segunda-feira, 30 de abril de 2018

NO 73º ANIVERSÁRIO DA MORTE DE HITLER




No dia 30 de Abril de 1945, Adolf Hitler suicidou-se, segundo a história oficial, no bunker da Chancelaria do Reich, em Berlim.

Muito se tem escrito sobre a morte (ou não) do Führer, e são várias as hipóteses acerca do que terá acontecido naquele último reduto berlinense da Alemanha Nazi, há precisamente 73 anos. O livro, publicado o mês passado, La mort d'Hitler, do jornalista e realizador de documentários francês Jean-Christophe Brisard e da jornalista e realizadora de documentários russo-americana Lana Parshina, conta as diligências dos autores em Moscovo para obterem a confirmação da morte de Hitler, dúvida que constituiu uma preocupação constante de Stalin, que pretendia demonstrar aos Aliados que fora ele o verdadeiro vencedor da Alemanha Nazi. Daí a preocupação das tropas russas de serem as primeiras a entrar em Berlim em 1945. Pelo meio do livro, são intercalados capítulos dedicados aos últimos dias decorridos no bunker, segundo os depoimentos dos sobreviventes, matéria já abundantemente tratada em livros e até no cinema, mas aqui com pormenores adicionais.

Apesar dos múltiplos obstáculos levantados pelas autoridades russas, os autores conseguem visitar, mais do que uma vez, ao longo de 2016 e 2017, o GARF (Gosudarstvennyy Arkhiv Rossiyskoy Federatsii), isto é, os Arquivos do Estado da Federação Russa; o FSB ( Federal'naya Sluzhba Bezopasnosti Rossiyskoy Federatsii), isto é, o Serviço de Segurança Federal da Federação Russa [sucessor do KGB (Komitet Gosudarstvennoy Bezopasnosti) ou Comité de Segurança do Estado], sediado na Praça Loubianka, mais concretamente os TsA (Tsentral'nyi Arkhiv, Arquivos Centrais), na Rua Bolchaïa Loubianka, nº 2 [o KGB foi extinto em 1991, tendo sido substituído, nos mesmos locais, pelo FSB, em 1995]; e os RGVA (Rossiiskii Gosudarstvennyi Voennyi Arkhiv), isto é, os Arquivos do Estado Militares Russos.


Pedaço do crânio de Hitler

No GARF, conseguem examinar um bocado do crânio de Hitler (com um impacto de bala) e uns pedaços do divã no qual se terá suicidado; no FSB, alguns bocados do maxilar, com destaque para os dentes; no RGVA, os relatórios secretos da polícia relativos aos testemunhos dos que privaram com Hitler no bunker, nos últimos dias. Os Arquivos Militares albergam cerca de 7,3 milhões de documentos relativos ás forças armadas soviéticas, e depois russas, bem como dos serviços de informação militares. Aí se encontram também todos os documentos oficiais do III Reich de que os soviéticos se apoderaram no fim da Segunda Guerra Mundial. Entre eles, os dossiers pessoais dos dirigentes nazis, o diário íntimo de Goebbels e a agenda de trabalho de Himmler.

Stalin pretendeu primeiro que a URSS não sabia do cadáver do Führer e admitiu depois que a haver um suicídio ele teria sido efectuado com veneno e não com uma pistola, pois Hitler seria um cobarde e não teria coragem, como compete aos militares, para dar um tiro na cabeça.

Nos Arquivos Militares, três dossiers mereceram especial atenção das autoridades soviéticas:

- Heinz Linge, criado de Hitler, 32 anos, SS-sturmbannführer (comandante)
- Hans Baur, piloto de avião de Hitler, 47 anos, SS-obergruppenführer (general do corpo do exército)
- Otto Günsche, ajudante de campo de Hitler, 28 anos, SS-sturmbannführer (comandante)

Os presumíveis cadáveres de Hitler e de Eva Braun foram encontrados, por acaso, no jardim da Chancelaria, em 5 de Maio de 1945, segundo relatório existente nos TsA (FSB) relativo à descoberta e autenticação do corpo.Também aqui existe um casaco amarelo mostarda de Hitler com três insígnias: um medalhão cercado de vermelho e branco com uma cruz gamada ao centro (símbolo do Partido Nazi); uma medalha militar (Cruz de Ferro de 1ª Classe) ; e uma insígnia representando um capacete militar sobre duas espadas cruzadas (insígnia dos feridos da Primeira Guerra Mundial). Igualmente, um aparelho ortopédico de Goebbels (que coxeava) e uma cigarreira dourada com a assinatura de Hitler e a data de 29.10.1934 (um presente do Führer a Magdalena Goebbels).

Segundo os relatórios conservados "Top Secret", os cadáveres foram encontrados perto do local onde se encontravam os corpos de Goebbels e de sua mulher Magda. Foram enterrados junto ao bairro berlinense de Buch. Mais tarde foram transportados para os arredores da cidade de Finow e em 3 de Junho de 1945 para as proximidades da cidade de Rathenow, onde foram sepultados "definitivamente". Os cadáveres estariam sepultados a 1,7 metro, na seguinte ordem: Hitler, Eva Braun, Goebbels (ministro da Propaganda), Magda Goebbels, o general Krebs (Chefe do Estado-Maior do Exército, suicidado no bunker) e os filhos dos Goebbels, envenenados por estes com cianeto, a fim de não viverem numa Alemanha que não fosse nacional-socialista.


Pedaço do maxilar de Hitler

Finalmente, os autores conseguem que o crânio e os dentes sejam examinados por um eminente especialista, o doutor Philippe Charlier, célebre pela identificação dos restos mortais de Henrique IV, São Luís IX e Ricardo Coração de Leão. Este, apesar de inúmeras dificuldades burocráticas, consegue fotografar os objectos e analisar os resultados em Paris, concluindo que os dentes são indubitavelmente de Adolf Hitler.

Segundo documento secreto de 21 de Fevereiro de 1946, os corpos atrás mencionados foram transferidos de Rathenow para Magdebourg, onde foram enterrados. Por fim, segundo o plano da operação "Arquivo", por decisão de Andropov, os restos das pessoas citadas foram definitivamente destruídos, por combustão, em 5 de Abril de 1970, num terreno vago da cidade de Scönebeck, a 11 quilómetros de Magdebourg. As cinzas foram lançadas no rio Biderin.

Fica aqui registada a odisseia destes investigadores, de que só mencionámos o essencial das 350 páginas de texto. O livro lê-se como um romance policial, recolhe inúmeros pormenores, critica a burocracia dos serviços russos e os sucessivos problemas com que os autores se depararam para atingir as suas metas. Trata-se de mais uma contribuição para o esclarecimento do que aconteceu nos últimos dias no bunker, depois das dezenas de livros publicados por historiadores e pelos sobreviventes da queda do III Reich, nomeadamente, por Traudl Junge, que foi secretária de Hitler até aos últimos momentos.

O livro La mort d'Hitler pretende encerrar a polémica acerca do destino final do Führer, depois de tantos testemunhos de pessoas que o terão avistado em países da América do Sul.

Tê-lo-á conseguido?

 
NOTA: Não existem, tanto quanto sabemos, fotografias dos cadáveres carbonizados de Adolf Hitler  e de Eva Braun, nem tão pouco dos cadáveres de Joseph Goebbels e de Magda Goebbels. Nem sequer das autópsias, oportunamente efectuadas, dos cadáveres de Hitler e de Braun.


quinta-feira, 19 de abril de 2018

UMA SABEDORIA ALEGRE




Acabou de ser publicado o livro Un savoir gai, de William Marx, escritor francês, ensaísta, historiador e professor da Universidade de Paris-Nanterre. Gai e não Gay, o que traduz ab initio uma opção do autor.

Trata-se de uma obra singular, em que a questão da sexualidade, particularmente da homossexualidade, é abordada de uma forma tão distinta da maneira como é habitualmente tratada que faz deste livro um espécime raro, para não dizer único, na ficção/ensaio dedicada à homossexualidade.

Transcrevo um parágrafo do Preâmbulo: «Abécédaire, dictionnaire, encyclopédie, ce livre n'est pas ce qu'il paraît: il peut se lire dans tous les sens, par tous les bouts, et veut surtout être complété par chacun, qui y apportera ses propres références, ses propres expériences. Il n'y sera pas seulement question d'amour, de drague, de fantasmes, de pornographie et de taille du pénis, mais aussi de Vélasquez, Kant, Proust, Oshima et Cat Stevens, des chauffeurs de taxi, des colonies de vacances, du mariage pour tous, d'algèbre et de la longévité des chats et des baleines bleues. De la vie érotique de Jésus, également. Et de la vie tout court.» (p. 13)

O autor entendeu desenvolver o texto utilizando a forma de um diálogo com o leitor, colocando-nos como interlocutor privilegiado. O que nos obriga a reflectir com maior acuidade sobre os temas abordados, especialmente sobre os mais polémicos e susceptíveis de não gerarem consenso. Ao longo de pouco mais do que 150 páginas (33 entradas), William Marx aborda as questões cruciais com as quais são confrontados os homossexuais (e também, pour cause, os heterossexuais) no decorrer da vida, contemplando atentamente as alterações verificadas em matéria de sexo (e afectividade) nas últimas décadas. Não subscrevo integralmente todas as afirmações (ou sugestões, ou propostas) do autor, mas confesso que este livro constitui uma contribuição excepcional para o estudo do objecto proposto.

Na entrada "Altérité" escreve: «Le même constat s'impose également, mutatis mutandis, dans les politiques de discrimination positive fondées sur la différence des sexes: les diverses lois sur la parité dans les institutions, si bénéfiques qu'elles puissent être à maints égards, te paraissent souvent n'avoir qu'un effet d'affichage facile (quoi de plus visible que la distinction d'un homme et d'une femme?) sans toucher véritablement au fonds du problème, c'est-à-dire à l'uniformité persistante des origines et des vécus de celles et de ceux qui administrent, décident et gouvernent. Pour dire les choses de façon plus critique encore, il arrive que l'exigence de parité ne soit que le cache-sexe du maintien des inégalités existantes: tu n'est pas persuadé qu'une femme bourgeoise blanche hétérosexuelle apporte un point de vue fondamentalement différent de sa contrepartie masculine. On attendrait plus aisément à la diversité nécessaire en relativisant ou en pondérant par d'autres critéres celui de la différence  des sexes, qui n'est sans doute pas le plus pertinent ni le plus apte à obtenir la pluralité recherchée.» (p. 19). Muito oportuna observação do autor. De facto, já todos sabíamos que as quotas nos governos, nos parlamentos e em outras instituições são uma falácia do politicamente correcto! E parece que em Portugal, agora, se volta a insistir neste tema, com os resultados desastrosos que se aguardam.

Curiosa a referência ao Gabinete Secreto do Museu Arqueológico de Nápoles [que tive o prazer de visitar há alguns anos]  e às peças nele exibidas e que, durante longo tempo, estiveram ocultas aos olhos do público. A propósito, o autor tece interessantes considerações a propósito do célebre quadro de Vélasquez, "A Forja de Vulcano", exposto no Museu do Prado, em Madrid, em que o pintor transgride todos os códigos da época, ao representar os ferreiros suficientemente despidos para atraírem olhares nada inocentes dos apreciadores da nudez masculina.

A entrada "Évangile" proporciona a William Marx pertinentes reflexões. Uma delas respeita à crise de vocações sacerdotais. Impossível não transcrever o respectivo parágrafo: «Dans une société ou un milieu qui ne tolèrent pas le désir gai, le célibat consacré, avec tout le discours valorisant qui l'accompagne traditionnellement, peut apparaître  comme une solution admissible. Au moins un tiers des prêtres catholiques et des religieux consacrés seraient des gais plus ou moins refoulés. En ce domaine, les enquêtes sont difficiles, mais les chiffres n'ont rien d'improbable. Probable aussi le fait que, dans les pays occidentaux, la crise des vocations dont souffre l'Église catholique soit directement liée à la plus grande tolérance dont jouit désormai dans ces mêmes pays l'existence gaie assumée comme telle: nul besoin de prononcer des voeux si l'objet véritable du désir est connu, acceptable et accessible. Le mouvement de libération gaie a vidé le réservoir de frustration et de refoulement où l'Église aimait à puiser une bonne partie de son clergé.» (p. 71)

Recordo, a propósito, o que me dizia, há uns bons quarenta anos, em Paris, em casa do Manuel Cargaleiro (no Quai des Grands Augustins), um amigo meu que então estudava na Sorbonne: os homossexuais têm apenas três vias profissionais, a carreira militar, a carreira docente ou a carreira eclesiástica. A evolução da sociedade encarregou-se de baralhar os dados. Na carreira militar passou a haver mulheres (lembro-me do general Lemos Ferreira, então CEMGFA, num Coffe break no Instituto da Defesa Nacional, me dizer que enquanto ele chefiasse as Forças Armadas as mulheres nunca seriam admitidas como operacionais, sendo confinadas a secretárias, enfermeiras, etc.), o que reduziu substancialmente as virtudes de tal opção. Na carreira docente, agora com turmas mistas em todos os graus de ensino, e com o espectro do assédio sexual, as possibilidades de êxito estão drasticamente reduzidas. Na carreira eclesiástica, os casos relatados nos últimos anos e a advertência papal de que as pessoas com (simples) inclinações homossexuais seriam excluídas do acesso ao sacerdócio, o problema tornou-se idêntico.

Um excerto da entrada "Étrangement": «Ailleurs, c'est le refus de jouer la mascarade hétérosexuel qui s'impose au héros: "Le dimanche des homosexuels est toujours lugubre. Car ils s'aperçoivent alors que le monde du jour, qui n'est pas leur domaine, règne sans réserve. Où qu'ils aillent, au théâtre, au café, au zoo, dans un parc d'attractions, dans un quartier quelconque de la ville, en banlieue, partout c'est le principe de la majorité qui avance triomphalement. C'était une procession de couples, vieux, entre deux âges, jeunes, amants, de familles, et d'enfants, d'enfants, d'enfants, d'enfants, d'enfants et, pour couronner le tout, de ces maudites poussettes! C'était un défilé qui avançait sous les vivats. Il aurait été très facile pour Yûichi de les imiter en se promenant en compagnie de Yasuko [son épouse]. Mais quelque part au-dessus de sa tête l'oeil de Dieu le surveillait dans le ciel limpide: les faux seront nécessairement découverts.* (p. 68)

 * Yukio Mishima, Les amours interdites

Na entrada "Évangile", o autor interroga-se sobre a sexualidade de Jesus e sobre o sistema sexual proposto pelo Evangelho, que escapa a todas as normas estabelecidas. «Le message central est d'abord celui du refus de la sexualité pour se consacrer à Dieu seul. Quand d'autres religions, le judaïsme et l'islam, promeuvent la procréation comme une poursuite de l'oeuvre de la Création et un hommage au Créateur, le message évangélique primitif se veut infinement plus radical et difficile à entendre: il exhorte à ne pas procréer et à se faire eunuque pour le Royaume des Cieux*. Les mouvements chrétiens dits de défense de la famille n'en ont évidemment cure: les textes évangéliques sont de peu de poids face à l'idéologie haineuse et réactionnaire qui les anime.» (pp.72-3)

* Mateus, XIX, 10-12

Entre outras pertinentes considerações, como o facto do discípulo amado (João) repousar a sua cabeça no seio de Jesus, William Marx manifesta a sua perplexidade sobre esta passagem do Evangelho de Marcos (XIV, 51-52), que transcrevo da tradução portuguesa de Frederico Lourenço: "Um certo jovem seguia-o envolto apenas num lençol por cima da nudez. Prenderam-no, mas ele, deixando o lençol, fugiu nu." (p. 74) Dispenso-me de comentários sobre as observações do autor sobre esta e outras passagens do Evangelho de Marcos, que não cabem neste espaço, mas não prescindo de referir a existência de um Evangelho secreto de Marcos, que, segundo Clemente de Alexandria, seria destinado apenas aos iniciados (Morton Smith, Clement of Alexandria and a Secret Gospel of Mark). Este manuscrito de Clemente, descoberto em 1958 pelo universitário norte-americano no Mosteiro de São Saba, vinte quilómetros a sul de Jerusalém, desapareceu curiosamente alguns anos depois de Smith o ter revelado ao mundo. Apesar das inúmeras referências homossexualizantes nos textos evangélicos, Dan Brown entregou-se posteriormente a uma grosseira manobra de diversão, publicando em 2003 o Da Vinci Code, onde atribui a Jesus uma relação amorosa com Maria Madalena.

Na entrada "Pédophilie", o autor desfaz a confusão que (intencionalmente) se estabeleceu entre pedofilia e homossexualidade masculina, salientando que pode haver pedofilia com homossexualidade feminina, e que uma parte substancial dos casos de pedofilia é praticada a nível heterossexual. Refere expressamente a frenética caça aos "pedófilos" desencadeada a partir de fins dos anos 90 pelos media, pelos governos e por certas instituições mais ou menos respeitáveis, em reacção a actos criminosos de repercussão mundial. Examina a propositada identificação de pedofilia e pederastia (termo grego de contornos bem definidos) e explica a situação a que se chegou hoje: «On confond sous le terme de pédophile trois types de personnes, trois types de comportements fondamentalement différents. Il y a d'abord ceux, de très loin les plus nombreux, qui se contentent de fantasmes sexuels faisant intervenir des enfants et ne passent jamais à l'acte: ils ne sont ni plus ni moins innocents et inoffensifs que  ceux qui rêvent de coucher avec des licornes, de sucer des zombies et d'enculer des dragons. Laissons-les tranquilles ou bien n'envoyons à leur poursuite que la brigade de protection des êtres chimériques. Il y a ensuite ceux qui passent à l'acte avec des enfants réels, lors de contacts sexuels plus ou moins poussés, plus ou moins sollicités ou forcés. Il y a enfin ceux, rarissimes, qui torturent et assassinent des enfants: ceux-là mériteraient plutôt d'être appelés pédophobes que pédophiles. Seules les deux dernières catégories, naturellement, devraient être justiciables de sanctions pénales et d'un contrôle social.» (pp. 125-6)

Na entrada Prostitution", William Marx discorre sobre a mais antiga profissão do mundo. E indigna-se quanto à criminalização quer das prostitutas (parece que a legislação não abrange os prostitutos), quer dos seus clientes. E propõe uma séria discussão sobre o assunto. Escreve: «Or, si tout peut être commercialisé sauf la sexualité, même entre deux adultes consentants, c'est qu'il y aurait en elle ce qu'il faut bien appeler du sacré. Libre à chacun de le croire, mais est-ce à une république laïque de s'en faire l'apôtre? Jusqu'à nouvel ordre, un péché n'est pas un crime. "Oui, te dira-t-on, mais on n'a pas le droit de vendre son corps." Nuance: les prostitués, hommes et femmes, ne vendent pas leur corps; ils vendent un service rendu avec leur corps. Ce n'est pas la même chose. Les acteurs, les danseurs, les sportifs en font autant, de même que les déménageurs ou les ouvriers du bâtiment, chacun selon les modalités propres. Cela peut aller jusqu'au sacrifice de la santé, voire de la vie: ainsi des cascadeurs, ainsi des militaires. Sera-t-il permis de gagner de l'argent en faisant la guerre, mais pas l'amour? "Oui, mais les femmes prostituées ne sont pas libres de leurs actes." Sont-elles plus aliénnées que ces femmes de ménage qui vont tous les jours à quatre heures du matin nettoyer les bureaux des grandes entreprises?» (p. 133)

Continuando: «Où s'arrêtera le processus? Si la prostitution est interdite, la pornographie doit l'être également, ainsi que la nudité sur les affiches, dans les livres, les médias et les expositions: acteurs et mannequins ne font pas moindre commerce de ce corps désormais légalement sacralisé. Une nouvelle brigade des moeurs prendra au piège les clients potentiels par des offres trompeuses d'amours tarifées. Voilà donc déjà la police entrée dans les chambres et les têtes, au mépris des valeurs fondamentales de la République et de la démocratie. Pour en arriver là, quels prêtres ou quels imams as-tu donc sans le savoir élus au Parlement?» (pp. 133-4)

Ao longo das 33 entradas deste precioso livro, muitas são as questões debatidas mas não permite o espaço alongarmo-nos sobre todos os temas. O que fica é por si demonstrativo da imprescindibilidade da leitura da obra, que vivamente se recomenda a todos os interessados na matéria.

Concluo, com a transcrição dos dois últimos parágrafos:

«Zeus passa par mille aventures charnelles: Io, Europe, Alcmène, Ganymède. Il s'ingéra dans les affaires des Grecs et des Troyens. Il s'efforça de faire régner la justice sur le champ de bataille, alors même qu'il éprouvait un faible pour les défenseurs de Troie. Puis il fit encore plus d'efforts, se spiritualisa toujours davantage, devint le dieu des philosophes, de Platon, Aristote, Cléanthe, Plotin, le moteur immuable de l'univers, le garant de la loi universelle, l'auteur de toute concorde, sans désir (puisque la divinité ne saurait rien désirer), mais non sans cette force qui, dans la vision ultime du Paradis de Dante, "meut le soleil et les autres étoiles". (pp. 164-5)

«Au- delà du désir reste peut-être, forgé et initié par lui, mais devenu désormais autonome et volant de ses propres ailes, aveugle mais déterminé, nu mais bardé de flèches, jeune quoique sans âge, celui qui tu n'oses nommer qu'en tremblant, lui qui selon Virgile, triomphe de tout et survit aussi, espères-tu, au désir lui-même: l'amour.» (p. 165)



sexta-feira, 13 de abril de 2018

CONTRA O LIBERALISMO

 

 Hybris


adieu Montesquieu, Locke et Kant !

La philosophie libérale originelle était une pensée de la limite, une quête de frontières à imposer à la toute-puissance des Églises ou des États, une volonté de séparer le judiciaire et l'exécutif, le temporel et le spirituel, le privé et le public, l'économique et le politique. Il s'agissait de saisir l'homme dans sa radicale finitude et de produire un antidote à l'hybris, la démesure qui mène les civilisations à leur perte. Or que voit-on aujourd'hui triompher sous le même nom de « libéralisme » ? Précisément l'inverse.

On voit se propager la confusion des sphères privées et publiques, les tentations monopolistiques, le refus de la finitude humaine, la volonté de toute -puissance. On voit des entreprises multinationales se jouer des lois de nations et leur imposer les leurs. On voit des groupes privés commençant à en savoir  - donc à en pouvoir - plus sur chacun d'entre nous que nos Ètats respectifs. On voit des pontes des Gafa (Google, Apple, Facebook et Amazon) réfléchir à un homme neuf, augmenté, débarrassé des contingences telles que la vie en commun ou la mort individuelle, concevoir les villes de demain, inventer les espaces publics à venir - des espaces publics qui auront la petite spécificité d'être privés - et planifier des îles artificielles échappant à tout État, ce vieux rêve de pirate enfin à portée de main.

On voit Mark Zuckerberg hésiter à se présenter à la présidence des Ètats-Unis, certain de gagner avant de jouer: soit il se porte candidat et confirme la tendance générale à l'abolition de la distinction entre le chef de l'entreprise et le chef d'État (seul un "bon" patron comme lui peut en chasser un "mauvais" comme Trump), soit il ne se lance pas dans la course et on déduira la vacuité de la chose politique ("il a mieux à faire"). On voit Thélème fleurir dans le Silicon Valley. Les commentateurs s'extasient sur le côté cool et désinvolte  de la communauté Google, oubliant que, chex Rabelais, le "Fais ce que voudras" de Thélème conduit au conformisme absolu («Si l'un ou l'une  d'entre eux disait: "Buvons", tous buvaient; s'il disait: "Jouons", tous jouaient. S'il disait: "Allons nous ébattre aux champs", tous y allaient») et suppose des masses des esclaves aux alentours de l'abbaye fantasmée pour que les élus puissent s'adonner à leurs plaisirs.

On voit, en un mot comme en mille, les individus les plus riches du monde produire une utopie, le transhumanisme, et avoir les moyens de la réaliser. Car il ne s'agit pas là simplement de business, mais bien de vision du monde. De philosophie. Les Rockefeller d'aujourd'hui se voient en réincarnations 2.0 des rois philosophes de Platon. Ces jeunes milliardaires proclament la mort de la mort: «Elle était hier un mystère, elle est désormais un problème à résoudre», avance Peter Thiel, ancien étudiant en philosophie devenu investisseur phare de la Silicon Valley, décidant de ses placements en fonction de ses idées plutôt que l'inverse. Nous allons vers quelque chose qui est loin, très loin de Locke. Ou de Smith. Certes, nous y allons en bermuda et en claquettes, sans costume ni cravate, à coups de "likes" et "smileys", mais nous y allons quand même, à toute vitesse. L'histoire retiendra qu'en ce début de siècle le libéralisme poussé à son paroxysme donna naissance à son antithèse: l'hybris ultralibérale des Gafa. Il est temps d'explorer la doctrine des maîtres-penseurs de l'époque. Pour comprendre ce vers quoi nous avançons. Et, peut-être - qui sait? - saisir l'impérieuse necessité de ne pas s'y rendre.

Montesquieu, reviens, ils sont devenus fous!

 

domingo, 8 de abril de 2018

SOBRE O BRASIL




Transcrevo:

Operação: Abate Da Asa Sul
BRICS



O Brasil sempre foi alvo da famosa e subterrânea rede Atlas!
 

Uma rede de esperações especiais, meio civil meio militar, constituída por contractors para-"civis" (mercenários), corporações, ONGs, e Fundações como a Open Society do Soros e outras que tais, e agentes da CIA, mais ou menos reformados, que impõem os interesses americanos e a influência americana na América do sul, sempre considerada como seu quintal!
 

Rede Atlas essa, herdeira das antigas intervenções de canhoeira, iniciadas pela América com a guerra das Bananas em 1898, e que se tornaram demasiado escandalosas depois do caso Noriega!...
A que ainda acresce no caso Lula/Dilma, a Acção conjunta destes, e dos interesses urgentes do DEP de Estado Americano, para separar e fazer cair a asa Sul do BRICS, aproveitando e saqueando as riquezas do pré-sal, as terras raras, e demais matérias primas, e aproveitando para ir vendendo, às corpoações do norte, tudo a patacos, como a Embraer à Boing e a concessão do Aquifero Guarani à Coca-Cola e Nestlé por tuta e meia, veja-se o que Temer tem feito!
 

Neutralizando assim a saída do Brasil da zona de influência americana!
É 2 em 1.


»»»» "Encontro do BRIC lança desafio à ordem econômica mundial
 

Nádia Pontes
In DW


Encontro do BRIC (16.04.2010) lança desafio à ordem econômica mundial
 

A pedido de Hu Jintao, presidente Lula antecipa o segundo encontro entre líderes do Brasil, Rússia, Índia e China. Lideranças emitiram documento em que pedem mais espaço e mais autoridade na ordem econômica mundial.

A segunda Cúpula BRIC foi cheia de imprevistos: programado para acontecer nesta sexta-feira, o encontro entre Brasil, Rússia, Índia e China foi antecipado para a quinta-feira (15/04). E as declarações finais dos líderes ficaram aquém das expectativas.

O motivo da improvisação foi um pedido do presidente chinês, Hu Jintao, a Lula para que as negociações fossem antecipadas. Jintao voltou para a China logo após seu pronunciamento, devido ao terremoto que abalou o país asiático.

Devido às alterações no programa oficial, a movimentação no Itamaraty foi acima do normal – a sede do Ministério de Relações Exteriores abrigou dois encontros de cúpula num único dia: depois da quarta reunião do IBAS entre os líderes da Índia, Brasil e África do Sul, os representantes do BRIC se encontraram e estenderam as conversas até tarde da noite da quinta-feira.

Declaração padrão

E a declaração conjunta assinada ao fim do segundo encontro também acrescentou pouco ao que já havia sido dito anteriormente: os líderes pedem mudanças em instituições como as Nações Unidas, Fundo Monetário Internacional e Banco Mundial. "Brasil, Rússia, Índia e China têm papel fundamental a desempenhar na construção dessa ordem internacional mais justa, representativa e segura", disse Lula.

"Acreditamos que uma maior cooperação entre os nossos países é boa para o mundo. O BRIC não nasceu da crise, mas da fé do nosso povo e da nossa economia. Mas a crise deu uma relevância maior ao BRIC", ressaltou o primeiro-ministro da Índia, Manmohan Singh.

Já Hu Jintao destacou a proximidade do grupo: "Desde junho do ano passado, estreitamos relações entre os países para enfrentar a crise econômica mundial". E chamou a responsabilidade para os países emergentes: "Queremos promover a retomada da economia mundial", afirmou.

Debates paralelos

Outros assuntos também foram debatidos na cúpula "É consenso nossa disposição em combater desafios globais como o terrorismo, a criminalidade organizada, o narcotráfico. Tudo o que estamos discutindo reflete os problemas com os quais nossos governos se deparam", declarou Dimitri Medvedev, presidente da Rússia.

Vários convênios de cooperação foram assinados entre os quatro países em diversas áreas, dentre elas agricultura, justiça e estatísticas – o BRIC publicará anualmente uma série de dados referente à economia do grupo.

A expectativa era que a segunda Cúpula BRIC focasse um assunto que ficara de fora do primeiro encontro: a discussão de uma moeda regional, que pudesse facilitar as trocas de comércio, de investimento entre os países sem intermediação do dólar. Mas não houve avanços nesse campo, além de a declaração conjunta citar o encontro entre os ministros da área para discutir mecanismos para criação de uma moeda regional.

Brasil e China mais próximos

Lula e Hu Jintao assinaram um Plano de Ação Conjunta 2010-1014 com o objetivo de estreitar as relações bilaterais em campos como energia e agricultura. Apesar de o texto falar de "um espírito de igualdade", há diferenças entre as duas nações que podem comprometer principalmente o Brasil.

"Não podemos descuidar da competitividade da indústria e diversificar para mercados que compram da gente produtos de maior valor agregado. O Brasil pode se tornar apenas um grande fornecedor de matéria-prima, e isso é perigoso. A relação com a China precisa ser mais bem discutida", ressaltou Luciana Acioly, coordenadora de estudos de relações econômicas internacionais do Ipea, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.

A intenção de aproximar os dois países vai além dos acordos comerciais: Brasil e China e anunciaram que a intenção de criar uma rota direta ligando-os. Para tal, contam com o engajamento das empresas aéreas de ambos os lados."

»»» "BRICS desafiam a ordem econômica internacional
 

Rodolfo Alves

Durante a V Cúpula do BRICS, em 27 de Março de 2013, os países do eixo decidiram pela criação de um Banco Internacional do grupo, o que desagradou profundamente os Estados Unidos e a Inglaterra, países responsáveis pelo FMI e Banco Mundial, respectivamente. A decisão sobre o banco do BRICS ainda não foi oficializada, mas deve se concretizar nos próximos anos. A ideia é fomentar e garantir o desenvolvimento da economia dos países-membros do BRICS e de demais nações subdesenvolvidas ou em desenvolvimento.

Outra medida que também não agradou aos EUA e Reino Unido foi a criação de um contingente de reserva no valor de 100 bilhões de dólares. Tal medida foi tomada com o objetivo de garantir a estabilidade econômica dos 5 países que fazem parte do grupo.

Com essas decisões, é possível perceber a importância econômica e política desse grupo, assim como também é possível vislumbrar a emergência de uma rivalidade entre o BRICS, os EUA e a União Europeia."

»»»» "De Dilma a Temer: o que mudou e o que segue igual no Brasil
 

João Paulo Charleaux
In Nexo


O afastamento de Dilma Rousseff (PT), no dia 12 de maio de 2016, e a ascensão do vice Michel Temer (PMDB) à presidência da República deu início a uma série de mudanças econômicas e políticas que completam dez meses em março. Na economia, o ajuste fiscal prometido por Dilma acabou acelerado e aprofundado. Temer conseguiu aprovar a criação de um teto de gastos públicos por um período de 20 anos e tenta emplacar agora propostas de mudanças profundas na Previdência e nas leis trabalhistas. Na política, o primeiro escalão do governo perdeu representantes do PT e do PCdoB para dar lugar à antiga oposição, capitaneada pelo PSDB e pelo DEM. O PMDB e outros partidos que romperam com Dilma durante o impeachment voltaram a se unir em torno de Temer. A Lava Jato, operação contra corrupção com impactos tanto na política quanto na economia, ganhou força com a delação premiada de ex-executivos da Odebrecht, principal empreiteira do país. Se no momento pré-impeachment a operação se concentrou no PT, as novas revelações mostraram um envolvimento mais amplo dos partidos, incluindo as cúpulas do PMDB e do agora governista PSDB. A partir dessas constatações, o Nexo conversou com dois economistas e dois cientistas políticos a fim de que analisassem, de forma mais ampla, o que de fato mudou e o que seguiu igual no país com a troca de Dilma por Temer."

»»»» Supremo nega habeas por 6 a 5 e abre caminho para prisão de Lula
 

Rafael Moraes Moura, Breno Pires, Amanda Pupo, Teo Cury e Julia Lindner
In Estadão.


Após quase 11 horas de julgamento, Corte frustra pedido de habeas corpus preventivo do ex-presidente

»»»» Lula pode ser candidato e eleito presidente mesmo se estiver preso? Ana Carla Bermúdez Do UOL, em São Paulo... -

Derrotado no Supremo e condenado em segunda instância, o ex-presidente ainda poderá ser candidato à Presidência da República? Ele poderá ser eleito mesmo se estiver preso? "A legislação brasileira permite que qualquer cidadão rea... - Veja mais em https://eleicoes.uol.com.br/…/com-habeas-corpus-negado-lula…

»»»» Generais brasileiros assumem o golpe
 

Daniel Oliveira
In Expresso 04.04.2018 às 18h00


Em Estados democráticos de direito os miliares obedecem aos políticos e nada dizem sobre a justiça. No Brasil, os militares dão ordens à justiça e esta decide o futuro da política. Todos sabíamos que isto era um processo político, mas com as armas apontadas à cabeça dos juízes fica tudo mais claro

Tenho acompanhado, em todos os momentos, o golpe político em curso no Brasil. Do impeachment de Dilma Rousseff (AQUI, AQUI e AQUI) ao grotesco processo contra Lula da Silva (AQUI e AQUI), passando pela perversidade política de processos como o Lava-Jato (AQUI e AQUI) e pelo clima que está criado no Brasil (AQUI). Para não repetir tudo o que fui escrevendo, e não se conhecendo ao certo a decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o pedido de habeas corpus de Lula da Silva, à hora a que escrevo este texto, concentro-me apenas no comportamento dos militares nas horas antes da decisão ser tomada. Porque ele é o melhor retrato do que está a acontecer.

 

quarta-feira, 4 de abril de 2018

O APELO



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O "Nouveau Magazine Littéraire" (nº 4, deste mês de Abril), publica um Apelo ao presidente da República francesa, Emmanuel Macron, subscrito por mais de uma centena de personalidades das artes e das letras. 

Trata-se de um pedido ao chefe do Estado para que condene a violação como arma de guerra utilizada na Síria e intervenha para que cesse a impunidade dos carrascos.

Publicamos abaixo o texto de "L'Appel" e o nome dos signatários:

Monsieur le président de la République,

Le viol comme arme de guerre en Syrie est un crime passé sous silence depuis le début de la révolte syrienne en 2011. 

Des milliers de femmes syriennes en ont été les victimes. Des milliers sont aujourd’hui encore dans les prisons du régime syrien où elles subissent les pires exactions.

Le viol est un sujet tellement tabou en Syrie que ces femmes connaissent une double peine. Une fois sorties de prison elles sont rejetées par leurs familles ou victimes de crime d’honneur. Coupables d’être victimes.

Pour la première fois certaines de ces femmes osent parler, parfois à visage découvert, dans un documentaire, Syrie, le cri étouffé, réalisé par Manon Loizeau, coécrit avec Annick Cojean, en collaboration avec la chercheuse libyenne Souad Wheidi.

Dans ce film des femmes syriennes racontent douloureusement ce qu’elles ont subi en détention. Elles donnent les noms de leurs bourreaux et des lieux de torture. La politique du viol comme arme de guerre a été délibérée et systématique depuis le début du conflit pour briser la révolte et la société syrienne.

Un crime parfait car les victimes ne parlent jamais. 

Toutes les femmes qui témoignent sont des mères de famille. Un jour elles ont rêvé, elles ont eu l’immense espoir que la démocratie, la liberté puissent être à leur portée. Alors elles sont sorties dans les rues manifester avec leurs enfants, leurs familles. Elles ont parfois filmé le réveil de leur peuple. Et puis la répression est arrivée, vite, très vite, brutale très brutale. Alors elles ont pansé les plaies des blessés, parfois même les plaies des soldats de l’armée du régime. Elles ont tenté de sauver des vies. Puis elles ont été arrêtées, et leur destin a basculé dans l’obscurité et la barbarie. 

Si elles osent aujourd’hui briser le silence, avec tous les risques que cela comprend, c’est parce qu’elles veulent nous interpeller et que nous les aidions enfin, nous nations occidentales, à faire en sorte que le régime de Bachar al-Assad libère toutes les femmes qui sont encore détenues et que leurs bourreaux répondent un jour de leurs crimes.

Parce que nous ne pouvons rester sourds à leur souffrance et à leur appel, nous vous demandons, Monsieur le président de la République, d’aider à ce que leurs voix soient entendues et à faire tout ce qui est en votre pouvoir pour obtenir la libération des milliers de femmes encore en prison en Syrie.

Les signataires : 

Anne Alvaro, comédienne ; Marie Amachoukeli, réalisatrice ; Raja Amari, réalisatrice ; Christophe André, psychiatre ; Sophia Aram, humoriste ; Ala Alabdallah, réalisatrice ; Ariane Ascaride, comédienne ; Yvan Attal, comédien, réalisateur ; Jacques Audiard, réalisateur ; Anne Azoulay, comédienne ; Lisa Azuelos, comédienne ; Élisabeth Badinter, philosophe ; Ali Baddou, journaliste ; Jeanne Balibar, comédienne, chanteuse ; Christophe Barratier,  réalisateur ; Bérénice Bejo, comédienne ; Emmanuelle Bercot, comédienne, réalisatrice ; Diane Bertrand, réalisatrice ; Enki Bilal, dessinateur, réalisateur ; Juliette Binoche, comédienne ; Sandrine Brauer, productrice ; Geneviève Brisac, écrivaine, éditrice ; Caroline Broué, journaliste ; Isabelle Broué, réalisatrice ; Michel Broué, mathématicien ; Claude Calame, historien ; Emmanuel Carrère, écrivain ; Caroline Casadesus, artiste lyrique ; Sorj Chalandon, écrivain ; Kim Chapiron, réalisateur ; Claire Chazal, journaliste ; Caroline Broué, journaliste, productrice ; Jeanne Cherhal, chanteuse ; Philippe Claudel, écrivain, réalisateur ; Hélier Cisterne, réalisateur ; Jean-Louis Comolli, réalisateur ; André Comte-Sponville, philosophe ; Pascal Convert, plasticien ; Catherine Corsini, réalisatrice ; Boris Cyrulnik, psychiatre ; Daniel Cohn-Bendi, ancien député européen ; Marie Darrieussecq, écrivaine ; Antoine de Caunes, animateur, réalisateur ; Émilie Deleuze, réalisatrice ; Claire Denis, réalisatrice ; Arnaud Desplechin,  réalisateur ; Vincent Dieutre, réalisateur ; Cyril Dion, écrivain, réalisateur ; Lola Doillon, comédienne, photographe, réalisatrice ; Dominique A, chanteur ; Valérie Donzelli, comédienne, réalisatrice ; Mathias Énard, écrivain ; Raphaël Enthoven, philosophe ; Jérémie Elkaim, comédien, réalisateur ; Abbas Fahdel, réalisateur ; Pascale Ferran, réalisatrice ; Laurence Ferreira-Barbosa, comédienne, réalisatrice ; Luc Ferry, philosophe ; Isabelle Filiozat,  auteur, psychothérapeute ; Jean-Pierre Filiu, historien ; Dan Franck, écrivain ; Denis Freyd, producteur ; Tony Gatlif, réalisateur ; Julie Gayet, comédienne, productrice ; Delphine Gleize, réalisatrice ; Raphaël Glucksmann, essayiste ; Yann Gonzalez, réalisateur ; Romain Goupil, réalisateur ; Joana Hadjithomas, réalisatrice ; Lucile Hadzihalilovic, réalisatrice ; Michel Hazanavicius, réalisateur ; IAM, groupe de rap ; Agnès Jaoui, comédienne, réalisatrice ; Khalil Joreige, réalisateur ; Sam Karmann, comédien, réalisateur ; Reda Kateb, comédien ; Maylis de Kerangal, écrivaine ; Cédric Klapisch,  réalisateur ; Héléna Klotz, réalisatrice ; Nicolas Klotz, réalisateur ; Gérard Krawczyk, réalisateur ; Serge Lalou, producteur ; Louis-Do de Lencquesaing, comédien, réalisateur ; Frédéric Lenoir, philosophe ; Vincent Lindon, comédien ; Bernard-Henri Lévy, philosophe, écrivain ; Manon Loizeau, réalisatrice ; Emily Loizeau, chanteuse ; Tonie Marshall, comédienne, réalisatrice ; Patricia Mazuy, réalisatrice ; Agnès Merlet, réalisatrice ; Radu Mihaileanu, réalisateur ; Ariane Mnouchkine, metteuse en scène et directrice de la troupe du Théâtre du Soleil ; Dominik Moll, réalisateur ; Edgar Morin, sociologue, philosophe ; Jean-Marc Moutout, réalisateur ; Safy Nebbou, réalisateur, metteur en scène ; Michel Ocelot, réalisateur ; Rithy Panh, réalisateur ; Antonin Peretjatko, réalisateur ; Élisabeth Perceval, réalisatrice ; Nicolas Philibert, réalisateur ; Bruno Podalydès, réalisateur, comédien ; Thomas de Pourquery, chanteur ; Jérôme Prieur, réalisateur, écrivain ; Katell Quillévéré, réalisatrice ; Reza, photographe ; Mathieu Ricard, docteur en génétique cellulaire ; Brigitte Roüan, comédienne, réalisatrice ; Daphné Roulier, journaliste ; Atiq Rahimi, écrivain ; Christophe Ruggi, réalisateur ; Martine Saada, éditrice ; Stephane Sanseverino, chanteur ; Éric-Emmanuel Schmitt, écrivain, dramaturge ; Colombe Schneck, écrivaine ; Barbara Schulz, comédienne ; Albin de la Simone, chanteur ; Florence Seyvos, écrivaine ; SMITH, artiste ; Juan Solanas, réalisateur ; Salomé Stévenin, comédienne, réalisatrice ; Chantal Thomas, romancière ; Mélissa Theuriau, journaliste, productrice ; Trân Anh Hùng, réalisateur ; Justine Triet, réalisatrice ; Colette Tron, auteur, critique ; Thomas Vincent, réalisateur ; Hyam Yared, écrivaine ; Samar Yazbek, écrivaine ; Rozschdy Zem, comédien ; Érick Zonc, réalisateur ; Ruth Zylberma, réalisatrice

 * * *

É evidente que todos estaremos de acordo em condenar a violação a que foram sujeitas mulheres sírias, aliás uma prática infelizmente nada invulgar em teatros de guerra. Parece, mas o manifesto não o refere, que também terão sido violados muitos rapazes, nas prisões ou no cenário de operações, neste caso não se sabe por quem. Assim como as mulheres violadas não o terão sido exclusivamente nas prisões.

Todavia, o verdadeiro objectivo do "Apelo", mais do que o interesse pela situação das mulheres sírias, é obter de Macron, se não uma intervenção na Síria, o que nesta altura se afigura improvável, pelo menos uma condenação pública de Bashar Al-Assad, e do regime legal do país, preocupação constante de muitos dos signatários, demonstrada ao longo dos últimos anos.

Entre os subscritores, não poderia faltar o inefável Bernard-Henri Lévy, famigerado arauto da invasão da Líbia e que deveria estar calado se ainda possuísse um mínimo de vergonha, e grande parte dos seus compagnons de route, incansáveis apoiantes do governo de Israel. Pelos apelidos os conhecereis.

AO PEDIREM QUE OS CARRASCOS (isto é o Governo e o Exército Sírio) RESPONDAM UM DIA PELOS SEUS CRIMES (como se não existissem também crimes dos terroristas islâmicos e até da chamada Oposição moderada) NADA MAIS É NECESSÁRIO ACRESCENTAR.


terça-feira, 3 de abril de 2018

REVISITANDO FRANÇOIS AUGIÉRAS





Conto entre os meus amigos do Facebook alguns importantes escritores franceses. Acontece que um deles referiu em recente post, não me recordo a que propósito, o livro de François Augiéras, Une Adolescence au Temps du Maréchal.

François Augiéras

Descobri François Augiéras (1925-1971) há pouco mais de vinte anos. Comprei então num alfarrabista francês a edição original de Le Vieillard et l'Enfant (1949), e posteriormente as reedições de Une Adolescence au Temps du Maréchal (2001; orig., 1968) e Le Voyage des Morts (2006; orig., 1959). Li oportunamente o primeiro (edição de autor publicada sob o pseudónimo Abdallah Chaanba) e o último, mas Une Adolescence au Temps du Maréchal et de Multiples Aventures, talvez por ser mais volumoso, ficou adormecido na minha biblioteca. A referência deste meu amigo suscitou-me a curiosidade de o resgatar do pó das estantes e de lê-lo prioritariamente a outros que se encontram em espera.

Marechal Pétain

Importa fornecer alguns dados biográficos sobre Augiéras, escritor singular e maior da literatura francesa, hoje praticamente esquecido mesmo no seu país (já nem falo no estrangeiro), com excepção de uma elite suficientemente informada sobre o homem e a obra.

François Augiéras nasceu em Rochester (New York), em 1925 e morreu em Périgueux, em 1971. O pai, um reputado pianista francês, que se instalara nos Estados Unidos, faleceu antes do seu nascimento, o que provocou o regresso a França da mãe e da criança, que foram viver para Paris, que François sempre detestou. Quando este tinha oito anos, mudaram-se para Périgueux, onde o jovem permaneceu até 1942, data em que ingressou num teatro ambulante. A sua vida torna-se depois errante, tal como o próprio a descreve no livro em apreço.

Esta vocação para o teatro fora despertada pela sua frequência dos movimentos de juventude, inspirados pelas juventudes hitlerianas, que proliferaram em França no tempo do marechal Pétain, então considerado como um herói nacional. Augiéras recorda a sua admiração pelos jovens soldados nazis que chegaram a Périgueux e que, numa primeira fase, eram extraordinariamente cordiais. Pétain gozava também de uma popularidade considerável na maioria da população, que só começou a desvanecer-se em 1942. Escreve no seu livro: «Une autre raison me pousse à partir en Afrique, au desert: le régime de Pétain tourne mal. Archaïque, paternaliste, idyllique, magique au début, il devient odieux, me semble-t-il, pour autant que je sois renseigné, c'est-à-dire assez peu. Depuis longtemps déjà je m'en suis écarté, sans y être entrer vraiment, mais enfin je regrette qu'il finisse honteusement. C'est une déception pour moi, une souffrance. Est-ce cela que me tourmente: l'écroulement d'une illusion, d'un univers candide, ancien, qui m'allait bien? J'ai frequenté tous les mouvements de Jeunesse; Pétain était "le père de tous les jeunes"; comme je n'ai pas eu de père cela m'en faisait un, symbolique; je le respectais cet homme-là, qui maintenant se trompe.» (pp.177-8)

Em 1944, Augiéras inscreve-se na frota, em Toulon, e dirige-se a Argel, onde não fica muito tempo, pois o apelo do deserto é muito intenso. Segue. assim, para El Goléa, no Sahara, onde vive o seu tio, militar francês do exército colonial, já na reforma. As relações com o tio são singulares, caracterizadas por uma atracção que não deixa margem para ambiguidades, mas ao mesmo tempo tempestuosas. O autor descreve-as em Le Vieillard et l'Enfant e também no presente livro.


Durante a permanência no deserto, Augiéras, que sempre se sentira atraído por rapazes e por raparigas, tem um encontro com um rapaz árabe (terá tido muitos!) que descreve assim: «Je connais un jeune Arabe, presque un enfant. Cet amour-là satisfait le meilleur de moi-même. Que faisons-nous? Ça reste extérieur, manuel. Cela se passe ainsi: C'est un rituel de la montée vers le ciel. Il y a d'abord la joie du premier regard échangé, la nuit, à l'angle d'un coin, la rencontre d'un visage soudain fraternel, d'un autre moi-même; moi, si j'étais arabe; d'un garçon indigène qui me ressemble un peu. C'est cela qui m'émeut: ce dialogue avec tous mes masques possibles.» (p. 217)

Continuando: «Je pose une main sur son épaule ronde, puis à sa taille que couvre une légère djellaba déchirée. Son visage est là, près du mien; ses yeux brillent, ses joues sont belles et divin son sourire. ses lèvres larges, sa gorge nue sentent la fumée des feux: il est beau, simple et tranquille devant les astres. Accoudé sur les dernières dalles, mon pistolet automatique posé près de moi, j'appuie ses douces lèvres chaudes contre les miennes. Monter là-haut, de nuit, s'est risquer de mourir, d'être égorgé, émasculé, enlevé, torturé, d'autres silhouettes, à chaque instant, en ces temps troublés, pouvant sortir de l'obscurité, m'attaquer au couteau. Je demeure attentif aux moindres bruits qui décéleraient une approche, sur mes gardes, prêt à tirer, prêt á fuir. Puis il y a la douceur des caresses. J'enlace sa taille souple, je touche ses yeux. Ses vêtements usés par le sable sentent l'Afrique, l'odeur des troupeaux, des feux de bivouac; ils sentent le plus lointain passé. Lèvres jointes, c'est alors la joie, l'ineffable joie que nous arrachons à nous-mêmes, chacun pour soi, dans un flot de plaisir - la joie lumineuse, les yeux fermés; du fond de mon être monte une flamme qui brille un instant sous mes paupières closes; une seconde intensément lumineuse. C'est cette flamme que je cherche sur les rochers près du ciel, au risque d'y laisser ma peau: une intense fraternité sauvage; une magie, une aventure de l'esprit. De la joie, pas du plaisir, car je suis monté sur les rochers après m'être à demi assouvi chez les filles du quartier réservé; un dernier assouvissement, mais de l'âme. J'appuie doucement contre mon visage, contre mes lèvres, un autre moi, un masque de moi se détachant obscurément sur les constellations du désert. Sur les rocs je cherche la lumière tirée des profondeurs de mon coeur, de mes entrailles, et sans doute aussi une qualité particulière de la tendresse qu'on ne rencontre que chez les adolescents primitifs, une tendresse arabe, ancienne, une douceur des gestes qui date des premiers temps du monde, quand je ne sais quoi de Dieu persistait chez les hommes.» (pp. 218-9)

Regressado a França, após variadas peripécias, Augiéras recorda: «Octobre 1949. Je rentre en France. Je suis ereinté par la vie infernale que j'ai connue cet été chez mon oncle. Je reviens chez ma mère: le premier acte d'une bien curieuse pièce est fini; je quitte mon théâtre qu'illuminaient chaque soir les constellations du désert, je laisse mon oncle à son musée saharien, à son grand lit de fer. Je passe par Laghouat, et pour une nuit je descends à l'hôtel; il y a une armoire à glace dans ma chambre, je m'y regarde; je ne me suis vu depuis plusieurs mois: je suis beau, j'ai vingt-quatre ans; je suis très brûlé, tanné par le soleil, amaigri, vêtu presque de loques. Il y a un terrible sourire sur mes lèvres, inquiétant, sauvage, heureux; j'arrive du sud.» (p. 222-3)

Importa realçar o estilo límpido de Augiéras e a precisão das suas imagens, que iluminam a estória que conta. Na sua prosa, o não-dito é tão perceptível como o que escreve. A crueza das situações é sempre transmitida com uma particular elegância. Por vezes, talvez pudesse economizar na descrição de certas situações, mas sente-se que uma necessidade interior o leva até ao pequeno pormenor, nomeadamente quando evoca a natureza.


De França, Augiéras ruma a Taormina (1950) para encontrar André Gide, que lhe escrevera uma carta felicitando-o por Le Vieillard et l'Enfant, que alguém lhe fizera chegar às mãos. Descobre o hotel em que Gide se hospedara, e apressa-se a encontrá-lo. «Mais c'est la mer Ionienne, me dis-je, penché à ma portière, en regardant des jeunes filles de quatorze ans se baigner en combinaison dans une eau chaude et plate! Leurs fréres nus se sèchent sur le sable, se lèvent au passage du train, montrant gaiement leur virilité, tandis que leurs soeurs s'accroupissent pudiquement dans un faible ressac, qui agite doucement leurs dessous de coton. Rien que des enfants nus sur les plages, et de grandes fillettes, depuis cent kilomètres - Gide ne doit plus être très loin.» (p. 229)

A descrição do encontro com Gide pode estar ficcionada, mas pode ser muito bem real. O encontro no hotel horroriza os hóspedes ingleses em férias: «Un sourire malicieux plisse ses lèvres minces. Il se passe alors cette chose insensée: devant les regards absolument horrifiés de plusieurs officiers de Sa Gracieuse Majesté - unanimes dans la réprobation - et en présence de leurs épouses - elles aussi unanimes dans la réprobation - Gide me prend fermement dans ses bras, et m'embrasse les joues, plus près des lèvres que des yeux.» (p. 231) - Talvez os ingleses não soubessem quem era André Gide, apesar de, naquela data, ele ter já recebido o Prémio Nobel da Literatura.

Mas François Augiéras é, na verdade, um homem só, como se conclui na segunda parte do livro "Et de Multiples Aventures". Um incompreendido e um revoltado. Viaja pela Argélia e pela Grécia e faz um retiro no Monte Athos. As aventuras perigosas seduzem-no, poderão constituir sempre matéria para livros.

Um texto pouco conhecido, que não li, é L'Apprenti sorcier (1964), uma obra considerada de uma força invulgar, em que um adolescente mantém relações masoquistas com um sacerdote, junto de quem vivia.

Em 1960, Augiéras casa com uma prima, mas a união dura pouca tempo. Continua a escrever. As condições de uma vida precária agravam o seu estado de saúde, sucedendo-se múltiplos internamentos no hospital de Périgueux. As dificuldades em ser editado contribuem para o seu desespero. Acaba por ser internado numa casa de repouso em Fougères e depois num hospício para pobres em Montignac. Morre no hospital de Périgueux em 13 de Dezembro de 1971.

Um dos seus raros amigos, Paul Placet, empenha-se em fazer conhecer a sua obra, quer divulgando os seus manuscritos, quer organizando exposições dos seus quadros, porque Augiéras também era pintor.