sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

AGRAVA-SE A SITUAÇÃO NO EGIPTO



Os incidentes dos últimos dias no Egipto, que causaram dezenas de mortos e milhares de feridos, tiveram hoje, sexta-feira, uma nova expressão com gravíssimos confrontos no Cairo, Alexandria, Port-Saïd, Suez e Ismaïlia, de que resultaram vários mortos e muitos feridos.

Centenas de milhares de manifestantes protestaram nestas cidades contra o presidente Mohamed Morsi, exigindo a sua resignação imediata  e acusando-o de trair a revolução.

O palácio presidencial foi atingido por cocktails Molotov a as forças de segurança ripostaram com canhões de água e gás lacrimogéneo.

Segunda reporta a Al Jazira a situação caminha rapidamente para um caos absoluto, pelo menos na região norte do país, onde se concentra a maior parte da população, globalmente estimada em mais de 80 milhões de pessoas.

Como já aqui escrevemos por mais do que uma vez, a resignação de Morsi contribuiria para um apaziguar das tensões e criaria a possibilidade de constituição de um governo de salvação nacional, como é exigido pelas oposições.

A Irmandade Muçulmana encontra-se, de facto, apertada numa tenaz, já que os movimentos laicos acusam-na (e é verdade) de pretender islamizar o país, e os salafistas do partido Al-Nur entendem que é demasiado branda, já que os ultra-conservadores desta formação política anseiam por um regresso àquilo que julgam ser os tempos do profeta Muhammad. É evidente que os salafistas mais inteligentes sabem que assim não é, mas como possuem uma agenda secreta para o progressivo controlo do mundo muçulmano, a fim de, como tem referido Gilles Kepel, "converterem ao islão os muçulmanos normais do nosso tempo, que consideram descrentes", aproveitam-se da ignorância das massas para prosseguirem o seu projecto de "reconquista", que se estenderá até à Península Ibérica. Isto é, de refazerem o que foi, outrora, o domínio mais vasto do califado islâmico, cujo ensaio está neste momento em curso no Sahel africano, mais propriamente no Mali.

Muitos ultra-ortodoxos egípcios, que consideram o período faraónico um tempo pagão de má memória, propuseram já a destruição das pirâmides de Gizeh, o que revela até onde pode levar a loucura  religiosa. Pior fanatismo do que o religioso, em nome do qual se têm realizado guerras nos dois últimos milénios, com milhões de mortos, julgo que não existe.

Torna-se, por isso, necessário, estarmos atentos e vigilantes, pois só a laicidade pode conduzir os homens à Paz e à Justiça.

4 comentários:

Pedro Teixeira da Mota. disse...

Tão trágica a situação...As divisões nas sociedades islâmicas, que também existem nas sociedades ocidentais mas menos radicalizadas, são contudo alimentadas ou por vezes exploradas pela paixão, o ardor, a guerra santa e eis-nos em becos sem saída...

Anónimo disse...

Eu sei que está na moda culpar as religiões dos vários malefíicios que nos dão jeito. O pior para essa teoria,é quando começamos a examinar a História,os factos e os números.As guerras mais sangrentas(porque com tecnologias mais avançadas e porque combatidas com "exércitos populares") são certamente as travadas na Europa nos séculos XIX e XX,que quase destruiram o Continente e no final o destituiram do seu papel no mundo. Ora nem as Napoleónicas,nem a franco-prussiana,nem as I e II Guerras tiveram qualque componente religiosa,mas motivadas como quase sempre por razões politico-económicas. A assaz mortífera guerra da Secessão tambem nada tem a ver com razões religiosas. As guerras da sucessão de Espanha idem. A própria invasão Otomana,até Viena e fronteira marroquina,é sobretudo mais um expansionismo politico-militar de um Império pujante do que uma movimentação religiosa,pois no Médio Oriente e no Norte de África encontravam a mesma religião,e na Europa pretendiam dominar mas não converter,como se viu quando os europeus retomaram os seus dominios na Europa Oriental, nos fluxos e refluxos habituais nos jogos de força entre potências em ascendência ou em processo de enfraquecimento. E se mais recuássemos,as guerras dos gregos contra os persas e entre si,os conflitos da criação e destruição do Império Romano,que têm de religioso? Ficam as pequenas (em comparação com as do Século XX) guerras europeias do Século XVII. Por estas razões,pelo menos julgo que é de deixar as religiões em paz.

Zephyrus disse...

Os EUA têm feito tudo o que está ao seu alcance para criar instabilidade no mundo árabe. Veja-se o que sucedeu na Tunísia, Líbia e Egipto, e o que está em marcha na Síria.

É sabido que os sionistas mais ortodoxos consideram que os judeus ficaram prejudicados na divisão do antigo Império Otomano e reclamam para si mais território, parte da Jordânia, Síria e Líbano, e ainda o Sinai.

A Turquia por sua vez mantém tensões com a Grécia, país cujo futuro económico e financeiro é incerto: correm o risco de sair do euro.

A Alemanha parece não estar disponível para ajudar o Chipre, segundo se infere das palavras do seu sinistro Ministro das Finanças. A bancarrota cipriota lança importantes dúvidas sobre a estabilidade da região, pois são conhecidas as tensões entre cipriotas gregos e turcos.

Num relatório recente a Fundação Rockefeller previa o regresso ao poder, por parte dos talibãs, no Afeganistão.

Curiosamente permanece uma paz estranha nas Monarquias do Golfo, «amigas» dos EUA. Mas são conhecidos os problemas internos de tais países. Recentemente o Dubai esteve à beira da falência. Há corrupção e fundamentalismo, e é expectável que as novas classes médias mais ocidentalizadas não se contentem com a falta de liberdade e de direitos. Conheci em Londres muitos jovens dos Emiratos Árabes Unidos e pelo menos na capital inglesa têm um estilo de vida «ocidental». Saliento que árabes das classes altas dos Emiratos Árabes Unidos, Arábia ou Jordânia são clientes não raras vezes «desinibidos» dos clubes/bares/discotecas homossexuais de Londres. Sabe-se que o pecado da «sodomia» dá pena de morte em alguns dos seus países de origem.

Tal instabilidade no Próximo e Médio Oriente poderá mesmo levar a uma guerra regional de consequências imprevisíveis. As potências coloniais ocidentais e o Império Otomano, e depois ditadores como Sadam ou Kadafi mantiveram a estabilidade numa área do globo com um complexo quadro étnico e religioso, onde as fronteiras não correspondem necessariamente à distribuição dos povos e das etnias, como sucede, grosso modo, na Europa. Israel parece interessado nesse esforço de guerra, com a complacência do Ocidente. Os impactos na classe média ocidental, derivados da subida do petróleo e de outras matérias-primas serão brutais. Mas a indústria do armamento ficará assaz satisfeita.

Anónimo disse...

Claro que só por puro lapso não mencionei a série de conflitos medievais cristãos-muçulmanos conhecidos como Cruzadas,esses sim de índole predominantemente religiosa,embora a lamentável quarta cruzada tenha tido por resultado apenas a destruição e o saque de uma metrópole cristã,Bizâncio. E duvido que nas restantes cruzadas, com os meios militares da época,em tropas e armamento,a enorme distância das bases de abastecimento para os cristãos,a mortandade total fosse muito relevante em comparação com as guerras do século XX.