terça-feira, 19 de julho de 2022

PAVANA PARA UMA EUROPA DEFUNTA

Acabei de reler Pavane pour une Europe defunte, de Jean-Marie Benoist (1942-1990). Publicado em 1976, este livro é notavelmente premonitório. Numa altura em que não existia ainda oficialmente a União Europeia, e muito menos o euro como moeda franca, o autor elabora um requisitório sobre os males de uma Europa já então confrontada pelas contradições dos estados-membros, e muito longe do inconcebível alargamento a Leste que veio a verificar-se mais tarde.

Sendo uma obra sustentada filosoficamente em múltiplos argumentos, interroga-se Jean-Marie Benoist quanto à prioridade do aspecto económico sobre o cultural, evocando a progressiva dependência do Velho Continente em relação aos Estados Unidos da América.

A ideia de um Estado Europeu é irrealizável, como o tempo se tem encarregado de demonstrar, mormente no momento actual, em que o conflito Rússia-Ucrânia, que é verdadeiramente um conflito dos Estados Unidos com a Rússia, se encarregará de destruir o frágil consenso subitamente adquirido não tanto pelos povos mas pelos políticos sufragâneos de Washington.

Pode existir um país como os Estados Unidos da América (apesar de as diferenças internas progressivamente se acentuarem) porque tem pouco mais de 200 anos de existência. Ou o Brasil, cuja independência data da mesma época. A população dos estados federados até fala a mesma língua. Mas não é possível criar uns Estados Unidos da Europa, com estados com mais de 1 000 anos de história, com cultura, costumes, percursos muito diversos e com uma população falando mais de 20 idiomas diferentes.

Não cabe aqui desenvolver a extraordinária argumentação do autor, que anteviu, há 46 anos, um esboço da situação em que nos encontramos. Se ainda fosse hoje vivo, morreria de espanto. É inegável que a unificação europeia trouxe algumas vantagens aos povos abrangidos, mas a que custo! A ideia de uma federação parece que já tombou mas até o fantasma de uma união política, apesar dos exercícios de prestidigitação que nos servem, já se esvaiu. 

Quem pretender saber mais sobre o pensamento deste autor nos idos anos 70 do século passado, aprenderá muito lendo este livro.


2 comentários:

OPINADOR FUNDAMENTAL disse...

O Erro Europeu é, entre outros, querer ter uma estrutura igual ao USA ou Brasil, neste caso só possível à Língua e ao facto da Independência ter sido obtida sob a égide da Coroa Portuguesa.

Na Europa houve demasiada Guerra e Impérios para haver esse tipo de Estrutura.

Há que manter um "Inter-Diálogo convergente contínuo" (seja lá o que isto for) entre os vários Estados...
Pelo menos o EURO tem-se mantido ....

Anónimo disse...

Muito bom. Obrigado.
A União Europeia, e o Euro, exibem todos os dias os defeitos da uma concepção artificial e de uma execução falha de lizura. Das boas intenções (de uns) está o inferno cheio.
A realidade exibe apenas, publicamente, os actuais beneficiários a insistir com o prossecução do formato.