quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

QUADROS SEM UMA EXPOSIÇÃO




Não, não estou a evocar Mussorgsky. Refiro-me aos quadros de Joan Miró que provocaram por estes dias alarido na comunicação social. Dispenso-me de aludir às peripécias do episódio da sua (ainda) não venda, que consubstancia uma mistura de irresponsabilidade e de falta de vergonha [se vergonha ainda existisse na gente que nos (des)governa].

O pretendido leilão dos 85 quadros de Miró que pertenciam ao BPN, com o pretexto de atenuar a contribuição dos portugueses para o pagamento da dívida, é risível. Não conheço as obras e também não conheço (creio que esse número não foi divulgado) o valor por que foram adquiridas pelo defunto banco. Era, aliás, uma coisa que importaria saber.

Penso, contudo, que leiloar um conjunto de 85 pinturas de um grande artista é um mau negócio. As obras valiosas devem ser progressivamente colocadas no mercado e não por atacado. Neste caso, a cotação desce. Também não compreendo a  necessidade de alienar todas as obras. Sendo o património museológico português escasso em arte contemporânea, mandaria o bom senso (se existisse) conservar as obras mais significativas nos museus nacionais. Poderiam depois leiloar-se internacionalmente as outras ou vendê-las a particulares portugueses com a obrigação de continuarem em solo nacional.

Seria, igualmente, interessante saber, em relação aos previsíveis valores de venda, quanto custariam as mesmas obras se na mesma altura o Estado quisesse adquiri-las. Poderia assim avaliar-se o interesse do negócio.

Há ainda o  mistério do envio dos quadros para Londres. Todo este negócio é uma embrulhada, idêntica a outras a que este Governo já nos habituou. Não devemos estranhar.

Finalmente, a obsessão, veiculada nos últimos dias, de mencionar que esta venda se destina a amortizar a dívida externa é caricata. Quem a invoca não se dá conta do ridículo. É o ridículo elevado a razão de Estado.

Os ingleses sabem do que falam.

3 comentários:

Zephyrus disse...

Defendo que arte, quando está nas mãos do Estado, não se vende. Nem arte nem ouro. Só em situações extremas. Não é o caso. Se dependesse de mim, nem um único quadro abandonaria o país.

Anónimo disse...

Pelo menos os quadros mais importantes deveriam ficar no país. Esta obsessão economicista do Pm PPC é uma alucinação trágica.

Anónimo disse...

Se bem que se desconheça, pelo menos publicamente, a qualidade do conjunto em apreço, e pelo que tenho ouvido nos mentideros habituais, nem tudo o que ali está vale o mesmo, seria de tratar este assunto com a lisura e transparência que o mesmo mereceria. Se de facto se trata de um conjunto único e de grande valia artística, defendo a sua não saída do país. Por outro lado e caso apenas algumas das obras sejam de qualidade superior e as restantes, digamos, de segunda linha então, e tal como preconiza o nosso bloger, as primeira dariam de imediato entrada nos museus nacionais e as restantes poderiam então ser alvo de um leilão. Os fundos aí obtidos, reverteriam para a compra de outros objectos e/ou obras tão necessárias em outras instituições museológicas.
Assim, é uma trapalhada sem nome. Falta ainda esclarecer cabalmente a sua saída misteriosa para Londres.
Olho Vivo