segunda-feira, 8 de julho de 2013

O EGIPTO: UM PRECEDENTE PERIGOSO PARA A TURQUIA




A revolução ou golpe de Estado no Egipto (deixo a escolha do termo aos especialistas e aos directamente interessados) constitui um precedente que está a inquietar profundamente o governo islamista do primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan.

A agitação que desde há semanas reina na Turquia, devido à projectada destruição pelo Governo do Parque Gezi, na praça Taksim, em Istanbul, ultrapassa largamente a questão (em si-mesma importante) da devastação daquela zona verde no centro da maior cidade do país. O que está agora em causa é a islamização progressiva da Turquia, conduzida lentamente mas com mão firme pelo Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP).

A contestação ao Governo não parou, e ainda hoje se registaram violentos confrontos entre manifestantes e a polícia na zona de Taksim e na famosa Istiqlal Caddesi, bem como em outras cidades da Turquia.

Há vários caminhos para o país trilhar: o regresso ao estilo do "Pai da Pátria", Atatürk, defendido pela maioria dos militares e a evolução para uma sociedade mais ou menos islamizada, mas com diferenças de relevo: ou as posições cada vez mais radicais de Erdogan, cuja popularidade (também devido à recessão económica) começa a decair, ou as posições moderadas do presidente da República Abdullah Gül, cuja rivalidade com Erdogan no Partido já ninguém ignora.

Pretende Erdogan alterar a Constituição e dotar a Turquia de um regime presidencialista do qual ele seria o presidente e chefe do Governo, relegando o seu compagnon de route, Gül, para um lugar secundário. Ora Gül dispõe de consideráveis apoios no partido e a sua popularidade entre os turcos não pára de crescer.

Com uma parte significativa dos oficiais não considerados de confiança na prisão, Erdogan julgou afastar a possibilidade de um golpe militar (factos em que a Turquia é fértil), mas os acontecimentos dos últimos dias no Egipto poderão despertar a vontade dos muitos militares kemalistas ainda em funções de comando de reeditarem um novo golpe que ponha termo ao AKP, partido que aliás fora em tempos, ainda que com outro nome, ilegalizado pelos governos "militares".

Importa, todavia, salientar que as intervenções secretas, discretas ou concretas das chamadas potências ocidentais no Médio Oriente nos últimos anos se têm caracterizado, para além das ambições costumadas, por uma falta de inteligência, ausência de visão estratégica, ignorância histórica e crassa estupidez verdadeiramente confrangedoras.

A guerra aberta na Síria, o estado de pré-guerra civil no Egipto, a permanente instabilidade no Iraque, a desagregação da Líbia e a agitação na Turquia, só para citar os casos mais relevantes, são de molde a provocar as maiores inquietações.

Parece que Blair, enviado do Quarteto para o Médio Oriente, se pronunciou hoje, segundo ouvi na rádio, sobre a situação no Egipto. Não consigo compreender como não foi ainda possível calar definitivamente tão abominável personagem.

2 comentários:

G Klimt disse...

Concordo inteiramente com o que o nosso blogger refere sobre a Turquia.
Apenas não concordo com o seu já proverbial anti-americanismo (e anti anglo-saxonismo) primários.
Os Estados Unidos, destacadíssima primeira potência mundial em quase todos os domínios (e não será certamente por acaso...) defendem pragmaticamente os seus interesses. Fazem eles bem e o povo americano aplaude e elege e re-elege quem acha que melhor defende o seu "leadership mundial" com mais força e empenho (caso do idiota do G. Bush filho). Desde que não esteja em causa a eventual saída da Turquia da NATO, tudo bem para os EUA, seja com Erdogan, Gul ou quaisquer outros...
Quanto a Blair (eleito DEMOCRATICAMENTE pelo povo britânico Primeiro Ministro por mais de 10 anos...), concorde-se ou não com ele, não será um pouco excessivo chamá-lo de "abominável personagem" ?
Eu, por mim, acho que é.

Anónimo disse...

Na realidade, as intervenções ditas ocidentais nos assuntos internos do Médio Oriente apenas tem um único e descarado propósito: sacar a qualquer preço petróleo e mais petróleo! As populações que ali vivem, são apenas e só, carne para canhão. Depois, vem as carpideiras de serviço, como habitualmente, fingir que estão muito incomodadas e perturbadas com os mortos e feridos que elas próprias (potências ocidentais,) trataram de fomentar.
A desfaçatez, maldade, hipocrisia e todos os adjectivos possíveis para caracterizarem estes comportamentos, não tem limite. Ultrapassa tudo o que a nossa imaginação possa realizar.
Marquis