Analisámos em posts anteriores as obras Exortação à Mocidade, de Carlos Malheiro Dias, O Desejado, de António Sérgio e a réplica de Carlos Malheiro Dias a António Sérgio sob a forma de Resposta à Carta-Prefácio do Senhor António Sérgio. Tudo isto a propósito de D. Sebastião.
Vejamos agora a Tréplica a Carlos Malheiro Dias sobre a Questão do Desejado, de António Sérgio, publicada em 1925.
Começa por escrever António Sérgio: «Venho responder conformadamente à segunda rajada sentimental, romanesca, desse tirânico Sebastianismo a que sacrificou o seu intelecto. A sua réplica é (como não podia deixar de ser) um escuro labirinto confusíssimo das mais ilógicas alegações, de palavras indefinidas e de frases sem sentido. O estado de espírito em que se acha agora torna-o sensível às sugestões de inteligências inferiores; e o Sebastianismo, apanhando-o enfermo, trouxe ao seu espírito a escuridão. Falo-lhe, portanto, como a um doente passageiro, que tenho a certeza que se curará. O verdadeiro Malheiro Dias - o não antero-de-figueiredista, - há de um dia reaparecer, para triunfo (e alegria) de amigos sinceros e leais. Pudesse eu, na minha modéstia, ter a jsuta recompens de o ajudar a ressurgir!» (p. 7)
E, mais adiante: «Pouco depois, publica o meu Amigo a Exortação à Mocidade; e antes de o folheto aparecer a público (em Lisboa, pelo menos) dá para os periódicos dois trechos: um sobre demagogia, liberdade, razão, inteligência, etc.; outro sobre D. Sebastião, no qual dizia:
1º - Que, segundo António Nobre, D. Sebastião era o mais admirável herói da História, e que nisso António Nobre tinha razão;
2º - Que eu, António Sérgio, errara pensando coisa diversa, por falta do dom do sentimento;
3º - Que a Mocidade deveria imitar D. Sebastião, o mais admirável herói da História, no ímpeto da luta, no ardor do ideal, na candura patriótica, e tomá-lo, finalmente, como "lição eterna de beleza";
4º - Que a minha "blasfémia" sobre o Desejado era um produto desta nossa época, corrompida pelos apetites materialistas e o vampirismo das ambições desenfreadas;
5º - Que eu, António Sérgio, ando a contar a história mal contada.» (p. 8)
Continuando: «Atacado assim com tal rudez (pois foi o meu Amigo que me atacou, o que, ao lê-lo agora, ninguém diria!) e vendo-o espalhar doutrinas falsas que suponho perniciosíssimas, resolvi justificar o que eu dissera, pondo ao alcance da Mocidade os documentos em que me fundara ao enunciar o juízo que me impugnou, - documentos tão difíceis de reunir que até o sr. Antero de Figueiredo, no seu D. Sebastião, não hesitou um citar um trecho de um deles (que é português) - na tradução francesa que dá Castries (v. o D. Sebastião, de Antero de Figueiredo, nota 228).
Assim, pois, eu pus ao alcance da Mocidade (perante a qual me fora acusar) e para me justificar contra os seus golpes, os documentos em que me fundara. Eis a verdade, inobscurecível pelo pathos, pela eloquência, pelo "génio literário" de um Malheiro Dias.
Agora, o meu Amigo volta à carga, reeditando a Exortação com um longo Prefácio de controvérsia, - onde se contém a retratação completa (se bem que titubeada e disfarçada) dos absurdos da Exortação. A sua exposição é confusíssima, não entra na análise do verdadeiro assunto, e há que reordená-la metodicamente para metodicamente lhe responder, dividindo-a em pontos. Começarei pelas questões pessoais, para, logo de início, limpar o campo de ervas más.» (p. 10)
O autor enuncia depois 28 pontos, que não é possível discriminar aqui. Para o fazer teria de transcrever o livro, cuja leitura recomendo vivamente. António Sérgio pode ter sido demasiado contundente para com Carlos Malheiro Dias, mas a defesa intransigente que este faz de D. Sebastião é hoje insustentável e já então o era. A argumentação de Carlos Malheiro Dias é apaixonada, mas não convence. A contestação de António Sérgio, porque racional e baseada nas melhores fontes, prevalece.
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