sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

A VIOLÊNCIA NA SÍRIA


Prossegue a violência na Síria. Esta manhã, em Aleppo, a segunda cidade do país,a explosão de dois carros armadilhados, um junto a um edifício de informações militares e outro frente a um quartel das forças de segurança, provocaram, segundo a Al Jazira, 28 mortos e 235 feridos.



Um representante do auto-denominado Exército Sírio Livre declarou que nos ataques levados a cabo contra aquelas instalações tinham sido usadas apenas armas ligeiras e que o morticínio era uma encenação do regime, o que é difícil de acreditar, a menos que as autoridades soubessem da investida dos revoltosos para lá colocarem à mesma hora os carros com explosivos. Uma hipótese pouco credível.

O que se verifica neste momento é uma infiltração de militantes religiosos e outros, provenientes dos países vizinhos, nomeadamente das monarquias do Golfo, apoiados em armas e munições pelos Estados Unidos, França, Reino Unido e eventualmente mais alguns países ocidentais. Juntam-se a estes algumas unidades militares que desertaram  e um número de cidadãos sírios, progressivamente mais elevado (especialmente por parte dos que já perderam familiares nas manifestações) que se encontram agora armados e que começam a controlar algumas zonas no interior do país.

Os sírios entusiasmaram-se com a chamada Primavera Árabe (que ainda vai dar muito que falar) e o Governo sírio procedeu a uma repressão desproporcionada que agravou a tensão numa população tradicionalmente pacífica. É também de supor que as primeiras manifestações anti-governamentais tenham sido instigadas do exterior, já que a chamada "comunidade internacional" insiste na queda do presidente Bachar Al-Assad, sabendo que a sua saída de cena representaria o fim do regime e que a sua substituição por um governo-fantoche permitiria o livre acesso, através do Iraque, a um ataque ao Irão, a única obsessão de alguns líderes ocidentais. Recordo o histerismo de que estava possuída a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, quando a Rússia e a Síria vetaram, no Conselho de Segurança, a resolução que permitia a invasão da Síria por forças da NATO, como aconteceu na Líbia.

A visita a Damasco de Sergei Lavrov, ministro dos Estrangeiros russo e a proposta do envio de uma nova delegação da Liga Árabe à Síria aquietou provisoriamente os ânimos, sendo de admitir que os russos, que têm uma base naval em Tartus, se recusem a pactuar com as exigências ocidentais.

A propósito do elevado número de mortos que os confrontos na Síria já provocaram (o que é naturalmente lamentável), importa recordar que a mesma "comunidade internacional" nada fez quando em 2008/9 os israelitas bombardearam cruelmente, durante cerca de um mês, a Faixa da Gaza na Operação "Chumbo Derretido". Esta duplicidade de critérios não espanta, já que os governantes ocidentais, com os Estados Unidos à cabeça, há muito que perderam a mais elementar noção de vergonha e de decência. O que causaria admiração era a adopção de critérios uniformes para avaliar situações de características genocidárias.

A instalação de um regime islâmico na Síria, que é hoje um Estado laico, provocaria o caos no país, onde se praticam cerca de 20 confissões religiosas, e na região. Para muitos, a possibilidade de chegar por via terrestre ao Irão justifica tudo. Presumo que estão enganados. Além disso, a experiência dos novos regimes "livres" na Tunísia, Egipto e Líbia, já que a insurreição no Bahrein foi esmagada pela Arábia Saudita com o beneplácito de Washington, parece que não está a resultar tão bem como previram os manifestantes que levaram à queda das ditaduras naqueles países. Na Tunísia avança diariamente a coacção sobre as mulheres e a imposição de normas decorrentes da lei islâmica; na Líbia, combate-se em muitos pontos do território, sem que as agências de informação disso dêem conta, no Egipto, os recentes acontecimentos no estádio de Port-Saïd, revelam uma progressiva inquietação no país, onde os islamistas obtiveram nas urnas quase 70% dos votos.

Há alguma coisa que não corre bem, a principiar para os jovens que na Tunísia e no Egipto estiveram na linha da frente da contestação. Na Líbia, tratou-se de uma invasão militar, e os jovens serviram apenas para se deixarem fotografar junto a Bernard-Henry Lévy, qual novo Lawrence sem camelo mas vestido pelos melhores costureiros de Paris.

Não tenho dúvidas de que existe uma estratégia devidamente concebida para provocar toda esta agitação no Mundo Árabe. Contudo, só o tempo permitirá distinguir os objectivos essenciais dos acessórios e consentirá uma leitura integrada dos acontecimentos.

CARPE DIEM!

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