sexta-feira, 10 de outubro de 2014

MOBY DICK



Moby Dick na San Francisco Opera

 
A recente edição em DVD do espectáculo apresentado em Outubro de 2012 na Ópera de San Francisco, a ópera Moby Dick, de Jake Heggie, permite algumas reflexões não apenas sobre tão notável realização musical e cénica mas igualmente sobre o romance de Herman Melville e os filmes que motivou.


Herman Melville

O romancista norte-americano Herman Melville (1819-1891) nasceu em New York e, tendo ficado órfão de pai aos 13 anos, cedo começou a trabalhar para ajudar a sustentar a família. Em 1839 embarcou pela primeira vez como grumete no navio "St. Lawrence" que o levou a Liverpool. Regressado aos Estados Unidos, ocupou-se em diversos empregos, voltando a embarcar, em Janeiro de 1841, no baleeiro "Acushnet", no qual percorreu o Pacífico. Aquando da escala nas Ilhas Marquesas, na Polinésia (Julho de 1842), abandonou a expedição juntamente com um amigo, ficando ambos a viver durante um mês junto dos nativos da tribo de "canibais" Typee. Escapando do "cativeiro", embarcou no baleeiro australiano "Lucy Ann", onde aderiu a um motim organizado pelos tripulantes insatisfeitos por falta de pagamento, o que o levou à prisão, numa cadeia de Tahiti. Liberto, permaneceu algum tempo na ilha, efectuando depois a sua última viagem em baleeiros, como arpoador no "Charles & Henry" (1842-43), até Honolulu. Regressou a Boston em Outubro de 1844, na fragata "United States".

A experiência das suas viagens, incluindo o convívio muito próximo e prolongado com os homens do mar, está amplamente descrita nas suas obras. A jornada para Liverpool encontra-se em Redburn. His First Voyage (1849). A estada junto dos "canibais" Typee é narrada em Typee (1846), o seu primeiro livro. O período de Tahiti figura em Omoo (1847). Mardi, and a Voyage Thither (1849) trata de um marinheiro que abandonou o seu navio. O tempo a bordo do "United States" é abordado em White-Jacket or The World in a Man-of-War (1850). 


Mas é com Moby Dick or The Whale (1851), ao tempo um fracasso editorial, que Melville adquire a celebridade. O assunto da obra é a perseguição de uma baleia, mais propriamente um cachalote branco já várias vezes arpoado pelos baleeiros e que, possuído de uma fúria implacável, se vinga destroçando-os. Este romance foi inspirado pelo naufrágio do "Essex", comandado pelo capitão George Pollard, que se afundou ao ser atingido por uma baleia, e permitiu ao autor não só dissertar sobre a caça às baleias e as especificidades de um navio como também sobre as relações humanas a bordo, num universo exclusivamente masculino. No caso, o barco é o "Pequod", comandado pelo diabólico capitão Ahad, que tudo afronta para atingir Moby Dick, a baleia outrora responsável por lhe ter amputado uma perna. O desfecho é conhecido. A história é narrada por Ismael, um jovem que embarca pela primeira vez (um greenhorn) e que se liga de perturbante amizade a um marinheiro, Queequeg, um nativo (figura inspirada dos "canibais" tahitianos) já habituado às lides da caça às baleias e naturalmente a outras. Ismael é o único sobrevivente da trágica expedição e pode ser considerado como um alter ego de Melville.




Embora homossexual, e apesar da sua misoginia, Herman Melville casou em 1847 com Elizabeth Shaw, tendo tido quatro filhos. Todavia, a grande paixão da sua vida foi o escritor Nathaniel Hawthorne (1804-1864), que conheceu em 1850, quando este tinha 46 anos e Melville 31 e que foi um idílio efémero. Hawthorne, também casado - e com uma mulher desconfiada - era um puritano assustado e não terá correspondido a Melville com um entusiasmo recíproco. Essa desilusão está de alguma forma estampada no romance que se seguiu, Pierre or The Ambiguities (1852), que foi transportado para o cinema pelo realizador Leos Carax, com o título de Pola X (1999), filme interpretado por Guillaume Depardieu e Catherine Deneuve.


Nathaniel Hawthorne

Note-se que o primeiro romance de Nathaniel Hawthorne (considerado o maior contista dos Estados Unidos) - The Scarlet Letter (1850) - cuja primeira edição se esgotou num mês, foi traduzido por Fernando Pessoa (A Letra Encarnada), encontrando-se o texto dactilografado no seu espólio da Biblioteca Nacional.


O último livro de Herman Melville, Billy Budd, Sailor, foi escrito em 1891 e ficou inacabado. O manuscrito só foi descoberto em 1919 e a narrativa seria publicada postumamente em 1924 pelo seu biógrafo Raymond Weaver. A versão autorizada reporta-se a 1962, após demorado estudo do texto. A obra conta a história de Billy, um belo marinheiro de vinte e um anos, alistado em 1797 no navio britânico "Bellipotent" durante a guerra entre a França e a Inglaterra. O jovem suscita duas paixões inconfessáveis, a do capitão Vere e a do mestre-de-armas Claggart. Falsamente acusado por este último de tentativa de amotinação, e incapaz de se defender perante o capitão devido à sua gaguez, Billy desfere em Claggart um soco que se revela mortal. Constituído o tribunal e aplicada a lei marcial, e perante a impotência legal do capitão para lhe poupar a vida, Billy é enforcado no traquete. O conto foi traduzido para português por José Estevão Sasportes e publicado em 1963 por Livros do Brasil.


Sobre o tema, Peter Ustinov realizou um filme homónimo em 1962, com Terence Stamp no protagonista, e Benjamin Britten compôs uma ópera em 1951, com libretto de E.M. Forster e Eric Crozier.







A ópera Moby Dick apresentada em San Francisco tem libretto de Gene Scheer, é dirigida por Patrick Summers e encenada por Leonard Foglia. A interpretação está a cargo da San Francisco Opera Orchestra e dos cantores Jay Hunter Morris (Capitão Ahab), Stephen Costello (Greenhorn Ismael), Morgan Smith (Imediato), Jonathan Lemalu (Queequeg) e Talise Trevigne (Pip, o moço da cabina), nos principais papéis.





Há também, entre outros,  um notável filme Moby Dick, de John Huston (1956), com Gregory Peck interpretando o Capitão Ahab, e um telefilme austro-alemão, realizado em 2010 por Mike Barker, com William Hurt no Capitão Ahab.

1 comentário:

Anónimo disse...

Um grande escritor com uma obra que merece ser lida. Não foi por acaso que os seus livros têm sido passados ao cinema e à ópera.