quinta-feira, 8 de julho de 2010

PAUL MORAND EM LISBOA


Publicou a Assírio & Alvim um pequeno livro com a tradução portuguesa de dois contos de Paul Morand: Lorenzaccio e O Prisioneiro de Sintra. O primeiro destes contos, que Morand incluíra no seu livro L'Europe galante (1925), merece a atenção do tradutor Aníbal Fernandes, que é também o prefaciador do livro. Trata-se de uma estória concebida por Morand, quando visitou Portugal em 1924, e que descreve um ditador português, ex-exilado e sodomita, que no último capítulo mantém relações sexuais com um marinheiro que, a soldo de outros políticos, o pretendia assassinar. Embora escrito anteriormente à sua chegada ao poder, parece que Salazar se achou retratado nesse conto, o que levaria o governo português a considerar indesejável a presença de Morand no nosso país, aonde só voltou em 1943, ao serviço do marechal Pétain.



Escritor, diplomata e académico (no fim da vida), Paul Morand (1888-1976) é uma figura desagradável da literatura francesa. Não tanto pela sua colaboração com o regime de Vichy (a que aderiu voluntariamente, abandonando as funções diplomáticas em Londres em 1940 e aderindo ao governo de Pétain, que o nomearia ministro plenipotenciário em Bucareste) mas pela sua personalidade intriguista e mesquinha. Tendo convivido de perto com a maior parte dos escritores (e não-escritores) homossexuais franceses, como Proust, Gide, Cocteau, e j'en passe, aproveitou todas as ocasiões para os criticar e para exaltar a sua pretensa virilidade e a sua paixão pelas mulheres, o que, dada a insistência com que o faz, não deixa de levantar suspeitas sobre o carácter das relações que manteve com muitas das personalidades citadas nas suas memórias, o Journal inutile, dois grossos volumes a que nos referiremos oportunamente.

Como escritor, foi brilhante (especialmente nos livros de viagens) mas superficial, e não tendo conseguido fazer-se eleger para a Academia Francesa antes da Ocupação alemã, só viria a sentar-se entre os "imortais" em 1968, já que De Gaulle (por óbvias razões), como patrono da Academia, sempre se opusera a essa eleição, que só se concretizaria no período final do mandato presidencial do general.

Sobre Paul Morand deve ler-se o post publicado por Pierre Assouline no passado dia 6 deste mês, no seu blogue "La république des livres", o mais famoso dos blogues literários franceses:     

http://passouline.blog.lemonde.fr/, 

com o título "Faut-il publier toutes les lettres de Paul Morand?"

1 comentário:

Anónimo disse...

Curioso. A que título terá vindo a Lisboa em 43,quando desde 42 se encontrava em Bucarest chefiando a Legação de Vichy e cuidando da fortuna da mulher,a Princesa Soutzo? Na Europa em plena guerra as viagens não eram fáceis nem casuais. Mas tudo é possivel,embora tambem seja de notar que Salazar,que efectivamente não o "gramava", parece ter recusado o agrément solicitado por Vichy para a nomeação de Morand como Ministro em Lisboa,provavelmente pelas mesmas razões que o incomodaram com a história do Lorenzaccio. E assim a História,pequena ou grande,nos vai reservando as suas surpresas e paertidas...