quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

A NOVA TUNÍSIA (II)


Escrevi aqui sobre a nova Tunísia, aquando das primeiras eleições livres no país, em 23 de Outubro de 2011.

O meu amigo, o escritor francês Christian Giudicelli, que é um amante da Tunísia, esteve no país, aonde se desloca frequentemente (como eu) desde há duas décadas, em Junho do ano passado. Já autor de um livro sobre a Tunísia, Fragments tunisiens (1998), que se destaca na sua vasta obra, publicou agora Tunisie, saison nouvelle, onde relata vários aspectos e episódios da Tunísia e dos tunisinos pós-Revolução.

Nesta sua mais recente obra, Christian Giudicelli refere o novo clima de liberdade que se respira no país e a esperança que uma parte da população alimenta quanto ao futuro, mas não esquece as preocupações de muitos tunisinos, especialmente dos mais jovens, relativamente à vitória eleitoral do partido islâmico Ennahda, e ao receio que a nova maioria possa ser tentada a impor, em nome da religião (as religiões, todas elas, sempre serviram, ao longo da história, para restringir as liberdades individuais)  determinadas restrições a uma certa liberdade de costumes que, apesar do seu carácter ditatorial, reinava no tempo de Ben Ali.

 Tem-se esforçado o novo regime tunisino por afastar tais receios e, ainda ontem, ouvindo em Lisboa o ministro dos Negócios Estrangeiros da Tunísia, Rafik Abdessalem (aliás genro de Rached Ghannouchi, o líder do partido Ennahda), em conferência na Universidade Católica, pude escutar a sua opinião quanto ao facto de o islão ser perfeitamente compatível com a democracia, do novo Governo não pretender impor restrições às liberdades cívicas e de considerar um erro os exemplos da Turquia kemalista e do Irão actual, em que se pretendeu, no primeiro, a laicização forçada do povo, e no segundo (vigente), a islamização forçada desse povo. Esperamos e desejamos que as declarações de Abdessalem não sejam apenas palavras para tranquilizar o mundo ocidental e que, na prática, não surjam medidas (ou mesmo só pressões) para condicionar comportamentos que eram considerados como adquiridos desde os tempos de Burguiba (o pai fundador) e que Ben Ali obviamente mantivera.

A situação na Tunísia é incomparavelmente mais calma do que as que se verificam no Egipto e na Líbia, após a queda dos respectivos regimes. Mas a nível económico e social está a verificar-se uma progressiva degradação, decorrente de muitos factores, um dos quais a queda abrupta do turismo, uma das principais fontes de receita do país, já que a Tunísia, nos últimos anos, graças á amenidade do seu clima, às suas paisagens, praias, monumentos históricos e, especialmente, ao caloroso acolhimento dos seus habitantes, se tinha tornado, pelo menos para europeus, um dos principais destinos de vilegiatura. É imperioso que a confiança seja restabelecida, que não se verifique uma regressão nos costumes, que não se proíba a venda de bebidas alcoólicas (mesmo que restringida a certos estabelecimentos), que não se obriguem as mulheres a usar véu e que as mesmas usufruam (como quase acontecia antes) dos mesmos direitos dos homens. Eu sei que isto é incompatível com a sharia, mas julgo que não foi para estarem submetidos á lei islâmica, quando existe uma lei civil (ainda que enformada por princípios islâmicos) que os tunisinos fizeram a revolução.

Regressando ao livro de Giudicelli, que dá conta, em larga medida (nas conversas que transcreve com tunisinos de todas as idades e classes sociais), de todas estas preocupações, importa referir que o autor faz uma revisitação de várias cidades, em especial Bizerta, onde costuma ficar alojado, procura encontrar amigos de visitas anteriores, tendo ficado impressionado ao saber que um dos seus interlocutores favoritos morreu no mar, ao tentar atravessar o Mediterrâneo, no período pós-revolução. Nesse aspecto, considero-me privilegiado, já que os meus amigos tunisinos mais próximos, que também procuraram alcançar a Europa, que sempre fora o seu sonho, se encontram sãos e salvos em Paris.

Não cabe neste post relatar o conteúdo de Tunisie, une saison nouvelle, livro que vivamente se aconselha a todos quantos pretendam adquirir uma visão desta nova Tunísia, caído que foi o regime de Ben Ali, um país que vive ainda um período de transição, enquanto os deputados redigem uma nova Constituição e se aguardam eleições gerais para os órgãos de soberania que substituam os actuais, que exercem provisoriamente as suas funções.

Faço os melhores votos para que a Tunísia, um dos mais belos países do mundo, encontre os equilíbrios indispensáveis ao seu desenvolvimento, que se promova uma justiça social muito descurada durante a ditadura, que se recupere rapidamente a actividade turística, que se diminua a elevada taxa de desemprego, que a educação no país continue a ser uma prioridade, e, na parte que me toca (enquanto estrangeiro) que continue a ouvir da boca dos tunisinos "Marhaba" ou "Soyez le bienvenu".

1 comentário:

Anónimo disse...

Dizer q a Tunisia é um dos mais
bonitos paises do Mundo, não sei o que o autor do blogue entende por Mundo.
Não avanço mais na minha critica, pois o texto depois de bem analizado diz tudo.
Saudações