deliberativa. Não sabemos o que os conselheiros disseram ao presidente mas sabemos o que pretendia a multidão que durante horas se manteve junto ao palácio de Belém: a demissão do Governo.
Para lá da exigência da expulsão da "troika", da desistência da Taxa Social Única, do fim da austeridade e das medidas drásticas que a determinam, os milhares de pessoas que se concentraram na Praça do Império (local de saudosas tradições) e o milhão (ou quase) de pessoas que se manifestaram no sábado por todo o país o que realmente pretendem é a queda deste Governo. Não por uma birra infantil, nem mesmo por uma estrita posição ideológica, mas porque o Governo se assemelha a um navio sem rumo, possuído de uma insensibilidade social que nunca se verificou em Portugal (nem mesmo nos tempos considerados ominosos de Salazar), fiel serventuário das pretensões alemãs mas pouco preocupado, se não indiferente, às angústias da população e ao descalabro da nação, em nome da aplicação de modelos teóricos experimentais que rondam a esquizofrenia económica e política.
Notemos, num parênteses, que a larga maioria da população não está contra, embora disso não seja responsável, o pagamento das dívidas aos credores internacionais. O que pede é tempo, para que os sacrifícios sejam atenuados, e equidade, para que os sacrifícios não sejam sempre suportados pelos mesmos, isto é, uma classe média em vias de extinção.
Além do que a indignação veementemente expressa tem a ver igualmente com promessas eleitorais não cumpridas, com previsões sucessivamente falhadas, com uma real ausência de objectivos concretos susceptíveis de mobilizar a alma nacional.
É a própria Democracia que está em causa, mas isso será matéria para outra ocasião.
Não se afigura, todavia, que, nos próximos dias, o presidente da República suscite a demissão do Governo, sem necessidade ao recurso de eleições parlamentares. Seria isso, se bem interpreto Lampedusa, o "mudar tudo". E assim se poderia conservar, a bem de determinados interesses, pelo menos uma parte das medidas que afectam o povo português.
Mas se o caminho for apenas uma "pequena mudança", digamos, uma aplicação cosmética ao que existe, então creio que alguma coisa de substancial realmente mudará. Deveremos estar preparados para essa eventualidade.
quarta-feira, 19 de setembro de 2012
ASAS DA CULTURA
O embaixador da China em Lisboa inaugurou esta tarde, no Centro Científico e Cultural de Macau, e no âmbito da cooperação Portugal-China, a exposição "Asas da Cultura", promovida com o intuito de revelar o essencial da política cultural chinesa no século XXI.
Numa civilização velha de 50 séculos, a cultura chinesa renovou-se continuamente ao longo da história, absorvendo novos elementos e adoptando novos horizontes, contribuindo assim para o engrandecimento da nação.
Na China de hoje, em que após a revolução cultural de Mao Zedong ganha estatuto uma nova reforma cultural, o Estado cria infra-estruturas e serviços culturais para o grande público, promove o florescimento de indústrias culturais e impulsiona a criatividade nas artes, na literatura, no design, etc. Aplica também novas tecnologias e incentiva a inovação cultural e o diálogo intercultural e também o aprofundamento das trocas com as outras partes do mundo.
Tudo isto, sem esquecer a ópera tradicional chinesa, as inscrições a tinta no papel e na pedra e as porcelanas, já multiseculares.
Devem-se aos chineses algumas das grandes invenções da história da humanidade e sendo Portugal o país ocidental que mantém relações com a China desde o século XVI, importa fortalecer os laços entre os dois povos até porque, bem no fundo, teremos mais afinidades com os chineses, embora a nossa herança cultural seja mais recente, de que com países que possuem apenas 200 anos de história.
terça-feira, 18 de setembro de 2012
SANTIAGO CARRILLO
Segundo informa EL PAÍS, Santiago Carrillo, secretário-geral do Partido Comunista Espanhol de 1960 a 1982, morreu hoje em Madrid, com 97 anos.
Inscrevendo-se nas Juventudes Socialistas em 1928 (com 13 anos), filiou-se em 1936 no Partido Comunista. Preso e exilado várias vezes, regressou a Espanha depois da morte de Franco em 1975 e passou a chefiar o PCE na legalidade. Sucedeu no cargo de secretário-geral a Dolores Ibárruri, "La Pasionaria", que dirigia o Partido desde 1942.
Adepto de uma linha estalinista, que o levou à adopção de medidas duras no seio do Partido, opôs-se todavia à invasão da Checoslováquia em 1968, afastando-se de Brejnev. Em ligação com o líder do Partido Comunista Italiano, Enrico Berlinguer, propôs uma nova actuação dos partidos comunistas europeus, sob a designação de "euro-comunismo".
O seu papel na Espanha pós-Franco foi decisivo para uma certa pacificação, tendo, conjuntamente com o primeiro-ministro Adolfo Suárez e o secretário-geral do PSOE, Felipe González, apelado à "reconciliação nacional" dos espanhóis. Reconheceu igualmente o regime monárquico.
Depois de ter abandonado o PCE, fundou um novo partido em 1985, a Mesa para la Unidad de los Comunistas.
Em 2005 foi-lhe atribuído o grau de doutor honoris causa pela Universidad Autónoma de Madrid.
Com a morte de Santiago Carrillo desaparece um dos últimos líderes históricos do comunismo europeu.
domingo, 16 de setembro de 2012
VOTÁMOS, E DEPOIS ?
Olivier Besancenot (n. 1974), político e sindicalista francês, que foi candidato em 2007 às eleições presidenciais pela Ligue Communiste Révolutionnaire (LCR), tendo obtido 1,5 milhões de votos (4,08%), acabou de publicar um livro, On a voté...Et puis après?, cujo título é parafraseado de uma canção de Léo Ferré: "Ils ont voté et puis après?".
A propósito desta edição, Besancenot, que se distinguiu por exercer a profissão de carteiro quando possuía uma licenciatura em História pela Universidade de Paris X (Nanterre), e ficou conhecido pelo Carteiro Vermelho, alcunha que a direita lhe colocou, foi entrevistado pelo "Nouvel Observateur" (nº 2496 - 12/09/2012), tendo tecido interessantes considerações sobre a política francesa após a eleição de François Hollande, sobre o Front de Gauche e sobre o partido que fundou em 2008, o NPA (Nouveau Parti Anticapitaliste).
Nesta entrevista, Besancenot coloca a hipótese de a "esquerda social" vir a ocupar o espaço circundante do Senado e da Assembleia Nacional, como forma de protesto contra o Tratado Orçamental Europeu.
sábado, 15 de setembro de 2012
UM MILHÃO DE PESSOAS NA RUA
Segundo os dados da comunicação social, parece que o número de manifestantes que desceu hoje à rua, nas várias localidades de Portugal, foi de cerca de um milhão. Assim sendo, ocorreu uma das maiores manifestações jamais realizadas no nosso país, em que se contestou a política de austeridade do Governo em funções.
Não tendo sido convocada por qualquer partido político ou organização sindical, é natural que as reivindicações apresentadas tenham sido distintas. A unanimidade centrou-se no protesto contra as medidas anunciadas pelo Governo a acrescentar às já anteriormente decretadas e cuja repercussão negativa se tem feito sentir ao longo dos últimos meses.
Há quem seja de opinião que se deva pura e simplesmente não pagar a dívida existente e quem entenda que deve ser paga, mas "em prestações suaves". Há quem admita que os sacrifícios presentemente exigidos são indispensáveis mas que a sua repartição, por demasiado injusta, não é admissível, na linha, aliás, do que já foi dito e repetido pelo presidente da República. Isto é, a contestação é matizada, embora conflua num ponto: as coisas não podem ficar como estão.
Curiosamente, não são apenas os partidos da oposição que protestam face ao "pacote governamental". A incomodidade verificada no seio da "maioria", no próprio parceiro da coligação governamental e mesmo no chefe do Estado permite pensar que as medidas de austeridade anunciadas o foram levianamente, baseadas em modelos teóricos e sem qualquer preocupação com a realidade, sem qualquer aderência ao tecido social.
Espera-se, assim, que possa sair da próxima reunião do Conselho de Estado algum fumo branco que conduza a um emendar de mão relativamente aos sacrifícios adicionais que nos vão ser exigidos e que foram divulgados com uma insensibilidade assustadora. Se estes novos sacrifícios são indispensáveis (e não estamos certos) que se façam, mas com uma distribuição equitativa e não para satisfazer os preconceitos ideológicos de alguns governantes. Porque há sempre o perigo de uma ruptura social, e então tudo será pior. Pior para todos.
QUEM É O RESPONSÁVEL PELO FILME ?
Curiosamente, não se conhecem ainda os nomes do produtor e do realizador do filme The Innocence of Muslims, que está a provocar grande controvérsia e agitação no mundo árabe. Circulam diversas versões na imprensa americana sobre a autoria, como relata o PÚBLICO, e "The New York Times" dá-nos conta dos violentos protestos na maioria dos países árabes.
Parece que os verdadeiros responsáveis são fundamentalistas cristãos norte-americanos, que resolveram apresentar uma visão obscena da vida do profeta Maomé na pior das oportunidades. A divulgação do filme nesta altura poderá não ter sido inocente, já que se aproximam as eleições presidenciais americanas e que os confrontos no mundo islâmico embaraçam a actual administração em Washington.
Aguardam-se os resultados das investigações que o Departamento de Estado está agora a realizar.
sexta-feira, 14 de setembro de 2012
OS BISPOS NÃO VÃO FICAR EM SILÊNCIO
«Os bispos não vão ficar em silêncio» perante os sacrifícios que estão a ser pedidos aos portugueses, declarou hoje o cardeal-patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, segunda informa o PÚBLICO. Aquele purpurado mostrou-se muito preocupado com a situação do país, à chegada à cerimónia da entrega do prémio Champalimaud 2012.
quinta-feira, 13 de setembro de 2012
O ATAQUE DE BENGHAZI
O ataque de ontem ao consulado americano em Benghazi (na Líbia), em que morreu o próprio embaixador que ali se encontrava de visita (no lugar errado à hora errada), o assalto à embaixada americana no Cairo, onde os salafistas arrearam a bandeira dos EUA e a substituíram pela da Al-Qaeda, a progressão do conflito na Síria, a islamização da Tunísia, os misteriosos incêndios em duas fábricas no Paquistão (em Karachi e em Lahore) que provocaram mais de 300 mortos, o atentado em Mogadishu contra o presidente da Somália, constituem iniludíveis factos da deterioração da situação no mundo árabo-islâmico.
A pouco e pouco tudo se desmorona. Após algumas décadas de relativa estabilidade (naturalmente perturbada pelo interminável conflito israelo-palestiniano e pelos confrontos no Líbano), o mundo árabe e o mundo islâmico em geral entraram em progressiva turbulência. Depois do ataque ao Afeganistão e sobretudo depois da malfadada invasão do Iraque não mais houve paz na região. A ilusão, tão acarinhada, da Primavera Árabe converteu-se num pesadelo de que o Ocidente não despertará tão cedo e do qual os próprios árabes serão os primeiros a arrepender-se.
A crise que actualmente se vive tem raízes profundas que não foram devidamente avaliadas em tempo oportuno. Talvez nem pudesse ter sido evitada, face à globalização planetária, mas também nada se tentou, muito pelo contrário. Agora, é tarde.
quarta-feira, 12 de setembro de 2012
SECESSÃO DA CATALUNHA ?
A manifestação de ontem em Barcelona, que, segundo o EL PAÍS, reuniu mais de um milhão de pessoas, constituiu uma prova exuberante da progressiva tendência independentista da Catalunha.
Perante a crise que afecta a Espanha, aquela comunidade autónoma reivindica a sua separação da monarquia e a sua dissociação das medidas de austeridade impostas ao país pelo governo de Mariano Rajoy.
A grandiosidade da manifestação não deve surpreender, já que neste clima de desagregação da Europa é perfeitamente natural que também as regiões com características específicas se comecem a desligar dos países que integram.
O sinal do fim de um certo tempo que os dirigentes europeus, por mediocridade intelectual, miopia política ou refinado cinismo se recusam a encarar.
segunda-feira, 10 de setembro de 2012
CARTA ABERTA AO PRIMEIRO-MINISTRO
O escritor Eugénio Lisboa, professor catedrático e doutor honoris causa de várias universidades e antigo conselheiro cultural da Embaixada de Portugal em Londres, enviou ao primeiro-ministro de Portugal, Passos Coelho, a Carta Aberta que, pela sua importância, se publica abaixo:
CARTA ABERTA AO PRIMEIRO-MINISTRO DE PORTUGAL
Exmo. Senhor Primeiro Ministro
Hesitei muito em dirigir-lhe estas palavras, que mais não dão do que uma pálida ideia da onda de indignação que varre o país, de norte a sul, e de leste a oeste. Além do mais, não é meu costume nem vocação escrever coisas de cariz político, mais me inclinando para o pelouro cultural. Mas há momentos em que, mesmo que não vamos nós ao encontro da política, vem ela, irresistivelmente, ao nosso encontro. E, então, não há que fugir-lhe.
Para ser inteiramente franco, escrevo-lhe, não tanto por acreditar que vá ter em V. Exa. qualquer efeito – todo o vosso comportamento, neste primeiro ano de governo, traindo, inescrupulosamente, todas as promessas feitas em campanha eleitoral, não convida à esperança numa reviravolta! – mas, antes, para ficar de bem com a minha consciência. Tenho 82 anos e pouco me restará de vida, o que significa que, a mim, já pouco mal poderá infligir V. Exa. e o algum que me inflija será sempre de curta duração. É aquilo a que costumo chamar “as vantagens do túmulo” ou, se preferir, a coragem que dá a proximidade do túmulo. Tanto o que me dê como o que me tire será sempre de curta duração. Não será, pois, de mim que falo, mesmo quando use, na frase, o “odioso eu”, a que aludia Pascal.
Mas tenho, como disse, 82 anos e, portanto, uma alongada e bem vivida experiência da velhice – da minha e da dos meus amigos e familiares. A velhice é um pouco – ou é muito – a experiência de uma contínua e ininterrupta perda de poderes. “Desistir é a derradeira tragédia”, disse um escritor pouco conhecido. Desistir é aquilo que vão fazendo, sem cessar, os que envelhecem. Desistir, palavra horrível. Estamos no verão, no momento em que escrevo isto, e acorrem-me as palavras tremendas de um grande poeta inglês do século XX (Eliot): “Um velho, num mês de secura”... A velhice, encarquilhando-se, no meio da desolação e da secura. É para isto que servem os poetas: para encontrarem, em poucas palavras, a medalha eficaz e definitiva para uma situação, uma visão, uma emoção ou uma ideia.
A velhice, Senhor Primeiro Ministro,
é, com as dores que arrasta – as físicas, as emotivas e as morais – um período
bem difícil de atravessar. Já alguém a definiu como o departamento dos doentes
externos do Purgatório. E uma grande contista da Nova Zelândia, que dava pelo
nome de Katherine Mansfield, com a afinada sensibilidade e sabedoria da vida,
de que V. Exa. e o seu governo parecem ter défice, observou, num dos contos
singulares do seu belíssimo livro intitulado “The Garden Party”: “O velho Sr. Neave achava-se demasiado velho
para a primavera.” Ser velho é também isto: acharmos que a primavera já não é
para nós, que não temos direito a ela, que estamos a mais, dentro dela... Já
foi nossa, já, de certo modo, nos definiu. Hoje, não. Hoje, sentimos que já não
interessamos, que, até, incomodamos.
Todo o discurso político de V. Exas., os do governo, todas as vossas decisões apontam na mesma direcção: mandar-nos para o cimo da montanha, embrulhados em metade de uma velha manta, à espera de que o urso lendário (ou o frio) venha tomar conta de nós. Cortam-nos tudo, o conforto, o direito de nos sentirmos, não digo amados (seria muito), mas, de algum modo, utilizáveis: sempre temos umas pitadas de sabedoria caseira a propiciar aos mais estouvados e impulsivos da nova casta que nos assola. Mas não. Pessoas, como eu, estiveram, até depois dos 65 anos, sem gastar um tostão ao Estado, com a sua saúde ou com a falta dela. Sempre, no entanto, descontando uma fatia pesada do seu salário, para uma ADSE, que talvez nos fosse útil, num período de necessidade, que se foi desejando longínquo.
Chegado, já sobre o tarde, o momento de alguma necessidade, tudo nos é retirado, sem uma atenção, pequena que fosse, ao contrato anteriormente firmado. É quando mais necessitamos, para lutar contra a doença, contra a dor e contra o isolamento gradativamente crescente, que nos constituímos em alvo favorito do tiroteio fiscal: subsídios (que não passavam de uma forma de disfarçar a incompetência salarial), comparticipações nos custos da saúde, actualizações salariais – tudo pela borda fora. Incluindo, também, esse papel embaraçoso que é a Constituição, particularmente odiada por estes novos fundibulários. O que é preciso é salvar os ricos, os bancos, que andaram a brincar à Dona Branca com o nosso dinheiro e as empresas de tubarões, que enriquecem sem arriscar um cabelo, em simbiose sinistra com um Estado que dá o que não é dele e paga o que diz não ter,para que eles enriqueçam mais, passando a fruir o que também não é deles, porque até é nosso.
Todo o discurso político de V. Exas., os do governo, todas as vossas decisões apontam na mesma direcção: mandar-nos para o cimo da montanha, embrulhados em metade de uma velha manta, à espera de que o urso lendário (ou o frio) venha tomar conta de nós. Cortam-nos tudo, o conforto, o direito de nos sentirmos, não digo amados (seria muito), mas, de algum modo, utilizáveis: sempre temos umas pitadas de sabedoria caseira a propiciar aos mais estouvados e impulsivos da nova casta que nos assola. Mas não. Pessoas, como eu, estiveram, até depois dos 65 anos, sem gastar um tostão ao Estado, com a sua saúde ou com a falta dela. Sempre, no entanto, descontando uma fatia pesada do seu salário, para uma ADSE, que talvez nos fosse útil, num período de necessidade, que se foi desejando longínquo.
Chegado, já sobre o tarde, o momento de alguma necessidade, tudo nos é retirado, sem uma atenção, pequena que fosse, ao contrato anteriormente firmado. É quando mais necessitamos, para lutar contra a doença, contra a dor e contra o isolamento gradativamente crescente, que nos constituímos em alvo favorito do tiroteio fiscal: subsídios (que não passavam de uma forma de disfarçar a incompetência salarial), comparticipações nos custos da saúde, actualizações salariais – tudo pela borda fora. Incluindo, também, esse papel embaraçoso que é a Constituição, particularmente odiada por estes novos fundibulários. O que é preciso é salvar os ricos, os bancos, que andaram a brincar à Dona Branca com o nosso dinheiro e as empresas de tubarões, que enriquecem sem arriscar um cabelo, em simbiose sinistra com um Estado que dá o que não é dele e paga o que diz não ter,para que eles enriqueçam mais, passando a fruir o que também não é deles, porque até é nosso.
Já alguém, aludindo à mesma falta de sensibilidade de que V. Exa. dá provas, em relação à velhice e aos seus poderes decrescentes e mal apoiados, sugeriu, com humor ferino, que se atirassem os velhos e os reformados para asilos desguarnecidos , situados, de preferência, em andares altos de prédios muito altos: de um 14.º andar, explicava, a desolação que se contempla até passa por paisagem. V. Exa. e os do seu governo exibem uma sensibilidade muito, mas mesmo muito, neste gosto. V. Exas. transformam a velhice num crime punível pela medida grande. As políticas radicais de V. Exa. e do seu robótico Ministro das Finanças - sim, porque a Troika informou que as políticas são vossas e não deles... – têm levado a isto: a uma total anestesia das antenas sociais ou simplesmente humanas, que caracterizam aqueles grandes políticos e estadistas que a História não confina a míseras notas de pé de página.
Falei da velhice porque é o pelouro que, de momento, tenho mais à mão. Mas o sofrimento devastador, que o fundamentalismo ideológico de V. Exa. está desencadear pelo país fora, afecta muito mais do que a fatia dos velhos e reformados. Jovens sem emprego e sem futuro à vista, homens e mulheres de todas as idades e de todos os caminhos da vida – tudo é queimado no altar ideológico onde arde a chama de um dogma cego à fria realidade dos factos e dos resultados. Dizia Joan Ruddock não acreditar que radicalismo e bom senso fossem incompatíveis. V. Exa. e o seu governo provam que o são: não há forma de conviverem pacificamente. Nisto, estou muito de acordo com a sensatez do antigo ministro conservador inglês, Francis Pym, que teve a ousadia de avisar a Primeira Ministra Margaret Thatcher (uma expoente do extremismo neoliberal), nestes termos: “Extremismo e conservantismo são termos contraditórios”. Pym pagou, é claro, a factura: se a memória me não engana, foi o primeiro membro do primeiro governo de Thatcher a ser despedido, sem apelo nem agravo. A “conservadora” Margaret Thatcher – como o “conservador” Passos Coelho – quis misturar água com azeite, isto é, conservantismo e extremismo. Claro que não dá.
Alguém observava que os americanos ficavam muito admirados quando se sabiam odiados. É possível que, no governo e no partido a que V. Exa. preside, a maior parte dos seus constituintes não se aperceba bem (ou, apercebendo-se, não compreenda), de que lavra, no país, um grande incêndio de ressentimento e ódio. Darei a V. Exa. – e com isto termino – uma pista para um bom entendimento do que se está a passar. Atribuíram-se ao Papa Gregório VII estas palavras: ”Eu amei a justiça e odiei a iniquidade: por isso, morro no exílio.” Uma grande parte da população portuguesa, hoje, sente-se exilada no seu próprio país, pelo delito de pedir mais justiça e mais equidade. Tanto uma como outra se fazem, cada dia, mais invisíveis. Há nisto, é claro, um perigo.
De V. Exa., atentamente,
Eugénio LisboaA MACHADADA FINAL
Em declarações ao jornal "i", Bagão Félix, antigo ministro (da área do CDS-PP) e conselheiro de Estado afirma que "foi dada «a machadada final» no regime previdencial", em consequência das medidas anunciadas por Passos Coelho na passada sexta-feira.
Dada a importância destas declarações, que se somam a muitas outras no mesmo sentido, proferidas por políticos relevantes da esfera dos partidos do Governo, transcrevemos a notícia:
O antigo governante Bagão Félix considera que, com a decisão do Executivo de promover o aumento da contribuição dos trabalhadores para a Segurança Social, quando há uma redução dos benefícios existentes, foi dada "a machadada final" no regime previdencial.
"Acho que se deu a machadada final no regime previdencial. Não estou a dizer na Segurança Social, estou a dizer no regime previdencial, que é aquele em que há uma relação direta entre o esforço que os trabalhadores fazem e os benefícios que têm", afirmou hoje à agência Lusa o conselheiro de Estado, apontando o caso das pensões e dos subsídios de desemprego e doença, que têm vindo a ser reduzidos.
"E porquê? Porque os benefícios decrescem, mas há um aumento de sete pontos percentuais no desconto do trabalhador", justificou.
Na sua opinião, o desconto feito pelos trabalhadores para a Segurança Social, "no fundo, não é uma taxa. É um verdadeiro imposto. Deixou de ser uma contribuição [para um seguro] social para ser um imposto único".
Quanto à descida dos encargos das empresas para a Segurança Social, o antigo ministro das Finanças e da Solidariedade Social realçou que a mesma "já estava prevista no memorando de entendimento com a 'troika'", mas entende que a diminuição de 23,75 por cento para 18 por cento "não vai trazer grandes benefícios ao nível da geração de emprego" em Portugal.
"Não é por causa desta diminuição que vai haver um aumento de contratações. O que vai acontecer é que estas medidas, que diminuem o rendimento disponível das famílias, vão diminuir o consumo e, diminuindo o consumo, provavelmente é atacada a saúde das empresas e o desemprego tenderá a subir", concluiu.
Passos Coelho anunciou na sexta-feira um aumento de 11 para 18 por cento da contribuição para a Segurança Social dos trabalhadores dos setores público e privado e a redução de 23,75 para 18 por cento da contribuição das empresas.
Com as novas medidas de austeridade os funcionários públicos continuam a perder o equivalente ao subsídio de natal e de férias, cuja suspensão tinha sido considerada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional.
Para os funcionários do setor privado, o aumento da comparticipação para a Segurança Social equivalerá à perda de um salário por ano. Os pensionistas continuaram sem subsídios de natal e férias.
O primeiro-ministro falava numa declaração ao país a partir da residência oficial em São Bento, numa altura em que a quinta avaliação pela 'troika' do Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF) se encontra perto do fim.
*Este artigo foi escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico
sexta-feira, 7 de setembro de 2012
FOI VOCÊ QUE PEDIU UMA PRIMAVERA ÁRABE ?
As revoltas contra alguns regimes ditatoriais do mundo árabe, iniciadas no fim de 2010 na Tunísia e que alastraram ao Egipto, à Líbia, ao Iémen, ao Bahrein e à Síria, e provocaram contestações em outros países, tornaram-se conhecidas como "Primavera Árabe" e foram saudadas com entusiasmo (porventura excessivo) pela chamada comunidade internacional.
Importa notar que a falta de liberdade nesses países, a corrupção, as gritantes desigualdades económicas e sociais, a permanência no poder de líderes tornados vitalícios, a ausência dos mais elementares mecanismos de democracia representativa (salvo a fachada, em alguns casos), justificaram o aplauso e mesmo o apoio do mundo dito democrático às populações revoltadas.
Tiveram os levantamentos populares êxito rápido na Tunísia e no Egipto, onde os respectivos exércitos declinaram continuar a sustentar os regimes, mas na Líbia foi necessária uma intervenção internacional para provocar a queda da ditadura. No Iémen, após muitos confrontos, o presidente resignou e no Bahrein o exército saudita, a pedido do rei, esmagou a revolução. Na Síria, prossegue uma guerra civil, que já provocou milhares de mortos, sendo que os opositores do regime não são apenas sírios mas também (e maioritariamente) mercenários estrangeiros ao serviço de outros interesses.
Contas feitas, esperava muita gente que os novos governantes promovessem a instauração de regimes se não verdadeiramente democráticos, pelo menos tão democráticos quanto o conceito do mundo ocidental. Puro engano. Debrucemo-nos sobre a Tunísia e o Egipto, já que na Líbia e no Iémen a situação é ainda confusa. Realizadas eleições, consideradas mais ou menos livres, optaram maioritariamente os cidadãos por dar o seu voto aos partidos "religiosos", mais pelo facto desses partidos, enquanto na total ou semi-clandestinidade, desenvolverem uma acção social que os governos haviam descurado do que propriamente por convicções religiosas profundas. E o que está a acontecer agora? Instalados no poder, partidos como o Ennahda na Tunísia ou os Irmãos Muçulmanos (e seus aliados salafistas do partido An-Nur) no Egipto começaram a desenvolver uma política de acordo com os princípios religiosos que defendem, política que nada tem de democrático, e ainda a procissão vai no adro.
Mesmo que formalmente estejam a ser seguidas as regras da democracia representativa, começam a verificar-se casos de violência ou de constrangimento que nada auguram de bom. Ainda a semana passada, Jamel Gharbi, conselheiro regional da Sarthe (em França), foi violentamente atacado em Bizerta (Tunísia) por um gang salafista, perante a inércia das forças da ordem. Num país em que a maioria das mulheres (pelo menos nas cidades) usava cabeça descoberta, são as mesmas agora pressionadas a cobrir a cabeça com véu. A república laica de Bourguiba corre os maiores perigos e ainda não foi promulgada a nova Constituição. No Egipto, a televisão nacional autorizou igualmente às apresentadoras o uso do véu nas emissões, que era proibido desde a proclamação da república. Não que venha mal ao mundo pelo facto das apresentadoras usarem o hijab, mas o que se receia é que a partir da autorização venha a imposição. Também na Tunísia está em causa o estatuto da igualdade homem/mulher, que vem dos tempos de Bourguiba. Assim como, no país do jasmim, os obscurantistas religiosos, através da violência, tentam proibir todas as manifestações culturais que não estejam de acordo com os seus preconceitos, num incrível atentado contra uma vida intelectual e artística das mais avançadas do mundo árabe. O novo presidente egípcio, que já demitiu os mais altos comandos militares, tradicionais garantes de uma relativa igualdade entre muçulmanos e coptas (mais de 10% da população do país), apoia agora a contestação ao regime laico sírio de Bashar Al-Assad e fecha os olhos à repressão saudita no Bahrein.
Assistimos, assim, à progressiva instauração de uma ordem islâmica em países conhecidos pela sua abertura e tradições pacíficas. Aquilo a que Laurent Joffrin, nas páginas do Nouvel Observateur, denunciou como FASCISMO VERDE. Para que serviram então as revoluções contra as ditaduras, certamente corruptas e despóticas, se no seu lugar se instalam outras, embora de cariz diferente? Para que serviu a Primavera Árabe, que tanto excitou o mundo ocidental?
Curiosamente, ou não, na Arábia Saudita e nas petromonarquias do Golfo, os regimes mais totalitários do mundo árabe, não se passa (pelo menos aparentemente) nada. Nem os Estados Unidos e a Europa se preocupam minimamente.
Muitos dos que combateram os regimes de Ben Ali e Mubarak, e que, felizmente, não perderam a vida durante os violentos confrontos que os opuseram às forças policiais daqueles governantes, interrogam-se hoje se terá valido a pena tão frontal, arriscado e perigoso combate. Vive-se hoje, pelo menos do ponto de vista económico e social, muito pior na Tunísia e no Egipto do que no tempo dos ditadores depostos. Quanto mais não seja pela ausência de turismo, uma das importantes fontes de receita daqueles países, e também de investimento.
As ditaduras não são boas (embora algumas possam ser melhores do que certas democracias de fachada). Mas a ter de escolher-se entre uma ditadura laica e uma ditadura religiosa, parece-me não oferecer dúvidas de que se deve escolher a ditadura laica.
quarta-feira, 5 de setembro de 2012
O ESCÂNDALO MILLET
Reina grande agitação nos meios literários (e não só) franceses, após a publicação há pouco mais de uma semana de dois livros do escritor Richard Millet, membro do Conselho de Leitura da prestigiadíssima editora Gallimard: Langue fantôme: Essai sur la paupérisation de la littérature suivi de Éloge littéraire d'Anders Breivik e De l'antiracisme comme terreur littéraire.
Não sendo propriamente Richard Millet um escritor menor (leia-se sobre a matéria o texto de Pierre Assouline no seu blogue La République des livres), e descontando o que nos dois livros possa ser considerado como provocação ou exibicionismo, importa proceder à sua leitura com serenidade e espírito crítico. E perguntar se Millet estará sozinho (claro que não está) nas teses que defende, ou se, pelo contrário, haverá já muita gente, no chamado mundo ocidental, que perfilhe as suas ideias, ou que, no mínimo, se interrogue quanto à bondade das mesmas.
Naturalmente que o racismo, que Millet sustenta ao condenar o antiracismo (mesmo como terror literário) é repugnante. E que o elogio, ainda que literário, de Anders Breivik, responsável pelo assassínio de 77 pessoas em Oslo, em Julho do ano passado, só pode merecer condenação. É certo que Millet não aprova o crime, mas entende que o gesto convidou a uma meditação sobre a decadência da Europa e que as jovens vítimas «eram futuros colaboradores do nihilismo multicultural».
Que a Europa se encontra em profunda decadência parece evidente, mas não é exactamente pelas razões invocadas por Millet, como por exemplo os minaretes das mesquitas e os best-sellers anglo-saxónicos. A questão do multiculturalismo é suficientemente complexa para poder ser tratada neste espaço, mas deverá perguntar-se se a presença dos árabes (e dos negros) na Europa durante décadas provocou algum sobressalto cívico. O que começou a agitar os muçulmanos do Velho Continente foi a política ocidental em relação aos países islâmicos. Importa recordar o livro de Huntington (possivelmente uma encomenda) sobre o choque de civilizações, e também as guerras do Golfo, a invasão do Afeganistão e do Iraque e tudo o mais que não cabe aqui citar. Já quanto aos best-sellers, talvez Millet tenha alguma razão, uma vez que dos livros aos filmes e à televisão, o que provém do mundo anglo-saxónico é, em grande parte, uma incitação à violência.
Porque o assunto não constitui um fait-divers, como o futuro se encarregará de demonstrar, voltaremos oportunamente a este tema.
segunda-feira, 3 de setembro de 2012
BLAIR E BUSH NO T.P.I.
Escrevendo em "The Observer", o arcebispo sul-africano Desmond Tutu, Prémio Nobel da Paz e herói do movimento anti-apartheid, acusa Tony Blair e George Bush de terem mentido sobre as armas de destruição maciça no Iraque, de promoverem a devastação daquele país e de terem "deixado o mundo mais desestabilizado e dividido do que qualquer outro conflito na história".
Segundo Tutu, o derrube de Saddam Hussein no Iraque criou as condições para a guerra civil na Síria e para a possibilidade de um conflito generalizado no Médio Oriente envolvendo o Irão.
Considerando o número de mortos durante e após a guerra no Iraque, para além da destruição do país e do sofrimento da população, Desmond Tutu entende que tal é motivo bastante para que Bush e Blair sejam julgados pelo Tribunal Penal Internacional da Haia, uma vez que dirigentes de outros países, com muito menos responsabilidades, foram presentes àquela instituição para serem julgados por genocídio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade
O texto do jornal, que deve ser lido e meditado, é um notável libelo acusatório contra o ex-presidente dos Estados Unidos, George Bush e o ex-primeiro-ministro britânico, Tony Blair, que continuam a passear-se (pelo menos o segundo) pelo mundo, indiferentes às tragédias que desencadearam.
domingo, 2 de setembro de 2012
A GUERRA NA SÍRIA
A propósito da guerra na Síria, publica o jornal PÚBLICO um artigo da autoria de Jaswant Singh, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e da Defesa da União Indiana, intitulado "O Significado da Síria", e no qual se tecem considerações pertinentes sobre o que está em jogo no conflito que se verifica naquele país.
Pelo relevante interesse da análise, transcrevemos alguns parágrafos:
«Em primeiro lugar, tentemos desenlear parte do emaranhado de ironias e contradições que estão a dificultar os esforços para acabar com a violência na Síria. Apesar de negar liberdade política aos seus cidadãos, no que diz respeito à liberdade social a Síria é bastante mais tolerante do que muitos outros países árabes, especialmente a Arábia Saudita, que lidera a investida para derrubar Assad. Governada por uma minoria de alauítas (uma seita xiita), a Síria alberga um conjunto de grupos diferentes: árabes, arménios, cristãos, curdos, drusos, ismaelitas e beduínos.»
«No seu livro intitulado A Peace to End all Peace [A Paz para Acabar com Toda a Paz, ndt], sobre a história do mundo árabe no rescaldo da Primeira Guerra Mundial, David Fromkin refere que actualmente o Médio Oriente reflecte o fracasso das potências europeias na consolidação dos sistemas políticos por elas impostos. A Grã-Bretanha e os seus aliados "arruinaram a velha ordem", destruindo o domínio turco da língua árabe no Médio Oriente. Mas depois "criaram países, nomearam governantes, delinearam fronteiras [e introduziram] um sistema de Estado" que viria a tornar-se inoperante.»
O livro referido é de importância capital para a compreensão da situação no Médio Oriente.
«Em Agosto de 1919, o ministro britânico dos Negócios Estrangeiros, Arthur Balfour, resumiu a essência do problema com o qual se confrontam actualmente os responsáveis políticos. "A infeliz verdade", escreveu, "é que a França, a Inglaterra e os Estados Unidos estão... tão inextricavelmente confusos que nenhuma... resposta satisfatória é possível neste momento."»
Não se deve esquecer que Lord Balfour foi o responsável pela Declaração que levou à criação de Israel em território palestiniano.
«A combinação de receios étnicos e confessionais e de rivalidades, memórias históricas e cegueira deliberada entre os poderes externos parece estar predestinada a desestabilizar novamente todo o Médio Oriente. A Turquia está novamente a expandir-se, embora ainda com dificuldades; o Iraque foi invadido e abandonado; o Irão está isolado e em risco, Israel está em estado de ansiedade e beligerante e o Afeganistão e o Paquistão têm uma situação interna desequilibrada e uma política fragilizada.Na verdade, o grande arco que se estende do Cairo ao Hindu Kush ameaça tornar-se o centro da desordem global. Não é de admirar que o enviado iraniano, Saeed Jalili, tenha anunciado, após uma reunião que teve recentemente com Assad em Damasco, que "o Irão não permitirá de modo algum que o eixo de resistência, do qual a Síria é considerada um pilar fundamental, seja quebrado".»
A actuação do novo presidente do Egipto, Morsi, só poderá contribuir para a referida desordem global.
«Como afirmou sabiamente Michael Ignatiev a crise da Síria revelou que este é "o momento em que o Ocidente deveria perceber que o mundo se dividiu realmente em dois. A Rússia e a China enfrentam uma aliança fraca de democracias capitalistas lutadoras". Os interesses nacionais dos países ocidentais deixarão de determinar os impulsos morais e políticos da comunidade global actual. Na verdade, seja qual for o resultado, o tormento da Síria evidenciou um enfraquecimento maior e irreversível do papel de domínio global do Ocidente.»
O tempo se encarregará de demonstrar de que lado está a razão, mas nessa altura só poderemos dizer: "É tarde".
sábado, 1 de setembro de 2012
PEIXE COM PÉNIS NA CABEÇA
Foi apanhado no delta do Mekong, no Vietname, um peixe estranho, vindo posteriormente a verificar-se que tinha o pénis na cabeça.
Segundo o PÚBLICO, desde que em 2009 foi recolhido pela primeira vez um peixe deste tipo, foram apanhados até agora nove exemplares.
É pena que esta característica não seja compartilhada pelos seres humanos pois evitavam-se muitas decepções.
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