quinta-feira, 25 de agosto de 2011

PARA FICARMOS MAIS TRANQUILOS


Pela sua oportunidade, transcrevo o artigo de Manuel António Pina no Jornal de Notícias:

"Arte degenerada"

A Companhia de Seguros Tranquilidade proibiu à última hora uma exposição no seu Espaço de Arte quando descobriu que ela tinha temática homossexual. Fez bem, sou cliente da Tranquilidade e sinto-me mais tranquilo. Antes não me sentia pois, ao preencher a papelada, verifiquei com estranheza e preocupação que a Tranquilidade não me perguntava se eu não seria, por acaso, gay. Ora tanto eu, segurado, como a pessoa segura poderíamos bem ser "bichas" e isso afrontaria aquilo que a Tranquilidade chama de "valores da empresa", secção vida íntima alheia.

A decisão de proibição (ou "cancelamento", que é palavra menos feia) da exposição "P-town", resultado de uma residência dos artistas João Pedro Vale e Nuno Alexandre Ferreira na cidade norte-americana de Provincetown, esclareceu finalmente as minhas dúvidas sobre a masculinidade dos "valores" da Tranquilidade. (Diga-se "en passant" que o Acordo Ortográfico perdeu uma boa oportunidade para pôr os pontos nos ii e mudar o género da palavra "masculinidade", já que o facto de ser do género feminino pode gerar equívocos em espíritos fracos).

É bom saber que, na "coutada do macho ibérico", há uma empresa que se mantém fiel aos viris valores ancestrais e tem a coragem de, como nos saudosos anos 40 na Alemanha e na URSS, "cancelar" a "arte degenerada".

Porque não se dedicam os artistas a pintar pores-do-sol e retratos dos 'stakeholders' do Grupo Espírito Santo?

6 comentários:

Joaquim Amado Lopes disse...

O que é exactamente uma exposição com "temática homossexual"?
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É que nunca ouvi falar de exposições com "temática heterossexual" e todas as manifestações artísticas (cinema, pintura, fotografia, ...) de que tive conhecimento e que se apresentavam "com temática homossexual" mais não são do que expressões de sexo. O que faz todo o sentido, uma vez que a isso mesmo que a homossexualidade e a heterossexualidade se referem e não há outra forma de as expressar além de através de símbolos ou actos sexuais.
Suponho que essas expressões artísticas possam não ser propriamente pornografia (intuito de despertar desejo sexual no observador) embora (filisteu me confesso) me falhe o que mais possam procurar, à parte de documentar ou ensinar.
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Neste caso em concreto (e não conheço a obra dos autores), é possível que o que tenha chocado(?) mais os representantes da empresa seja o aspecto sexual da exposição, não especificamente o "homo" em vez de "hetero". Independentemente da posição de cada um relativamente à homossexualidade, a realidade é que a esmagadora maioria da população (mesmo dos consumidores de pornografia) acha de mau gosto a exposição pública de formas de sexo, chame-se-lhe "arte" ou outra coisa qualquer. E uma vez que se trata do espaço de uma empresa, esta tem todo o direito de vetar certos tipos de expressão artística que ache menos adequados à sua imagem.
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O que me parece mais reprovável neste caso é a facilidade com que certas pessoas puxam dos termos "censura" e "intolerância" quando o/a "atingido/a" é homossexual. Como se esse aspecto fosse o factor determinante em tudo o que com ele/a se relaciona e em todas as decisões de outros relativamente a ele/a.
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Os autores desta exposição são livres de exprimir artísticamente o que quiserem e proporem a sua exibição onde o desejarem. Paralelamente, quem decide sobre o que é exposto e onde tem que ser livre de decidir sobre isso mesmo.
Nem todos têm a mesma atitude perante o sexo e a exigência de respeito para com a atitude mais "progressista" só é aceitável se vinda de quem respeita a atitude mais "conservadora". O que nem sempre acontece, veja-se o exemplo deste post a que respondo.

Anónimo disse...

Tanto quanto se consegue entender o comentador das 18.55,não aprecia expressões artisticas em que o sexo seja elemento relevante. Está no seu direito,e suponho que ninguem o obrigava, a ele ou a quem quer que fosse,a visitar a dita cancelada exposição. Tanto quanto tem aparecido na comunicação,a mostra centrava-se na ilustração de atitudes e práticas de homofobia numa cidade de província americana,o que até poderia afinal agradar ao comentador. E porque será que alguns se abespinham contra posições como a assumida pela "Tranquilidae"? Porque,como o comentador bem sabe mas finge não saber,se se exibissem cenas macho-fêmea,ninguem se preocuparia nem se ofenderia,pois é a cultura dominante e supostamente "natural",e não precisa de se classificar como hetero para ser aceite e promovida. Mas se alguns põem em dúvida essa exclusiva "naturalidade",eis que cai o Carmo e a Trindade,e convem cortar-lhes o pio,à falta de outras áreas. Suponho que se tratava de mostrar as consequências práticas desta atitude machista-dominante,e portanto cancelá-los,mesmo dentro da legalidade,é a ilustração da homofobia triunfante.

Anónimo disse...

Blah Blah Blah, caro Anónimo.
Cada um adere/apoia/promove os lobbies que quiser. O lobby homosexual não precisa de mais apoios. Está em todo o lado. É omnipresente e pelos vistos acha-se omnisciente...Qualquer dia aparecem mensagens implícitas nas embalagens de papas Cerelac e ai de quem ousar piar.

Acontece que o lobby homosexual, pelos vistos, não é o lobby de eleição desta Seguradora.
So what ?????

Valeria

Joaquim Amado Lopes disse...

O comentário do "Anónimo" das 02:26 ilustra na perfeição os últimos parágrafos do meu primeiro comentário: está tão formatado no "politicamente correcto" (que, na maior parte das vezes, mais não é do que intolerância e arrogância despropositada) que nem sequer lê o que os outros escrevem, quanto mais fazer um mínimo de esforço para os perceber. Quem não diz "amén" (passe a "conotação religiosa", para não "ofender" ninguém) à cartilha "progressista", seja qual fôr a forma em que seja apresentada, é imediatamente apelidado de "homofóbico" e "intolerante".

Diz que ninguém seria obrigado a visitar a exposição mas os DONOS da galeria deviam ser obrigados a recebê-la. Mais palavras para quê?

Anónimo disse...

Existe a clássica expressão "diálogo de surdos",mas creio que nem essa tem aplicação quanto à reacção do comentador das 18.18, dado que os surdos se podem entender pela linguagem gestual,se não sofreres de deficiências de outra natureza,mas neste caso,tanto o comentário original como o seguinte evidenciam problemas que de facto dificultam a comunicação. Por isso encerro aqui o "diálogo",esclarecendo,para quem eventualmente nos leia,que obviamente nunca afirmei que os donos do espaço "deviam ser obrigados" a receber a exposição,antes referi que agiam dentro da legalidade,mas sim que se tratava de uma atitude ilustrativa da homofobia persistente e presente em muitas áreas da sociedade. E apresentar a como óbvia a existência de um temível e poderoso "lobby gay",identificável com o "politicamente correcto" é uma incrível distorção da situação real,a do conservantismo de costumes, que importa manter a todo o custo,para pessoas como o autor do comentário em causa, acompanhado pela comentadora das 11.18. Sempre atentos,os defensores da ordem moral dominante,que não corre tanto perigo que seja necessário defendê-la com tanta acidez e manipulação dos factos. A "Coutada do Macho Latino",como diz o Pina,citando aliás um acórdão do S.J.T.,que atenuou a pena para uma condenação por violação de uma jovem estrangeira,dado ter invadido a tal coutada do Macho que estes comentedores tão bem defendem,está bem e recomenda-se...

Joaquim Amado Lopes disse...

Anónimo das 02:31, 27 Ago,
Na realidade, não escreveu explicitamente que os DONOS (em maiúsculas para que ninguém se esqueça) deviam ser obrigados a acolher a exposição. Exactamente da mesma forma que nunca escrevi explicita ou implicitamente que não aprecio "expressões artisticas em que o sexo seja elemento relevante" e nem eu nem o "anónimo" sabemos qual teria sido a decisão dos DONOS da galeria "se (na exposição) se exibissem cenas macho-fêmea".
Portanto, antes de se abespinhar com o que os outros leiam nas suas palavras devia fazer um exercício de humildade e contenção.
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E há muitas formas de "obrigar" alguém a fazer algo. P.e., pode-se criar nos outros o receio de serem alvo de insultos públicos, caso não decidam de acordo com visão mais "progressista" e "politicamente correcta". O resultado é que basta o "artista" apresentar a sua "obra" como de "natureza homossexual" e quem tenha o DIREITO de decidir se a deve acolher ou não já sabe que, se recusar, vai ser acusado de "homofobia" e de alinhar com os "defensores da ordem moral dominante" (expressão deliberadamente construída para dar a ideia de imposição repressiva sobre uma minoria) e sujeita-se a ver manifestações à sua porta.
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Quanto à parte final do seu comentário, mais não é do que a aplicação da mesma táctica. Ir lançando insultos e acusações directas sobre matérias que nem sequer foram abordadas antes e relativamente às quais o "anónimo" não faz a mínima ideia sobre qual seja a opinião do interlocutor.
E, ainda por cima, anonimamente.