Em primeiro lugar, quero manifestar a minha solidariedade com todos os ucranianos, residentes em Portugal, na Ucrânia ou algures, que são, neste momento, vítimas de decisões irreflectidas, idiotas e perigosas (para não dizer outra coisa) do Governo de Kiev.
Saliento, também, a acção do Governo Português ao declarar aceitar receber em Portugal todos os familiares de cidadãos ucranianos residentes no nosso país.
Analisemos agora a situação decorrente da ofensiva militar desencadeada esta manhã pela Rússia na Ucrânia.
Não possuo neste momento dados objectivos e concretos sobre a amplitude da acção militar russa.
Era expectável, na sequência do reconhecimento, por Vladimir Putin, da independência das repúblicas separatistas de Donetsk e de Luhansk, que haveria um apoio militar de Moscovo à concretização dessa situação no terreno.
É também conhecida a oposição do Kremlin à continuação em Kiev de um governo manifestamente anti-russo, ao contrário do que se verificou nos tempos que se seguiram à dissolução da União Soviética.
Seria menos expectável a realização de bombardeamentos em outras localidades, como parece ter acontecido, a menos que se trate de ataques cirúrgicos para neutralizar uma resposta das forças ucranianas às forças russas, já que o presidente Volodymyr Zelensky decretou a mobilização geral do país.
Também é possível que esses ataques se destinem a acelerar a substituição do governo ucraniano anti-russo por um governo minimamente independente. Os próximos dias serão esclarecedores.
Não acredito que a Rússia tenha a intenção de ocupar militarmente a Ucrânia, o que, em minha opinião, constituiria um erro grave.
Importa salientar, para quem ainda não o saiba, que a Ucrânia é constituída por regiões cultural, linguística e tradicionalmente muita diversas, desde um ocidente de forte influência polaca a um leste decididamente russófilo.
O governo do presidente Zelensky (e dos seus acompanhantes) ignorou voluntariamente a conjuntura do país, optando por um alinhamento com Washington e apoiando-se em elementos oriundos de forças estranhas, incluindo confessados nazis, como os membros do Batalhão de Azov. Houve, ao longo dos últimos oito anos, provocações e agressões a cidadãos considerados pró-russos, sem qualquer reacção do governo central. Entre as muitas decisões erradas de Kiev conta-se a proibição do ensino da língua russa na Ucrânia!!! Também Kiev não cumpriu o ponto nº 3 do Protocolo de Minsk, que obrigava o governo ucraniano a estabelecer constitucionalmente a regionalização do país, o que teria evitado um deteriorar da situação.
Finalmente, Kiev solicitou formalmente a adesão da Ucrânia à NATO, o que poderá ser considerado como uma máxima provocação à Rússia.
Ninguém ignora que foram dadas garantias dos Estados Unidos (Bill Clinton) a Mikhail Gorbachev e a Boris Yeltsin de que, após o desmoronamento da URSS, e tendo sido extinto o Pacto de Varsóvia, a NATO não alargaria os seus limites a Leste. Não há um tratado formalmente assinado mas essas garantias são reais e disso têm testemunhado não só os russos mas muitos diplomatas ocidentais. Ora, verificou-se que não só os antigos países comunistas do Leste europeu ingressaram rapidamente na Aliança Atlântica como nela foram integradas três república da própria União Soviética (Estónia, Letónia e Lituânia). Além do que todos esses países foram incluídos na União Europeia. Este "cerco" da Rússia a ocidente foi visto com o maior desagrado pelo Kremlin que não terá intervindo na altura por desorganização interna ou falta de meios. Entendeu agora Putin tentar reverter a situação ou, pelo menos, evitar que ela se agrave.
O que escrevi é do conhecimento da maioria das pessoas interessadas na matéria, mas convém, às vezes, recordar.
Também não compreendo o coro de lamentações que se ergue da parte daqueles que não se indignaram quando os Estados Unidos e seus Aliados e a NATO atacaram, invadiram e ocuparam, sob falsos pretextos, territórios a milhares de quilómetros de distância, como foi o caso da Jugoslávia, do Afeganistão, do Iraque e da Líbia, para só referir os mais recentes.
O facto de Volodymyr Zelensky ter passado dos palcos da televisão para o palco da política foi um desastroso erro de "casting".
Como em todos os conflitos desta natureza, embora se tente evitá-lo, ou se diga que se tenta, haverá sempre vítimas civis, o que não podemos deixar de lamentar profundamente.
Voltarei ao assunto quando estiver na posse de novos e fidedignos elementos.
(PUBLICADO NO FACEBOOK EM 24/02/2022)
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