sábado, 17 de agosto de 2013

EXTENSÃO DO DOMÍNIO DA LUTA


Cairo - Desocupação da mesquita Al-Fatah - 17 de Agosto de 2013


Recorramos ao título de Michel Houellebecq, Extension du domaine de la lutte. É o que se verifica presentemente no mundo árabe e islâmico, depois dos acontecimentos do passado dia 14 no Egipto. As manifestações pró-Morsi dos apoiantes do ex-presidente continuam não só no país, com o seu cortejo de milhares de vítimas, como em Marrocos, Tunísia, Jordânia, Palestina, Paquistão e um pouco por todo o mundo muçulmano, ao mesmo tempo que uma explosão em Beirute, no dia 15, provocou dezenas de mortos e feridos.

A situação que se vive no Egipto é deveras preocupante, e a eventual ilegalização da Irmandade Muçulmano, que está a ser encarada pelo Governo interino, poderá suscitar uma escalada da violência, apesar do estado de emergência e do recolher obrigatório. Há um clima de confronto não só político, mas inequivocamente religioso, como o testemunham as dezenas de igrejas coptas e católicas que foram já incendiadas.

Compreendemos que uma parte significativa da população egípcia seja contra a agenda islamista dos Irmãos, que estava a ser progressivamente aplicada por Morsi, não cuidando dos muçulmanos não fundamentalistas, dos laicos e dos cristãos. Estima-se que a comunidade cristã do país (coptas na quase totalidade, mas também ortodoxos e católicos) se situe perto dos 15% da população, de mais 80 milhões de habitantes.

A luta que se trava na bacia do Mediterrâneo é desde há algum tempo uma luta entre  o Islão e o Ocidente (políticos), entre os muçulmanos fundamentalistas e os cristãos e os judeus, mas também entre muçulmanos sunitas e xiítas. E ainda entre ditaduras laicas, democracias pseudo-representativas e ditaduras religiosas. Enfim, um xadrez bastante complexo.

Como se calculava, embora pareça que muitos o tenham esquecido, ou fingiram esquecer, a visão fundamentalista do Islão não é compatível com a democracia representativa (ainda que esta na maior parte dos casos represente muito pouco, já que os governos são eleitos a partir de programas que normalmente ignoram quando no poder). No regime democrático, a soberania reside teoricamente no povo; para os islamistas a soberania reside em Deus, e daí a sua contestação do sistema democrático e a imposição da sharia, única fonte legítima do poder. Trata-se, como se conclui, de uma contradição insanável.

Caiu o mito das "primaveras árabes", alimentado por ingenuidade, desconhecimento das situações, cinismo ou cálculos inconfessáveis. E também pela vontade de muita gente de ver nas revoluções que derrubaram os ditadores uma oportunidade para a melhoria de vida dos povos em questão. Não creio que na Líbia se lamente o derrube de Qaddafi, mas certamente na Tunísia e no Egipto milhões de pessoas recordam Ben Ali e Hosni Mubarak. Ironias da vida!

A chamada comunidade internacional tem lidado mal com as transformações que ocorrem desde há  dois anos no mundo árabe. Por incompetência ou má-fé. Os acontecimentos que se verificam hoje no Egipto, na Síria e, embora em menor escala, na Tunísia (e da Líbia sabemos pouco), deveriam ter sido previstos pela dita comunidade, até porque a instabilidade crescente que se vive na margem sul do Mediterrâneo (tão perto da Europa) poderá  ter consequências desastrosas.

Desejamos não ser colocados perante um cenário de proporções catastróficas, que apenas nos permita dizer, como em muitas óperas: È tardì!

3 comentários:

Anónimo disse...


Egípcios !! Dêem graças a Allah !!!
Vocês têem a grande sorte de não fazer parte da Europa pôdre e decadente !...

Anónimo disse...

Tem toda a razão o comentador das 15:26. Os egípcios apesar de tudo ainda têm ânimo para tomar posições dum lado ou doutro. A Europa está morta.

Anónimo disse...


Imenso ânimo..... sobretudo para se matarem uns aos outros !!!...
Aliás, se passarem de 80 milhões para metade, o Egipto só terá a ganhar com isso...
Por isso, força !!!!!!