sexta-feira, 22 de abril de 2011

A SITUAÇÃO NA SÍRIA


Hoje, sexta-feira, dia de oração no mundo muçulmano, e ainda para mais sexta-feira santa para os cristãos, em número significativo no país, voltaram a registar-se grandes manifestações nas principais cidades sírias, incluindo na própria capital, Damasco, até agora mais ou menos tranquila devido à estrita vigilância das forças de segurança. Outras cidades a assinalar: Homs, Hama, Dera'a, Lataqia, Moadamia e Duma e Zamalka, nos subúrbios de Damasco.

Apesar de ter sido levantado o estado de emergência, e porque o número de manifestantes atingiu várias centenas de milhar, a polícia interveio, bem como os shabiha, bandos armados ao serviço do regime. Dos confrontos resultaram perto de 100 mortos, a acrescentar aos cerca de 200 das últimas semanas. Os manifestantes exigem a saída do presidente Bachar Al-Assad, que herdou o poder de seu pai, o estabelecimento de um regime democrático e a realização de eleições livres.

O presidente Assad tem oscilado entre a concessão de algumas liberdades (um pouco tardiamente)  e o estabelecimento de reformas económicas e a repressão vigorosa dos protestos, que atribui à influência de elementos estranhos ao país. Mas esta política não tem conseguido apaziguar os ânimos, quiçá inflamados pelas revoluções tunisina e egípcia, cujo desfecho está ainda longe de ser conhecido, apesar da destituição dos presidentes Ben Ali e Hosni Mubarak.

Não parece que Bachar Al-Assad esteja disposto a demitir-se, a menos que deixe de ter o apoio do exército. O impasse que se verifica na Líbia, a manutenção do presidente Saleh no Iémen e a precária estabilização nos outros países árabes constituem motivos para Assad insistir em permanecer.

Acresce que a implantação de um regime "democrático" na Síria, país de várias etnias e religiões (cerca de 20) contribuiria provavelmente para agravar as tensões já existentes e resultaria na ficção democrática libanesa, em que, constitucionalmente, o presidente da república é sempre um cristão, o presidente do parlamento um muçulmano xiita e o primeiro-ministro um muçulmano sunita. E há dois exércitos, o oficial e o do partido de Deus, o Hizbullah.

As convulsões que se verificam no mundo árabe, com todas as consequências previsíveis e imprevisíveis, deveria preocupar seriamente os dirigentes europeus, senão os mundiais, mas isso não acontece já que os mesmos, entregues a pequenos assuntos de intendência, debruçados quase exclusivamente sobre questões domésticas, descuraram e continuam a descurar a evolução da situação.

Deve registar-se que nos dois países em as revoluções "triunfaram", e que eram os mais procurados pelos turistas em todo o mundo árabe, porque a actividade turística caiu a pique desde o início dos confrontos, a situação económica está a tornar-se desesperada, uma vez que uma parte substancial das populações vivia, directa ou indirectamente, do turismo. Os milhares de imigrantes clandestinos que diariamente chegam à costa italiana constituem a melhor prova. 

Entretanto, o presidente francês Nicolas Sarkozy, que endoideceu, ao mesmo tempo que proclamou a sua intenção de se deslocar a Benghazi, porventura em visita de Estado, está a ponderar a suspensão dos acordos de Schengen para evitar a entrada de tunisinos legais (já que munidos da conveniente documentação fornecida pelo governo italiano) em França.

Continuo a defender a distribuição equitativa dos imigrantes árabes por todos os 27 países da União, ou pelo menos pelos 22 que assinaram os acordos de Schegen. Com condições, certamente, mas sem exclusões. Foi com a contribuição de árabes e turcos que a Europa refez as suas economias devastadas pela Segunda Guerra Mundial. Numa Europa novamente em crise, agora por razões muito diversas, e apesar da onda de xenofobia ignorante que atravessa vários países europeus, especialmente os nórdicos, importa criar as condições de uma integração decente, já que o multiculturalismo se tem revelado incapaz de corresponder às exigências das nações de acolhimento.

Para finalizar, direi que receio sinceramente que os actuais contestatários dos regimes árabes vigentes (cujas razões são evidentemente justas) se venham a arrepender de todo este reboliço, na medida em que as suas condições de vida (muitos no limiar da pobreza, outros porque aspiram a um standard de vida europeu, que em breve desaparecerá) se poderão ainda agravar.

1 comentário:

ZÉ DOS ANZÓIS disse...

A culpa do que acontece no Médio Oriente é dos europeus que colonizaram mal e descolonizaram pior.

SÃO ELES OS GRANDES RESPONSÁVEIS DA SITUAÇÃO ACTUAL, MAS NINGUÉM LHES PEDE CONTAS.